‘Luca’ e a Itália: animadoras brasileiras revelam pesquisa para o filme
Sem caricaturas ou estereótipos, animação do Disney+ homenageia um italianismo saudoso para tempos de pandemia — e com um pezinho no Brasil

“Santa Mozzarella!”, exclama com frequência Giulia, adorável coadjuvante da nova animação da Pixar Luca. Com seus cachos ruivos, bochechas salpicadas de sardas e mãos inquietas, a personagem é uma das mais vocais representantes da cultura italiana que embebe a trama em autenticidade e verossimilhança. É ela quem apresenta os meninos-peixes Luca e Alberto, por exemplo, ao maravilhoso mundo da macarronada ao molho pesto – ou, ainda, ao pesadelo que é ser um peixe fora d’água em Portoroso, cidade ficcional de tradição pesqueira e inspirada na bela costa de Cinque Terre.
Parte de um esforço da Disney em trazer mais diversidade a suas histórias, Luca é o mais novo representante da ficção animada que presta homenagem a um mundo não-anglófono. “Tivemos uma sessão com italianos que explicaram como fazer gestos e expressões de uma maneira mais natural e não-estereotipada”, explica a VEJA a animadora brasileira Nancy Kato, que participou da produção. Da gesticulação intensa das mãos – que vai muito além da junção dos dedos em uma coxinha – às complexas lendas de criaturas mitológicas do litoral do país, todos os mínimos detalhes da trama bebem da fonte da realidade, muito graças à especialidade da equipe de produção e do diretor Enrico Casarosa, natural de Gênova. Nancy destaca até o esforço em detalhar os cachinhos nos cabelos de Luca, carinhosamente chamados de “croissant” e inspirados nos do próprio Casarosa: “Todos os dias, nós, da equipe de simulação, observávamos como ele conversava e se mexia para copiarmos os movimentos do cabelo dele.”
Boa parte da naturalidade do filme advém das memórias do diretor. “Quanto mais detalhes eu conseguia trazer para a história, mais autêntica ela ficava”, disse Casarosa à imprensa. Na animação das multidões secundárias, a animadora Bruna Berford, outra brasileira que participou da produção, conta que, nas cenas em que os personagens da cidade comem macarrão, a inspiração para os detalhes veio até das refeições em família. “Tenho sangue italiano e essas grandes reuniões calorosas, também típicas da cultura brasileira, são muito habituais para mim”, conta em entrevista.
Os clichês são divertidos e inofensivos. A cidade da Riviera italiana, temível para os povos marinhos, gera mais curiosidade do que apreensão na dupla de protagonistas: é viva, colorida, com ruelas charmosas, partidas de futebol e delícias geladas, que descobrem depois terem o nome de “gelato”. É Alberto quem convence Luca (ou melhor, o arrasta) a desobedecer os pais e conhecer a aventura que é não ter mais caudas ou barbatanas, mas mãos e pés hábeis para pilotar uma tão sonhada motocicleta Vespa. Ter dinheiro para comprá-la é o que os motiva a participar de um triatlo italiano juvenil, em que se deve nadar, comer macarrão e pedalar em uma encosta íngreme. Isso significa fazer time com Giulia, humana que é tão peixe fora d’água quanto eles. O problema do mundo “seco” reside no hábito de cultuar lendas e estátuas de monstros marinhos sendo massacrados – o pai de Giulia não só não é exceção, como também tem a casa decorada com facões e lanças específicas para pesca.
Luca projeta o que já é DNA da Pixar: uma história universal, atemporal, que deleita adultos e crianças pelo encantamento. Em tempos de fronteiras fechadas, a solução para um turismo saudoso pela bela Itália está a um clique de distância: basta só dar play na animação, presente no Disney+. Confira o trailer abaixo: