As práticas regenerativas na agricultura, ou ainda “agricultura regenerativa”, configuram um olhar inovador e holístico para o cultivo de alimentos, que vai além da simples produção e visa restaurar e melhorar os ecossistemas. Diferente dos métodos tradicionais, que dependem fortemente de insumos externos, na agricultura regenerativa, é necessário que haja mais sinergia com os processos naturais do ambiente.
Sistemas de produção sustentáveis já vem sendo desenvolvidos há vários anos, especialmente pelas instituições de pesquisa do setor (destaque para Embrapa). O plantio direto na palha, por exemplo, é uma prática que preza: 1) pelo mínimo revolvimento do solo, evitando a erosão e o carregamento de partículas; 2) pela conservação da cobertura vegetal nos solos, proporcionando a manutenção da umidade e aumento do teor de matéria-orgânica (reduz necessidade de fertilizantes químicos); e 3) a rotação de culturas, de diferentes espécies, quebrando o ciclo de algumas pragas e doenças e melhorando os atributos do solo. Estima-se que entre 35 e 40 milhões de hectares estejam atualmente sob sistema de plantio direto no país.
Outro caso é a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF), que tem ganhado espaço em diferentes regiões do Brasil, combinando culturas agrícolas com pastagens (pecuária) e cultivo de árvores. Ao longo dos primeiros anos, é possível o cultivo de grãos e a criação de animais, enquanto as árvores se desenvolvem e servem como barreiras de vento, contribuem para a manutenção da umidade do solo e a ciclagem de nutrientes. Algumas safras mais tarde, as árvores estão prontas para virar madeira ou celulose. Em suma, ao menos três produtos estão sendo cultivados em uma mesma área e em um mesmo ano. Uma pesquisa da Embrapa Agrossilvipastoril (MT) comprovou que os sistemas ILPF têm papel importante também na mitigação de gases de efeito estufa, ao sequestrar carbono da atmosfera em maior quantidade do que a emissão.
No consórcio de culturas, diferentes espécies de plantas são cultivadas ao mesmo tempo em linhas paralelas, ao passo que, quando uma delas finaliza seu ciclo, a outra já está em estágio avançado de desenvolvimento. Um caso bastante tradicional deste modelo é o cultivo de milho com espécies de gramíneas (braquiária). As duas plantas se desenvolvem ao mesmo tempo (com maior predominância do milho) e no momento da colheita do grão, a gramínea já está pronta para formar um pasto para criação de animais.
A economia circular também configura uma prática regenerativa, uma vez que devolve subprodutos ao ambiente, a exemplo dos dejetos animais ou resíduos industriais, que voltam para as lavouras como fertilizantes. Há ainda os biológicos e os bioinsumos, área que tem crescido de forma bastante expressiva nos últimos anos, trazendo resultados positivos para o setor.
Além das vantagens ambientais, as práticas regenerativas possibilitam aos produtores ganhos econômicos. Os custos operacionais podem ser reduzidos, uma vez que o próprio sistema contribui para: 1) a ciclagem de nutrientes (economia com fertilizantes); 2) a manutenção da umidade (economia com irrigação); 3) a preservação das partículas do solo (economia com operações agrícolas); 4) em alguns casos, o controle de pragas e doenças (economia com defensivos); entre outros. No médio prazo, o agricultor ainda poderá explorar os ganhos que estes modelos trazem para a agregação de valor aos produtos agrícolas (modelo sustentável) e o pagamento por serviços ambientais (como a estocagem do CO2 no solo).
A “agricultura regenerativa” é uma abordagem que preconiza modelos de produção que contribuam com o desenvolvimento sustentável na produção de alimentos, bioenergia e outros agroprodutos. Ao adotarmos estes sistemas, não apenas asseguramos a sustentabilidade do setor agrícola, como também construímos um caminho para um futuro alimentar mais equitativo, saudável e resiliente.
Marcos Fava Neves é professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP (Ribeirão Preto – SP) da FGV (São Paulo – SP) e fundador da Harven Agribusiness School (Ribeirão Preto – SP). É especialista em Planejamento Estratégico do Agronegócio. Confira textos e outros materiais em harvenschool.com e veja os vídeos no Youtube (Marcos Fava Neves). Agradecimentos a Vinicius Cambaúva e Rafael Rosalino.