No norte do Rio Grande do Sul, a cidade de Não-Me-Toque, de pouco menos de 17.000 habitantes, vive a segunda polêmica em menos de um mês. O primeiro escândalo foi a denúncia de que o prefeito, Armando Carlos Roos (PP), assediava sexualmente funcionárias. Uma mulher gravou com um celular o momento em que Roos a convidava para ir a seu apartamento em uma tarde de expediente. Duas semanas depois de o vídeo circular, a segunda polêmica abalou a cidade: o prefeito proibiu que todos os funcionários usem celular durante o expediente.
A proibição, divulgada em uma ordem de serviço em 20 de abril, passa a valer a partir da próxima quarta-feira (2) e afeta os cerca de 500 funcionários públicos do município.
Roos é investigado pela Polícia Civil de Não-Me-Toque e pode ser indiciado pelo crime de assédio sexual, previsto no artigo 216 do Código Penal, cuja punição varia de um a dois anos de prisão. Para o delegado que investiga o caso, Gerri Adriani Mendes, o vídeo e a proibição do celular podem estar relacionados.
Segundo as mulheres, Roos ameaçava demiti-las ou trocá-las de função caso não cedessem ao assédio, o que de fato ocorreu, segundo o delegado. Três mulheres registraram ocorrência até o momento. Um dos casos é investigado enquanto outro aguarda autorização judicial — a terceira vítima desistiu de dar continuidade ao processo.
Porém, de acordo com que Mendes disse a VEJA, além das três vítimas que fizeram queixa à polícia, outras mulheres podem ter sido assediadas, porque as testemunhas ouvidas também relataram comportamento inadequado do prefeito. “Nos depoimentos das testemunhas, percebe-se que elas são, de certa forma, vítimas. Elas tinham que dar três beijinhos no prefeito todos os dias, ele fazia contato físico, o que elas não queriam. Elas reclamavam para que ele parasse e chegaram a fazer uma reunião, mas ele voltou a ter o comportamento”, disse Mendes à reportagem.
Em nota (íntegra abaixo) a VEJA, a prefeitura afirmou que a proibição dos celulares ” vinha sendo analisada pela Administração Municipal desde o ano passado a medida que observava-se o comportamento do funcionalismo público na execução de suas atribuições e percebia-se o uso indevido do celular durante o expediente”. A prefeitura afirma ainda que a investigação e o veto aos celulares não têm relação.
Na época do vídeo, Roos disse por meio de nota que “ainda não havia sido citado na ação penal” e que a funcionária “utilizou-se da confiança do prefeito para gravar o referido vídeo” e apenas o divulgou “após a sua exoneração”.
Por causa da proibição do uso de celular na prefeitura, muitos funcionários estão reclamando porque o aparelho serve para comunicar questões familiares que envolvam saúde e filhos, por exemplo. A prefeitura alega que a proibição decorre do descontentamento da população com o atendimento dado ao público.
O Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Não-Me-Toque (Sindiserm) chegou a sugerir que a prefeitura resolvesse cada caso de uso excessivo do celular pontualmente, em vez de “generalizar”. “Quando sugerimos, já tinha a ordem. Não fomos consultados antes. Tentamos explicar que existem setores que usam o celular para trabalho, mas a prefeitura respondeu que serão disponibilizados aparelhos nos setores e que emergências familiares podem ser tratadas pelos telefones fixos da prefeitura”, disse a VEJA o presidente da entidade, Sebastião Gilmar D’Ávila.
De acordo com o líder sindical, o departamento jurídico do Sindiserm constatou que a proibição é legal. “Fizemos a consulta jurídica, e a determinação dele está dentro da lei. É permitido isso, não tem nada que desabone. Chama a atenção, os funcionários estão chateados, mas está dento da lei”, disse D’Ávila.
Nota da prefeitura:
“A respeito da ordem de serviço que vem sendo questionada e tão midiatizada pelos veículos de imprensa tão somente pelo fato das denúncias de assédio envolvendo o Prefeito Armando Carlos Roos, a mesma vinha sendo analisada pela Administração Municipal desde o ano passado a medida que observava-se o comportamento do funcionalismo público na execução de suas atribuições e percebia-se o uso indevido do celular durante o expediente.
Assim como em empresas privadas do Município onde o uso do celular é terminantemente proibido, as quais possuem inclusive detectores de metais em suas entradas para coibição do uso, a Administração adotou a medida afim de proporcionar um melhor atendimento ao público e as necessidades da municipalidade no que tange a Administração Municipal.
Em momento algum os episódios tem relação, tanto que a Administração possui aparelhos e linhas a disposição dos funcionários que necessitarem o uso de celulares durante seu horário de expediente para uso exclusivo em assuntos relacionados ao trabalho, bem como tem a disposição o telefone da Prefeitura para casos de emergências.”