Cinco anos atrás publiquei um livro chamado O Pior Emprego do Mundo, sobre as trajetórias e agruras dos ministros da Fazenda do Brasil desde Delfim Netto no longínquo 1967 até Henrique Meirelles em 2018. Passado esse tempo, é fato que é difícil achar um emprego pior do que o de Fernando Haddad.
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Por uma série de atropelos, algumas das principais votações do ano no Congresso ficaram para última hora, com enormes riscos de derrota ou adiamento. De hoje, dia 11, e até o último dia de trabalho do Congresso, formalmente no dia 22, o governo Lula terá de:
- Aprovar na Câmara e no Senado a medida provisória taxando as subvenções do ICMS. Preposto de Arthur Lira, o relator Luiz Fernando Faria adiou o anúncio do relatório para a volta do chefe, nesta segunda. As negociações ampliaram o desconto do que as empresas deixaram de pagar entre 2017 e 2022 de 65% para 80%, com parcelamento em 12 vezes. A Fazenda ainda mudou o conceito do que é investimento, incluindo leasings e aluguéis. Mas as empresas querem ainda um acordo sobre a cobrança de crédito presumido, o que diluiria com a proposta.
- Aprovar no Senado a proposta que taxas as apostas online. O texto ainda terá de ser votado na Câmara.
- Aprovar na Câmara e no Senado a cobrança dos Juros de Crédito Próprio, a JCP. A Fazenda aceitou retirar da proposta a limitação da dedução a 50% do lucro tributável e o aumento de 15% para 20% na cobrança de Imposto de Renda sobre o valor recebido pelos acionistas. Companhias que hoje se favorecem com a JCP farão imenso lobby no Senado para derrubar a proposta.
- Aprovar no Senado os nomes do novo procurador-geral da República, Paulo Gonet, do novo ministro do Supremo, Flavio Dino, dos novos diretores do Banco Central, Paulo Picchetti e Rodrigo Teixeira, além de quatro para conselheiros do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e dois para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
- Aprovar como voto de três quintos dos deputados as mudanças do Senado da Reforma Tributária. Se as propostas não forem aprovadas, a Reforma precisa voltar ao Senado até as duas Casas concordarem com um texto consensual.
- Manter no Senado e na Câmara os vetos do presidente Lula para o marco temporal de terras indígenas, desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia, das exceções do Arcabouço Fiscal e das novas regras para julgamentos do Conselho Administrativo De Recursos Fiscais (Carf). Para derrubar o veto presidencial, é preciso pelo menos 257 votos de deputados e 41 de senadores. Caso não se alcance essa maioria, o veto é mantido.
- Mudar no Senado e na Câmara o horroroso relatório do deputado Danilo Forte para Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2024 e aprovar o Plano Plurianual (PPA) 2024-2027;
- Aprovar no Senado e na Câmara o Orçamento para 2024.
É possível ganhar tantas votações com uma maioria instável em tão pouco tempo? É, mas é improvável. O governo terá de fazer escolhas no que politicamente é mais decisivo (PGR e STF) e financeiramente mais custoso (ICMS, LDO e Orçamento).
Tudo ficou mais difícil com os discursos inflamados dos líderes do PT no encontro do partido na sexta e sábado, em Brasília. Precisando desesperadamente de votos para a agenda econômica, o documento do Diretório Nacional petista classificou o Centrão como um agrupamento de “forças conservadoras e fisiológicas fortalecidas pela absurda norma do orçamento impositivo num regime presidencialista, exercem influência desmedida sobre o Legislativo e o Executivo”. Em seu discurso, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, se opôs explicitamente à agenda econômica de Fernanda Haddad de reduzir o déficit público. O déficit do próximo ano poderia chegar a “1%, 2%” do PIB (Produto Interno Bruto) para viabilizar o aumento de gastos públicos e não “deixar a economia desaquecer”.
O documento do PT acusa explicitamente o presidente do BC pela redução do ritmo da economia neste segundo semestre. “O Brasil precisa se libertar, urgentemente, da ditadura do BC ‘independente’ e do austericídio fiscal, ou não teremos como responder às necessidades do país”, diz o PT.
O líder do partido na Câmara, José Guimarães, discursou no mesmo tom: “eu estava conversando com a presidente [do PT] Gleisi [Hoffmann] que, se tiver que fazer déficit, vamos ter que fazer. Senão a gente não ganha a eleição em 2024. É claro que o governo Lula tem uma responsabilidade fiscal, mas temos um problema”.
São agendas conflitantes. O PT quer tomar para si os acertos do governo Lula e se recuperar das derrotas nas eleições municipais de 2016 e 2020. O partido acredita que um bom resultado dos candidatos lulistas poderá diminuir a oposição no Congresso nos últimos dois anos do governo Lula e atrair para a base políticos que hoje estão desgarrados do bolsonarismo.
Haddad tem uma agenda de menos curto-prazo. Político, ele entende que a economia terá influência decisiva na campanha presidencial de 2026, mas sabe que as experiências anteriores de descontrole fiscal deram com os burros n’água. O encontro do PT em Brasília, contudo, mostrou que ele está isolado.
Com pouco tempo para aprovar o núcleo da sua agenda, sendo obrigado a negociar artigo por artigo dos projetos com o Centrão e sem o apoio do PT, Haddad terá uma semana difícil. A única possibilidade de o governo conseguir a maior parte dessas vitórias é se Lula entrar em campo. Poucos políticos têm a capacidade de fechar acordos quanto Lula. Em 2002, Renan Calheiros lidera a ala mais antipetista do PMDB. Virou amigo do presidente. Até pouco tempo atrás, Geraldo Alckmin era só mágoas. Hoje fala mais bem do governo Lula do que os petistas. Agora, Lula terá de usar sua conhecida magia com Arthur Lira, Rodrigo Pacheco e David Alcolumbre. O tempo, no entanto, é curto.