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Murillo de Aragão

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Lições venezuelanas

O fracasso das elites comprometeu o país e as instituições

Por Murillo de Aragão 4 ago 2024, 08h00
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  • A democracia, enquanto sistema político, depende da participação equitativa e representativa de todos os segmentos da sociedade. No entanto, em muitos contextos, as elites — que reúnem aqueles que detêm poder econômico, social e político — têm desempenhado um papel significativo no fracasso das democracias. Uma das principais formas é através da concentração de riqueza e recursos. Quando uma pequena elite controla a maior parte dos recursos econômicos, ela adquire a capacidade de influenciar políticas públicas e processos eleitorais a seu favor, marginalizando a maioria da população. Esse fenômeno ocorre quando são priorizados os próprios interesses em detrimento do bem comum, subvertendo os princípios e as práticas democráticas, e contribuindo para a erosão das instituições.

    A Venezuela é um exemplo claro do fracasso decorrente da atitude das elites. Nos anos 50, o país era um dos mais ricos do mundo. Deixou de ser pela soma inacreditável de erros cometidos por seus governantes. O fracasso em estabilizar a economia da Venezuela resultou na eleição de Hugo Chávez em 1998. Rafael Caldera, presidente que antecedeu Chávez, não conseguiu resolver os grandes problemas: as consequências da queda nos preços do petróleo, a recessão, a inflação elevada e uma enorme crise bancária. Explorando o descontentamento popular, Chávez foi eleito prometendo desafiar as elites e restabelecer a justiça no país.

    “O país era um dos mais ricos do mundo. Deixou de ser pela soma inacreditável de erros de seus governantes”

    A chamada revolução bolivariana alcançou alguns resultados positivos em seu início, com uma redução drástica da pobreza. Os bons resultados, porém, não duraram muito. Não à toa, cerca de 8 milhões de venezuelanos deixaram o país em busca de melhores condições de vida. A Venezuela chavista se transformou em um país de escassez e de filas. E o regime se tornou tão ou mais corrupto e opressivo que os anteriores. O prenúncio do crescimento da oposição ao chavismo já se apresentava em 2023, de forma suave, no sucesso retumbante da canção Caracas en el 2000, um hit nostálgico que diz: “O que eu daria por uma coisa assim / você e eu em Caracas como nos anos 2000 / o que eu daria por uma coisa assim (uma coisa assim) / raspadinha de cola e o dólar a mil”.

    Qual é a lição da Venezuela para o Brasil? O fracasso das elites abriu caminho para a tragédia venezuelana. Vale esclarecer que as elites incluem não apenas os ricos e abastados — temos também as elites intelectuais, acadêmicas, sindicais, entre outras. Os membros das elites detêm recursos significativos, em termos de riqueza, de autoridade política, de influência social e cultural, e desempenham um papel crucial na formação das políticas, na orientação das práticas culturais e na definição das normas sociais.

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    A qualidade das elites se reflete no desempenho econômico e social de um país. No Brasil, essa realidade não é diferente. Embora não sejamos piores no que tange à qualidade de nossas elites e instituições, estamos longe de desenvolver nosso potencial pleno devido ao egoísmo e à falta de compromisso de setores privilegiados. Venezuela e Argentina foram destruídas por uma sucessão de governos economicamente incompetentes, capturados por corporações e instituições extrativistas. Não podemos deixar que isso aconteça no Brasil.

    Publicado em VEJA de 2 de agosto de 2024, edição nº 2904

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