Esta semana a série “The Dick Van Dyke Show” comemorou 50 anos de sua estreia. A sitcom criada por Carl Reiner foi um dos marcos da década de 1960, ao trazer um casal que mantinha o equilíbrio em sua relação. O marido não sabia tudo e a esposa não era tresloucada.
A série estabeleceu as bases da linha narrativa que seria, ao longo dos anos, exploradas por outras produções, sendo “Mad About You” a que mais se aproximou dessa proposta.
A ideia de “Comédias Dick Van Dyke”, título com o qual foi exibida no Brasil, surgiu em 1958, quando Carl Reiner, na época um dos comediantes do humorístico Sid Caesar’s Your Show of Shows, decidiu criar uma série para ele estrelar. Com o título original de “Head of the Family”, Reiner escreveu o roteiro de 13 episódios, que tinha como base suas experiências como marido e pai.
Na história, Rob Petrie é um dos roteiristas responsáveis pelo humorístico “The Alan Sturdy Show”. Com ele trabalham Buddy e Sally, uma das poucas mulheres a atuar nessa área. Casado com Laura, Robbie é pai de Richie, um menino de seis anos de idade.
Sem conseguir despertar o interesse de um canal para produzir o episódio piloto, Reiner, amigo de Peter Lawford, na época genro de Joseph P. Kennedy, enviou o projeto para o pai de John Kennedy, que bancou a produção do episódio piloto, filmado em dezembro de 1958.
Filmado com uma única câmera e sem a presença de um público, o episódio era estrelado pelo próprio Reiner, que interpretou Rob, Barbara Britton (Laura), Gary Morgan (Ritchie), Sylvia Miles (Sally) e Morty Gunty (Buddy). Apesar dos esforços, o projeto não vingou, levando Reiner a seguir com sua vida. Até que o agente de Reiner conseguiu chamar a atenção do produtor Sheldon Leonard, que na época era um dos mais respeitados na área por oferecer sitcoms como “The Andy Griffith Show” e “The Danny Thomas Show”.
Leonard aceitou desenvolver o projeto, desde que Reiner desistisse de estrelar a série. Depois de passar pela decepção de não ser apto a interpretar a si mesmo, Reiner concordou.
Em seu lugar foi contratado Dick Van Dyke, que na época estrelava o musical da Broadway “Adeus, Amor/Bye Bye Birdie”. Desconhecido do grande público, o ator já tinha feito algumas participações aqui e ali na televisão, mas sem grande repercussão.
A série o transformaria em um astro, abrindo-lhe as portas para uma carreira no cinema, onde estrelou produções como a versão cinematográfica de “Adeus, Amor”, bem como “Mary Poppins” e “O Calhambeque Mágico”.
Para produzir o novo piloto, e uma possível série, os envolvidos se associaram a terceiros para formar a produtora Calvada. O título é a junção das iniciais dos nomes de Carl Reiner (Ca), Leonard Sheldon (l), Dick Van Dyke (va) e Danny Thomas (da), que atuou apenas como produtor.
Foi através de Thomas que a série encontrou sua atriz: Mary Tyler Moore. Depois de realizar diversos testes, os produtores ainda não tinham conseguido encontrar alguém que pudesse interpretar Laura. Até que Thomas sugeriu chamar a atriz ‘com três nomes’ que tinha feito testes para interpretar sua filha em “The Danny Thomas Show”.
A comediante Rose Marie, antiga conhecida de Sheldon, foi escolhida para interpretar Sally. Esta, por sua vez, indicou seu amigo Morey Amsterdam para interpretar Buddy.
Larry Matthews foi escolhido para interpretar o filho dos Patries; Jerry Paris e Ann Morgan Guilbert foram selecionados para os papéis de Jerry e Millie Helper, vizinhos e amigos de Rob e Laura; e Richard Deacon ganhou o papel de Mel Cooley, produtor do humorístico para o qual Rob trabalhava, que agora foi rebatizado com o nome de “The Alan Brady Show”.
Reiner pediu para interpretar Alan, que aparece de vez em quando no escritório dos roteiristas para dar sugestões, muitas vezes sem graça, para o programa.
A produção buscou o apoio da agência de propaganda Benton & Bowles, que incubiu os publicitários Lee Rich e Grant Tinker de vender o projeto para anunciantes. Mary Tyler Moore e Grant Tinker se casariam em 1962. Na década de 1970, eles produziriam o clássico “The Mary Tyler Moore Show”. Entre 1981 e 1986, Tinker se tornou diretor da NBC, recebendo o apelido de: ‘o homem que salvou a NBC’.
Adaptando os roteiros para o estilo de comédia física que Dick Van Dyke fazia, o novo episódio piloto foi filmado nos estúdios Desilu, diante de um público e utilizando três câmeras. A agência de publicidade conseguiu o patrocínio da Procter & Gamble e ofereceu o projeto para a CBS, que agendou sua estreia para o dia 3 de outubro de 1961.
Rebatizada com o nome do ator principal (embora ele ainda fosse um ilustre desconhecido), a série que se tornaria um marco estreou na TV americana.
Aplaudida pelos críticos, a série despencou na audiência, correndo o risco de ser cancelada em sua primeira temporada. Mas os patrocinadores continuaram apoiando o programa, que foi renovado, levando “Comédias Dick Van Dyke” a ter cinco temporadas produzidas.
Nas três temporadas seguintes, a série figurou entre as 10 séries mais vistas da TV americana, registrando a média de 27 a 33 milhões de telespectadores. A quinta e última temporada perdeu audiência, chegando a 23 milhões.
No último episódio, exibido em junho de 1966, Alan Brady é escolhido para interpretar Rob Patrie na versão televisiva de sua autobiografia. Esta foi a forma que Reiner encontrou de ‘se vingar’ do fato dele não ser o ator ideal para interpretar a si mesmo! Em 1995, Reiner voltou a interpretar o personagem em um episódio de “Mad About You” no qual Paul entrevista Brady para um documentário sobre a história da televisão.
Uma das grandes conquistas da série foi conseguir dividir as atenções dos episódios, de 25 minutos de duração, em dois núcleos: o familiar e o do ambiente de trabalho.
Em um perfeito equilíbrio acompanhamos a vida e o trabalho de Rob, sem que ele seja o único centro das atenções. Cada personagem tem sua presença na história valorizada, chegando ao ponto de fazer falta quando, por algum motivo, não aparece na trama.
No ambiente familiar vemos sua relação com a esposa, o filho e os vizinhos. Problemas domésticos, vida social e questões relacionadas à educação do filho, bem como o casamento são os temas que predominam.
No ambiente de trabalho acompanhamos o processo de criação de um programa humorístico. Neste momento a série abre espaço para a dupla Sally e Buddy, que normalmente não marca presença no núcleo familiar de Rob.
Outra questão proporcionada pela série foi estabelecer personalidades que não se tornam submissas umas às outras. Embora respeitem a cultura e os hábitos de sua época, cada personagem defende suas opiniões sem se transformar em um estorvo ou exagerar sua posição dentro da história.
Além de tudo, os roteiros conseguiam equilibrar a comédia física e a verbal, trazendo situações mais próximas da realidade evitando, sempre que possível, colocá-los em uma posição que não pudesse de fato ocorrer.
Por essas razões (e um bom texto), a série conseguiu sobreviver, podendo ser apresentada para as novas gerações sem cair na armadilha de ter ficado datada ou sem graça. Durante o período em que foi produzida, “Comédias Dick Van Dyke” ganhou 15 prêmios Emmy. A série completa já foi lançada em DVD nos EUA pela Image Entertainment.
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