Lula revive dilema de Bolsonaro sobre controle de gastos no governo
Negociações por cortes de gastos entram na terceira semana, sem indicativo claro de anúncio no Planalto
No início de 2022, sentindo o bafo quente das pesquisas que retratavam sua impopularidade, Jair Bolsonaro deu um churrasco no Palácio da Alvorada para alguns ministros e aliados. Naqueles dias, o debate sobre o controle fiscal do governo dominava as manchetes.
Paulo Guedes, chefe da Economia e único combatente a defender o rigor fiscal, tentava convencer Bolsonaro a seguir suas orientações, diante de uma forte pressão política do Congresso por mais gastos. O então presidente estava decidido. “‘PG’, não dá para arrumar a casa e entregar para o Lula”, disse Bolsonaro, resumindo o que seria seu pensamento e sua prática nos meses seguintes, quando gastaria bilhões para buscar a reeleição que não veio.
Ironicamente, a lógica de Bolsonaro, lá atrás, é a mesma a atormentar Lula: não dá para arrumar a casa e arriscar a reeleição. É esse pensamento predominante em uma ala do petismo instalada no Planalto que torna tão difícil a tarefa do ministro Fernando Haddad de reduzir gastos. Contra todos os alertas objetivos da equipe econômica, Lula acha que “gasto é investimento”. Tanto que as negociações entraram na terceira semana, sem indicativo claro de anúncio do que será enxugado. “É uma guerra de Rússia e Ucrânia”, resume um ministro de Lula sobre a disputa entre auxiliares acerca do que pode ou não ser cortado.
O problema do petismo é que o governo gasta muito, mas a cotação do real no eleitorado popular — que sempre garantiu vitórias petistas — já não é a mesma. Auxílios, vales, descontos e obras já estão na conta, são “obrigação” de um governo eleito com essas promessas. Pode não ser uma avaliação justa, mas é o que é. Já esquecido das confusões institucionais vividas no governo passado, o eleitorado quer agora é sonhar — e o governo, com seus programas reciclados, não faz o povo crer que a vida vai melhorar. As pesquisas estão aí a comprovar. O recado das urnas municipais foi dado.
Com o segundo ano de mandato no fim e o debate de 2026 na porta, Lula tem dois caminhos a seguir. Como diria aquele livro grosso e milenar, “larga é a porta, e espaçoso o caminho que conduz à perdição”. O presidente precisa decidir se vai pela porta estreita do controle fiscal defendido por Haddad ou se segue Dilma Rousseff que, em 2013, ensinou: “podemos fazer o diabo quando é hora de eleição”. Não é mesmo um filme novo.