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Este blog tira dúvidas dos leitores sobre o português falado no Brasil. Atualizado de segunda a sexta, foge do ranço professoral e persegue o equilíbrio entre o tradicional e o novo.
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O Jeca Tatu quer ser imortal

Mazzaropi, encarnação definitiva do Jeca Tatu Pôr em circulação um novo substantivo comum é tarefa difícil até para grandes escritores. A glória dos adjetivos é relativamente permeável à pauta literária – dantesco, kafkiano, machadiano, borgiano – mas a dos substantivos comuns é para pouquíssimos. A Capitu do desmedido Machado de Assis virou mito, mas não […]

Por Sérgio Rodrigues
Atualizado em 31 jul 2020, 06h25 - Publicado em 21 abr 2013, 10h00
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  • O artista Amácio Mazzaropi
    O artista Amácio Mazzaropi (./Divulgação)
    O artista Amácio Mazzaropi

    Mazzaropi, encarnação definitiva do Jeca Tatu

    Pôr em circulação um novo substantivo comum é tarefa difícil até para grandes escritores. A glória dos adjetivos é relativamente permeável à pauta literária – dantesco, kafkiano, machadiano, borgiano – mas a dos substantivos comuns é para pouquíssimos.

    A Capitu do desmedido Machado de Assis virou mito, mas não substantivo. A madame Bovary de Gustave Flaubert, sim, mas pouca gente sabe o que é bovarismo (“tendência que certos indivíduos apresentam de fugir da realidade e imaginar para si uma personalidade e condições de vida que não possuem, passando a agir como se as possuíssem”, segundo o Houaiss).

    Mais raros ainda são os criadores de substantivos tão populares e integrados ao espírito da língua que parecem ter existido desde sempre. Monteiro Lobato é um desses eleitos. De que forma entender o Brasil antes de seu Jeca Tatu, personagem de “Urupês” (1918)? Está certo que jeca, substantivo e também adjetivo, virou sinônimo de caipira, de matuto, termos que o antecedem. Mas o sucesso do personagem fez a palavra se cobrir de sentidos que vão além da simples caipirice.

    O jeca não é só o sujeito sem instrução que vive na roça e revela, ao lado do traquejo social deficitário, uma sobra de vermes, indolência e desconfiança. Em versão bem mais saidinha, circula na metrópole também, com curiosa atração pelos círculos do poder. O Houaiss dá como uma das acepções da palavra a de “que revela mau gosto, falta de refinamento; cafona, ridículo” – como se diz hoje, uma criatura “sem noção”.

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    Eu acrescentaria a essa definição um estranho sentimento de orgulho das próprias limitações, como se a jequice representasse uma autenticidade, uma brasilidade de raiz que a maioria de nós traiu – ah, mas não ele!

    Haverá um fundo de verdade nessa suposição do jeca? Será que a vergonha que sentimos dele é a vergonha de algo que reprimimos em nós, os não-jecas? Claro que a ideia é incômoda, mas, como a literatura não existe para consolar ninguém, viva Monteiro Lobato.

    Quando a presidente Dilma Rousseff declara, como fez há duas semanas ao inaugurar a Arena Fonte Nova, que “somos um país conhecido por ser insuperável no campo, mas estamos mostrando que somos insuperáveis também fora de campo”, o Jeca Tatu morde seu talo de capim e olha em volta.

    Vê um monte de obras atrasadas, caras, cheias de gambiarras; vê aeroportos caindo aos pedaços e uma seleção que amarga o 19º. lugar no ranking da Fifa, atrás de Suíça e Equador. Vê tudo isso e dá um risinho. Sabe que é assim mesmo, passo a passo, que conquistará a imortalidade.

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