Eu sou o John Malkovich de Marcelo Rubens Paiva
Um amigo me dá a dica e compro a revista TPM. É uma edição de aniversário, de 10 anos. Traz na capa a apresentadora Angélica, que, agora “tem a vida mais na mão”, anuncia-se. Não sei se a publicação mudou de perfil. Quando eu tinha revista segmentada e acompanhava mais de perto esse mercado, ela […]
Um amigo me dá a dica e compro a revista TPM. É uma edição de aniversário, de 10 anos. Traz na capa a apresentadora Angélica, que, agora “tem a vida mais na mão”, anuncia-se. Não sei se a publicação mudou de perfil. Quando eu tinha revista segmentada e acompanhava mais de perto esse mercado, ela era uma espécie de versão feminina da Trip, que também ignoro se continua a mesma. Esta trazia fotos sensuais de algumas bonitonas para o enleio de braços dos rapazes pós-adolescentes; aquela fazia o mesmo com bonitões para as moças. Talvez não tenha funcionado, sei lá. Quem gosta de ver homem pelado ou quase é gay. Parece, pelas chamadas de capa, que a revista optou por um tom modernamente feminista, mas sem militância. Uma coisa, assim, da mulher enquanto “ser no mundo”, embora, também na capa, Grazi Massafera conte “qual creme deixa seus cabelos perfeitos”, reportagem que vem acompanhada de “+ 8 produtos de beleza indispensáveis”.
O entrevistado da edição é Marcelo Rubens Paiva, que anuncia estar cada vez mais esquerdista. E faz uma revelação até certo ponto surpreendente — ou nem tanto. Ele é meu leitor. E também virei o seu John Malkovich. Na página 24, ele revela: “Sou militante. No blog, sou o Reinaldo Azevedo de esquerda”. Na abertura do texto, para situar o leitor, Nina Lemos, a entrevistadora, me define como “colunista polemista da VEJA”. Indo à raiz da palavra, o “polemista” me cai bem. No uso vulgar da palavra, as coisas se complicam. O “polemista” virou sinônimo de esquisito, de gente que gosta de defender o indefensável. Nina talvez tenha razão nos dois usos da palavra: A COISA MAIS EXÓTICA QUE FAÇO NO BRASIL É DEFENDER A CONSTITUIÇÃO E AS LEIS.
Boa sorte para Marcelo — parece que ele já andou me esculhambando por aí. Eu nunca havia falado sobre ele, acho. “Reinaldo Azevedo de esquerda”? É um oximoro! E não por causa da ideologia. Para ser um “Reinaldo Azevedo”, é preciso fazer, por exemplo, o que faço com o debate sobre o Código Florestal (post desta manhã): contestar a mentira tornada influente pela maioria de esquerda que toma conta do jornalismo e se ocupar do que diz o texto. Para ser Reinaldo Azevedo, é preciso reconhecer que a verdade não é uma questão de ponto de vista. Ela existe, sim. O que varia, e é legítimo que varie, é o que se pensa sobre ela. Não se pode ser Reinaldo Azevedo, Marcelo, indo a favor da correnteza. É por isso, por exemplo, que eu não poderia ser um Marcelo Rubens Paiva de direita.
Marcelo tem 52 anos; tenho 50. Num dado momento da entrevista, ele afirma: “Hoje, as mulheres tomam mais a iniciativa, mas parece que elas levam a sério, se apaixonam. Antes, você transava com a amiga, a namorada de amigo, era uma coisa mais solta”.
Transar com namorada de amigo como expressão de uma “coisa mais solta”? Acho que nunca fui Marcelo Rubens Paiva, nem quando era de esquerda.