A imagem das Forças Armadas está tão vinculada à do presidente Jair Bolsonaro que é virtualmente impossível projetar a campanha eleitoral sem levar em conta o comportamento dos militares. A ameaça de uma versão brasileira do 6 de janeiro, só que com apoio militar, é um fantasma que vai assombrar a campanha até o final. Mas não é só. Sob Bolsonaro, os militares ganharam vantagens financeiras que nunca tiveram na democracia.
Bolsonaro aparelhou a administração com mais de 7 mil militares, três vezes mais do que no governo Temer. “Eles precisam voltar para os quartéis”, disse no domingo (17/04) ao jornal Correio Braziliense a economista Zeina Latif, uma das porta-vozes da campanha Doria. Os candidatos Lula da Silva e Ciro Gomes já declararam que, caso eleitos, afastarão os militares das funções civis.
Na semana passada, as FFAA foram ridicularizadas pela revelação da compra de 35 mil comprimidos de Viagra a preços 140% acima dos de mercado. Na explicação oficial do Ministério da Defesa, os remédios serviriam para pacientes com hipertensão pulmonar arterial. Ninguém acreditou. Perguntado, o vice-presidente general Hamilton Mourão virou chacota ao justificar a compra com a piada “o que são 35 mil comprimidos para 110 mil velhinhos?”, citando o número de militares reformados.
Mesmo em outras crises do governo Bolsonaro, como a desastrosa gestão do general Eduardo Pazuello no combate à Covid, as Forças Armadas não haviam sido alvo de tantos ataques quanto com a compra de Viagra.
A responsabilidade é dos próprios militares. Parte da reação política à compra dos Viagras ocorre porque o ex-ministro da Defesa, general Walter Braga Neto, quer ser o candidato a vice-presidente de Bolsonaro. Os partidos aliados a Bolsonaro farão o que for necessário para substituir Braga Neto por um político do Centrão. Como a escolha formal só ocorre na primeira semana de agosto, serão meses de novos episódios para desgastar o general e, por consequência, todas as FFAA.
A disputa entre os generais e os políticos do Centrão é evidente. No mês passado, o Centrão conseguiu derrubar o presidente da Petrobras, general Luna e Silva, e só não conseguiu nomear o substituto pelos conflitos de interesses dos dois indicados. Sob Bolsonaro, o Exército – mais que as outras forças – se transformou em um comitê eleitoral. O departamento de cibersegurança do Exército é a principal fonte do bolsonarismo para instigar seus eleitores com dúvidas sobre a segurança das urnas eletrônicas, o pretexto que o bolsonarismo prepara para usar no caso de derrota nas eleições de outubro.
As FFAA não são monolíticas. Embora a grande maioria dos oficiais defenda a reeleição de Bolsonaro, parte incentivou a fracassada candidatura de Sergio Moro e ainda espera que surja um novo nome como alternativa ao presidente. Estar ao lado de Bolsonaro, não implica que as FFAA estejam conspirando contra a democracia, mas que estão emprestando a sua imagem a serviço do presidente. Se ele perder, as FFAA perdem também. Ter uma organização armada ressentida é contratar problemas para o futuro.