A vida não para. Não para, não. E não é o fim do mundo, embora pareça. São mais de 120 dias de quarentena. Quem pode segue em casa, cumprindo todos os protocolos de defesa. Também muita reza e oferendas. Todas com entregas on-line. Como manda o figurino.
Embora os dias passem e a vida siga, não passa o medo. O maior de todos os muitos outros pavores que sentimos do nascimento à morte. O corona é, ou pode ser, a morte à sua porta – no saco de compras, no corrimão da escada, num descuido da mão mal lavada.
O medo dessa novíssima modalidade de falecimento vem com o agravante que o dito cujo pode ser dos piores – só você e o vírus, sem nenhum dos seus por perto, na solidão fria de um hospital frenético. Você, que se achava melhor em alguma coisa, que se achava protetor e protegido, neste momento é só mais um só, buscando proteção até da água sanitária que desprezava tanto.
De tirar sono.
Mas não é o fim do mundo, embora sejam muitos os indicativos de que possa ser. Não bastasse o corona, ainda há o Bolsonaro, o Trump, o Olavo de Carvalho, os terraplanistas, os laranjas, as milícias e os milicos, a ameaçadora nuvem de gafanhotos, o tufão bomba e o menino da Naja.
Pra quem não soube, Pedro Henrique Santos Krambec Lehmkul, na quarta-feira, 8, em Brasília, foi picado por uma Naja. Sim, uma Naja, peçonhenta alienígena em terras brasileiras.
O rapaz de 22 anos é estudante de medicina veterinária. Mas nem a Naja, nem a picada têm nada a ver com a modalidade de estudos do Pedro, que escapou por pouco ou por muito que a família guarda em banco.
Entre a picada e o salvamento, a Naja, importada sabe-se lá de onde, saiu do papel de vilã para o de heroína. Seu bote certeiro no rapaz revelou um submundo de tráfico de animais, digamos, raros. Além de muitas cobras, havia três tubarões guardados em tanque doméstico. Três tubarões desses mesmos que comem gente. Assim como se fossem peixinhos de aquário. Tudo no DF e entorno. Tudo ainda em investigação.
Pra gente não descansar a alminha desassustada, ainda entre os presos no escândalo da Saúde no Rio de Janeiro, aparece de novo milhões em malas – parece, 8,5 milhões em notas vivinhas e fotografáveis.
No estilo que tem marcado investigações do Rio de Janeiro, nada é muito claro. Quem portava as malas? Quem era do dono do bufunfa? Certo é que o secretário que deveria cuidar da saúde do Rio na pandemia, senhor Edmar Santos, tá no causo, que bate também nos cofres do governador Witzel e senhora.
E pensar que cada maço de notinhas daquelas poderia ajudar a salvar algumas das nossas 72 mil vidas levadas pelo covid…
Mesmo no modo ópera buffa de terror, o mundo, parece, não bateu no fim. Ainda que o Queiroz tenha merecido prisão domiciliar com direito estendido à sua “conje”, que nem presa ainda estava. (No caso, ensinou um meme, o mais apropriado seria prisão miliciar). Ainda que o novo ministro da Educação – o quarto – tenha certeza que as universidades públicas brasileiras ensinam sexo sem limites. (Droga. Perdi essas aulas…). Ainda que nosso Ministério da Saúde continue sem titular em plena pandemia.
Ainda que tudo isso junto, a vida não para. E, se a gente se encolhe, há o Ministro Gilmar pra dar nome aos bois de pernas quebradas, Naja pra dar troco, ema pra reagir. Numa picada, a cobra importada entregou um esquema inteiro. Ontem, uma das Emas do Palácio da Alvorada desconfiou de farelos dados e devolveu uma bicada das boas nas mãos do capitão-presidente. Não há mascara que engane emas.
Tânia Fusco é jornalista