Assine VEJA por R$2,00/semana
Sobre Palavras Por Sérgio Rodrigues Este blog tira dúvidas dos leitores sobre o português falado no Brasil. Atualizado de segunda a sexta, foge do ranço professoral e persegue o equilíbrio entre o tradicional e o novo.
Continua após publicidade

Os nossos pronomes possessivos

“Caro Sérgio, parece-me haver algo de estranho em toda prosa em que é empregado ‘de’ em vez de ‘da’ ou ‘do’. Por exemplo, no tempo ‘dos’ nossos avós, que são ‘os’ nossos, e não ‘e’ nossos, usava-se sempre artigo definido feminino (a) ou masculino (o) para construções do tipo: isso é coisa ‘da’ nossa cultura, […]

Por Sérgio Rodrigues
Atualizado em 31 jul 2020, 12h33 - Publicado em 17 mar 2011, 15h38
  • Seguir materia Seguindo materia
  • “Caro Sérgio, parece-me haver algo de estranho em toda prosa em que é empregado ‘de’ em vez de ‘da’ ou ‘do’. Por exemplo, no tempo ‘dos’ nossos avós, que são ‘os’ nossos, e não ‘e’ nossos, usava-se sempre artigo definido feminino (a) ou masculino (o) para construções do tipo: isso é coisa ‘da’ nossa cultura, em vez de isso é coisa ‘de’ nossa cultura, porque é ‘a’ nossa, e não ‘e’ nossa. E por aí vai. É mesmo possível usar abobrinhas em receitas à base de bananas?” (Sival Moreira)

    Publicidade

    Embora confunda, ela sim, abobrinhas com bananas, a consulta de Sival aponta para um traço interessante da nossa língua – mas eu também poderia escrever “de nossa língua” – ao qual se dá pouca atenção: os pronomes possessivos que vêm antes de substantivos podem ser precedidos ou não de artigo definido.

    Publicidade

    O tempo dos nossos avós é também o tempo de nossos avós – tanto faz. Na primeira construção, há a contração da preposição “de” com um artigo definido. Na segunda, a preposição “de” vem sozinha (nada a ver com um absurdo “e nossos avós”, que fique claro).

    A lógica é a mesma que nos permite escrever, por exemplo, “a minha vida dá um livro”, com artigo, ou “minha vida dá um livro”, sem artigo. É comum que o mesmo autor, muitas vezes no mesmo texto, misture as duas formas guiado apenas pelo ouvido – ou pela decisão, consciente ou não, de dosar o tom de proximidade e calor que o uso do artigo definido normalmente confere à frase.

    Publicidade
    Continua após a publicidade

    Mas haverá alguma sutil razão gramatical para que se empregue ora uma construção, ora outra? Se um dia houve, faz tempo que se perdeu. Em sua “Gramática histórica”, Said Ali supõe que os primeiros casos de anteposição do artigo ao pronome possessivo buscavam “chamar a atenção antes para o possuidor do que para a coisa possuída”, num “sentimento de linguagem que se foi esquecendo com o tempo”.

    Na curiosa contabilidade do mesmo gramático, esse artigo anteposto ao pronome, que era raro no português antigo, popularizou-se no século 16 com Camões, que o empregava em 30% das ocorrências de possessivo. No século 17, com o padre Antônio Vieira, a conta chegou a 70%, para culminar em mais de 90% na obra de Alexandre Herculano, no século 19. Talvez essa goleada seja suficiente para atestar uma vocação da língua, mas não parece ser menos verdadeiro que, de um século para cá, o desenvolvimento da imprensa e uma preocupação geral com a concisão têm contribuído para equilibrar o jogo.

    Publicidade

    *

    Envie sua dúvida sobre palavra, expressão, dito popular, gramática etc. Toda quinta-feira o colunista responde ao leitor na seção Consultório. E-mail: sobrepalavras@todoprosa.com.br
    Publicidade
    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Domine o fato. Confie na fonte.

    10 grandes marcas em uma única assinatura digital

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo
    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de R$ 2,00/semana*

    ou
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de R$ 39,90/mês

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.