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A solidão de Paulo Guedes

Reforma meia boca

Por Ricardo Noblat
Atualizado em 30 jul 2020, 19h50 - Publicado em 4 abr 2019, 07h00

Esqueceram de avisar a Paulo Guedes que a ida de um ministro à Câmara para debater matérias de interesse do governo é antes de tudo um espetáculo, e não necessariamente uma oportunidade de convencer os deputados sobre qualquer coisa.

Como tal, todo cuidado é pouco com as provocações dos mais enfezados e com as pegadinhas dos mais espertos. Cabe ao expositor defender suas ideias, mas sem estridência. Não cair na tentação de ser irônico. E ser afável até com os mais duros oponentes.

Essa seria tarefa para uma Madre Teresa de Calcutá? Nem tanto. De resto, na intimidade, Teresa de Calcutá era impaciente. Mas Antonio Palocci, quando ministro da Fazenda do governo Lula, saiu-se bem em quase todas as batalhas que travou na Câmara e no Senado.

Falta a Guedes experiência no trato com políticos. Sobra inteligência que o torna arrogante. De resto, deve estar se sentindo cada vez mais só na luta para que o Congresso aprove a reforma da Previdência. Daí o que ocorreu na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.

Dizer, por exemplo, que Lula fez por merecer governar duas vezes pode ter sido um ato de justiça, mas não angariou um único voto para o que Guedes deseja, e irritou não só o presidente Jair Bolsonaro como seus devotos mais desvairados.

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Sugerir ou desafiar os deputados a rejeitar o modelo proposto de reforma da Previdência para os militares soou mal entre os que vestem ou que vestiram farda, esses em número que não para de crescer na ocupação de cargos em todos os escalões do governo.

Reconhecer que caberá aos deputados e senadores aprovar ou não a reforma, além de redundante, deixa a impressão de que para ele, Guedes, não fará grande diferença, porque hoje ele é ministro, mas amanhã poderá não ser, e só quem perderá de verdade será o país.

Um dos garotos do capitão, Flávio Bolsonaro, viajou com o pai a Israel. O outro, Carlos, é vereador no Rio, e por lá estava ontem. O deputado federal Eduardo Bolsonaro poderia ter comparecido à sessão da Comissão para dar uma força a Guedes. Não o fez.

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De que adianta o PSL de Bolsonaro ser dono da segunda maior bancada da Câmara (a primeira é do PT) se não é capaz de dar cobertura ao principal ministro do governo na hora em que ele mais precisa? Mas não deu. Largou-o às feras.

De Onyx Lorenzoni, chefe da Casa Civil e um dos articuladores políticos do governo, Guedes ganhou um abraço à chegada, e foi só. O outro articulador, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, ministro da Secretaria do Governo, não é de frequentar o Congresso.

Se não mudar de ideia, se não preferir ir ao cinema com a mulher, ou à reza com amigos, Bolsonaro deverá a partir de hoje reunir-se com líderes de partidos para conversar sobre a reforma. Os líderes irão ao seu encontro para ouvir o que ele tem a dizer.

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Não lhe darão a chance de se queixar mais tarde de que ouviu pedidos de empregos ou de outras sinecuras. Não lhe prometerão os votos dos seus partidos para aprovar a reforma. Não confiam nele, nem em sua eventual disposição para compartilhar o poder.

Se Bolsonaro, que carece de votos para aprovar a reforma, hoje procede tão mal com os partidos, por que procederá melhor mais tarde quando já não mais precisar deles? A reforma da Previdência possível de ser aprovada ficará muito aquém do que a imaginada.

Deverá ser suficiente para que o país atravesse sem maiores convulsões os próximos trepidantes anos do governo do capitão, e só. Tudo recomeçará depois da eleição de 2022.

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