O procurador-geral da República, Augusto Aras, determinou a abertura de investigação contra os responsáveis por promover invasões a hospitais na pandemia. O procedimento pede aos procuradores-gerais de Justiça que reúnam elementos sobre episódios ocorridos nos estados para responsabilização de políticos e outras pessoas que tenham promovido desordem ao entrar em unidades de saúde.
“Conforme amplamente divulgado nos meios de comunicação em massa, nos últimos dias, têm ocorrido, em variados locais do país, episódios de ameaças e agressões a profissionais de saúde que atuam no combate à epidemia do vírus Covid-19, além de danos ao patrimônio público. Nesse sentido, chegou ao conhecimento deste signatário o conteúdo de gravação audiovisual de evento supostamente ocorrido na última terça-feira (dia 09 de junho de 2020), em que um indivíduo ofende profissional de saúde em frente ao Hospital Regional de Ceilândia, causando perturbação ao funcionamento da mencionada unidade”, diz o pedido de Augusto Aras.
“Indubitavelmente, condutas dessa natureza colocam em risco a integridade física dos valorosos profissionais que se dedicam, de forma obstinada, a reverter uma crise sanitária sem precedentes na história do país. Observadas as condições de procedibilidade, os eventos narrados, dotados de gravidade, podem ensejar, em tese, a responsabilidade criminal dos seus autores, razão pela qual solicito a Vossa Excelência a distribuição da presente notícia-crime para adoção das medidas que o(a) Promotor(a) natural compreender necessárias”, segue Aras.
A medida ocorre depois de o presidente Jair Bolsonaro ter defendido a ação de militantes numa live. “Seria bom você fazer na ponta da linha. Tem hospital de campanha perto de você, hospital público, arranja uma maneira de entrar e filmar. Muita gente está fazendo isso e mais gente tem que fazer para mostrar se os leitos estão ocupados ou não, se os gastos são compatíveis ou não. Isso nos ajuda”, disse Bolsonaro.
Apesar das declarações, o presidente não é alvo do procedimento porque, na avaliação da PGR, a conduta de Bolsonaro não configuraria crime. A ação ilegal, na visão da PGR — e também como destacou o ministro do STF Gilmar Mendes neste domingo –, está no ato dos invasores. A PGR vai atuar até mesmo contra pessoas com foro privilegiado que invadiram unidades de saúde.
“Invadir hospitais é crime – estimular também. O Ministério Público (a PGR e os MPs Estaduais) devem atuar imediatamente. É vergonhoso – para não dizer ridículo – que agentes públicos se prestem a alimentar teorias da conspiração, colocando em risco a saúde pública”, disse Mendes.
No dia 5 de junho, um grupo de cinco deputados estaduais de São Paulo invadiu o Hospital de Campanha do Anhembi para realizar supostamente uma vistoria no local. O episódio terminou em tumulto.
Na quinta passada, o presidente defendeu que outros apoiadores fizessem o mesmo em outros hospitais do país. Um dia depois, cinco pessoas de uma família invadiram um hospital no Rio, provocando tumulto e danificando equipamentos do lugar. Já neste domingo, cinco deputados estaduais invadiram um hospital no Espírito Santo.
As declarações de Bolsonaro provocaram reações dentro e fora da política. Governadores de nove estados do Nordeste publicaram uma carta na sexta-feira em que rebatem o pedido de Jair Bolsonaro para que a população invada os hospitais – feito numa live nesta quinta-feira.
No documento, os governadores dizem que Bolsonaro segue o “mesmo método inconsequente que o levou a incentivar aglomerações por todo o país, contrariando as orientações científicas, bem como a estimular agre ssões contra jornalistas e veículos de comunicação, violando a liberdade de imprensa garantida na Constituição”.
O Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) classificou como “descabida” a incitação feita por Bolsonaro a seus seguidores para que invadam hospitais públicos e de campanha e façam gravações em vídeo sobre a situação dos leitos. Se, de fato, estão ocupados por pacientes com a Covid-19.