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Mundialista

Por Vilma Gryzinski
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O racha interno em Israel produz radicalização como vimos no Brasil

Deveria ser um alerta: quando pessoas razoáveis passam a pedir a morte do antagonista político, as coisas vão de mal e tendem a piorar

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 23 fev 2023, 12h24 - Publicado em 6 fev 2023, 07h53

Israelenses, por favor, não façam isso. Já temos experiência suficiente para aconselhar um país acostumado a viver na beira do abismo, mas que nunca esteve tão perto dele por causa da extrema divisão interna.

Vejam o caso de Zeev Raz, piloto da reserva da Força Aérea e herói nacional que em 1981 participou da missão que tirou do mapa o programa nuclear secreto de Saddam Hussein. 

O ódio a Benjamin Netanyahu e ao governo de extrema direita que montou para ter maioria no parlamento levou o homem que deveria ser uma fonte de sabedoria a escrever o seguinte no Twitter: “Se um primeiro-ministro assume poderes ditatoriais, ele é um homem morto. Simples assim”.

Raz, que há anos participa de manifestações contra Netanyahu, saiu do campo do direito legítimo, quando não necessário, ao protesto político para entrar no terreno amaldiçoado da pregação da violência. Ele chegou a invocar um princípio da religião judaica chamado din rodef, que permite a execução sumária de um indivíduo que está prestes a causar grande mal ou até a morte de outros.

Outro cidadão que deveria ser um exemplo de comportamento cívico, o advogado comercial David Hodek, condecorado por bravura como tripulante de tanque na guerra do Yom Kippur, em 1973, fez um discurso na ordem dos advogados dizendo que “se alguém me obriga a viver numa ditadura e eu não tenho escolha, não hesitaria em usar fogo vivo”.

Foram abertos processos contra ambos e Zeev Raz se retratou, mas o mal estava feito. Com um agravante: o conceito de din rodef foi usado, com sinal trocado, pelos nacionalistas de ultradireita, na época que precedeu o assassinato do primeiro-ministro Yitzhak Rabin. 

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Rabin não era nenhum esquerdista, embora pertencesse ao então importante Partido Trabalhista, e havia comandado algumas das maiores intervenções militares israelenses, como a legendária Operação Entebbe, e a repressão à primeira intifada, mas negociou os Acordos de Oslo com Yasser Arafat. Pela lógica, os acordos acabariam conduzindo a um Estado palestino. Rabin foi assassinado por um radical de direita, Yigal Amir, em 4 de novembro de 1995. Do ponto de vista de Amir, ele estava prestes a causar um grande mal a Israel.

Hoje, defensores de posições ideológicas similares participam do governo de coalizão de Netanyahu, um político astutíssimo e pragmático que coloca a si mesmo como garantia de que vai barrar os exageros mais radicais de seus parceiros.

Problema: Netanyahu enfrenta três processos por corrupção e quer aproveitar a maioria – precária, como quase sempre na política israelense – para interferir na composição, nos atributos e na autoridade da Suprema Corte. 

As grandes manifestações de protesto contra ele, incluindo as acusações exageradas de que assumiria poderes ditatoriais, têm como base a discussão sobre as mudanças na Suprema Corte, instituições que passaram a assumir posições mais discutíveis em países com casos de corrução envolvendo governantes (na Argentina, é um governo de esquerda que pede o impeachment de nada menos que todos os integrantes do órgão máximo da justiça).

Uma ampla gama de setores sociais, e não apenas de esquerda, vê uma ameaça à democracia. Ontem, mais de cinquenta executivos de empresas variadas pediram um diálogo nacional sobre a “revolução jurídica, tal como tem avançado, que está aprofundando as divisões entre a população e pode prejudicar a economia israelense”.

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Netanyahu disse na semana passada que está disposto a “ouvir contra-ofertas” sobre o pacote de mudanças para desidratar a Suprema Corte que inclui, entre outras alterações, o fim do direito à palavra final sobre a constitucionalidade de projetos do governo. O Knesset, o parlamento unicameral de Israel, poderia derrubar decisões desse tipo com maioria simples de 61 votos.

Os protestos são diários e tão apaixonados que no mesmo dia do terrível atentado em que sete pessoas foram mortas na frente de uma sinagoga, os manifestantes fizeram um minuto de silêncio pelas vítima e foram em frente. Setores econômicos manifestam preocupação com consequências graves, como a saída de investidores devido ao ambiente de volatilidade política, e os Estados Unidos tentam acalmar as feras de dentro do governo, exercendo uma inevitável pressão sobre o primeiro-ministro de um país que precisa dos americanos.

Netanyahu não tem nada de autossabotador e entende perfeitamente os elementos envolvidos. Será capaz de recuar para evitar prejuízos mais graves ao país? Conseguirá administrar os radicais que trouxe para o governo? Sobreviverá aos processos que continuam a correr mesmo com ele de volta ao cargo de primeiro-ministro?

São questões existenciais em aberto, com uma única certeza: incitar à morte de dirigentes, seja pela esquerda, seja pela direita, só piora a qualidade institucional da nação e traz prejuízos a toda a sociedade. 

Israelenses, acreditem em quem já passou, ou continua passando, por isso.

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