Em tempos (mais uma vez!) de “Big Brother Brasil”, vale lembrar que a palavra fama, do latim fama, a deusa mais poderosa de nossa época, diante de cujo altar estamos todos de joelhos, foi assim descrita pelo padre filólogo Rafael Bluteau (1638-1734) em seu clássico “Vocabulário Português e Latino”, o primeiro grande dicionário de nossa língua, um monumento em oito volumes oferecido “a El Rey de Portugal, D. João V” e publicado no início do século 18:
Fabulosa Deidade, a que os Poetas fizeram filha de Titão e da Terra, e irmã de Encélado e do Caos. Dizem que nascera para divulgar os crimes dos Deuses que mataram os Gigantes. Pintam-na como mulher, com asas semeadas de olhos e com uma trombeta na boca. No (canto) 4 da sua Eneida, fazendo Virgílio a descrição da Fama, diz que em cada pena tem um olho, e que tem tantas bocas, línguas e orelhas quantos olhos tem; e acrescenta que anda voando de noite, sem nunca descansar, que em toda parte está atenta ao que se diz, e que traz a todos mentiras misturadas com verdades.
Como o conjunto das palavras de Bluteau ainda soa incrivelmente atual – embora essa genealogia de deuses e titãs pareça um pouco amalucada –, meu papel se limitou à atualização de pontuação e ortografia. Nada que vá me deixar famoso, como se vê.