Em setembro de 2018, O jornal O Globo publicou que um dos diretores da empreiteira Galvão Engenharia, Jorge Valença, relatou ter feito pagamentos em dinheiro vivo ao grupo do então governador do Ceará Cid Gomes em troca da liberação de recursos do governo para a empresa na construção do estádio Castelão, entre 2012 e 2013. A delação, uma das milhares feitas ao longo da Operação Lava Jato, foi jogada no fundo de uma gaveta por falta de provas até ressuscitar nesta quarta-feira, 15, mais de três anos depois, para atingir o candidato Ciro Gomes.
Não há um motivo honesto que justifique a operação de busca e apreensão na casa de Ciro e de Cid Gomes. O episódio trata de 2012 e 13, a denúncia é de 2018 e as investigações policiais ficaram paradas todo esse tempo, sem sequer um pedido de quebra de sigilo bancário. Foi só um espetáculo para intimidar Ciro Gomes e alertar a oposição de que, sob Bolsonaro, a Polícia Federal vai ser usada como polícia política.
A Polícia Federal cumpriu um papel importante nas investigações da Lava Jato, mas nunca assumiu os abusos ao longo da operação, com a trágica morte do reitor Luiz Carlos Cancellier e o vazamento sistemático de informações de inquéritos para prejudicar políticos e ministros do STF considerados adversários. Sob Bolsonaro, a PF se tornou tão aparelhada que o Supremo Tribunal Federal abriu inquérito a partir de denúncia do ex-ministro e também candidato a presidente, Sergio Moro.
Vinte delegados foram transferidos nos últimos meses numa operação para ampliar o controle do órgão pelo diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Maiurino, incluindo os inquéritos sobre os filhos do presidente Flávio e Jair Renan Bolsonaro e o blogueira bolsonarista Allan dos Santos. Em nenhum momento dos governos democráticos se assistiu um aparelhamento tão evidente.
A ação da PF contra Ciro é apenas um aviso de como o governo Bolsonaro pretende usar a máquina federal para proteger seus aliados e assediar adversários. Semanas atrás, Bolsonaro trocou o secretário da Receita Federal e ordenou que o COAF saia da jurisdição do Banco Central para o Ministério da Justiça. O presidente já tem aliados fiéis na Procuradoria Geral da República, Exército e Controladoria Geral da União. Com a PF, a Receita e o COAF nas mãos, Bolsonaro só precisa do Supremo Tribunal Federal para tentar ser um ditador.