Demorou, mas Jair Bolsonaro finalmente falou das 500.000 mortes na pandemia, uma triste marca alcançada pelo Brasil no fim de semana. Irritado, aos berros e, claro, reclamando da imprensa, ele mandou uma jornalista que fez uma pergunta sobre o uso de máscaras calar a boca depois de tentar mostrar-se sensível aos brasileiros de luto.
“Lamento todos os óbitos, lamento muito, qualquer óbito é uma dor na família”, disse Bolsonaro, após um evento da Aeronáutica em Guaratinguetá, no interior de São Paulo.
Na sequência, o presidente, negacionista, voltou a falar do tratamento precoce, bandeira do governo investigada na CPI da Pandemia por dar milhões a laboratórios que produzem medicamentos dados a pacientes de Covid-19, mesmo diante da comprovada ineficácia contra a doença.
“E nós, desde o começo, o governo federal teve coragem de falar em tratamento precoce. E alguns até dizem, né?, como está sendo conduzida essa questão, parece que é melhor se consultar com jornalistas do que com médicos”, declarou, insistindo ainda no tal “documento oficial” do TCU.
Quando uma repórter da Rede Vanguarda, afiliada da TV Globo no interior de São Paulo, lembrou que ele foi multado no Estado por não usar máscara durante ato político há 10 dias e tentou formular um questionamento, Bolsonaro a interrompeu:
“Você quer fazer uma pergunta decente, eu respondo. Você é da Globo?”, rebateu o presidente, que nesse momento usava uma máscara com o símbolo da Aeronáutica. Ele aproveitou outra pergunta para mudar de assunto, passou a palavra para a deputada federal bolsonarista Carla Zambelli, e depois retomou o ataque à jornalista, com mais ênfase.
“Rede Globo, eu estava com um capacete balístico à prova de 762. Então eu vou ser multado toda vez que andar de moto por aí. Eu sou um alvo… “, afirmou. A repórter tentou perguntar e ele interrompeu novamente: “Deixa eu falar falar? Deixa eu poder falar? Porque eu sou um alvo de canalhas do Brasil. Dá pra calar a boca aí atrás, por favor?”, complementou, irritado com o barulho dos próprios assessores.
A jornalista apontou que o presidente chegou ao evento desta segunda-feira também sem máscara — e sem capacete — e Bolsonaro perdeu ainda mais o controle.
“Olha… eu chego como eu quiser, onde eu quiser, tá certo? Eu cuido da minha vida. Se você não quiser usar máscara, você não use. Agora tudo o que eu falei sobre Covid, infelizmente pra vocês, deu certo. Tratamento precoce salvou a minha vida e mais 200 pessoas no prédio. Muitos jornalistas falam comigo reservadamente que usaram hidroxicloroquina, que usaram ivermectina. Por que vocês não admitem isso? Porque você acha que eu devo me consultar com o Bonner ou com a Míriam Leitão sobre esse assunto? Parem de tocar no assunto… Você quer botar?”, declarou, em tom ríspido.
Nesse momento, transtornado, o presidente tirou a máscara do rosto, diante da jornalista.
“Me bota no Jornal Nacional agora… vai botar agora? Estou sem máscara em Guaratinguetá. Está feliz agora? Você está feliz agora? Essa Globo é uma merda de imprensa. Vocês são uma porcaria de imprensa”, berrou.
A repórter levou o microfone tentou fazer uma pergunta, em vão.
“Cala a boca. Vocês são canalhas. Vocês fazem um jornalismo canalha. Vocês não ajudam em nada. Vocês destroem a família brasileira, destroem a religião brasileira, vocês não prestam. A Rede Globo não presta. É um péssimo órgão de informação. Se você não assiste à Globo, você não tem informação, se assiste, está desinformado. Você tinha que ter vergonha na cara, se prestar a um serviço porco que é esse que você faz na Rede Globo. Obrigado”, concluiu Bolsonaro.
Carla Zambelli, que usava máscara, também retirou a peça durante o chilique do presidente.