Mon Dieu! A enorme surpresa eleitoral na França e dilemas da esquerda
A frente formada às pressas depois da convocação inesperada de eleições tem agora o teste mais difícil, talvez impossível: manter união
O que têm em comum o Partido Socialista, o comunista, os verdes e os trotskistas da França Insubmissa, uma espécie de PSOL gaulês? Isso é o que será posto à prova agora, depois da “maior surpresa política na história moderna da França”, na qualificação do comentarista Alain Bechamel, com a vitória da Nova Frente Popular — sem evidentemente conseguir a maioria para governar sozinha, mas o suficiente para lançar o país num liquidificador de incógnitas.
A explicação para um derrotado terceiro lugar da direita nacionalista da Reunião Nacional vai ser vasculhada durante muito tempo, embora a tática já conhecida do “cordão sanitário” seja a resposta mais óbvia: 224 candidatos, na maioria da França Insubmissa e da frente centrista de Emmanuel Macron, a Juntos, abdicaram de concorrer no segundo turno para boicotar as chances da Reunião Nacional.
Uma “aliança da vergonha”, reclamou Jordan Bardella, a estrela ascendente da direita nacionalista. Não adianta: apesar do número recorde de deputados de seu partido, perdeu e pronto.
O que concentra as atenções no problema que dominará a política: pode a frente de esquerda, composta de elementos tão díspares, evitar se dividir, como é tão característico?
O primeiro teste já está armado. Quem será o primeiro-ministro escolhido pela Nova Frente Popular? Quais são as chances de Jean-Luc Mélenchon, um nome com o nível de rejeição do mesmo nível que Marine Le Pen? Seria aceitável um nome muito menos rejeitado como o de Raphaël Glucksman, com seu próprio partido de centro-esquerda, o Praça Pública?
E como irá Emmanuel Macron viver sob o novo regime de “coabitação” — presidente de um partido, primeiro-ministro de outro?
Foi ele quem deu tiros de canhão no próprio pé, ao convocar uma eleição excepcional que não era absolutamente necessária. Agora, vire-se.
O segundo lugar para o Juntos foi uma notícia boa para Macron, mas não elimina o fato de que ele terá o poder, que pretendeu no passado exercer de maneira “jupiteriana”, notavelmente diminuído.
Estranhos abraçaram-se nas ruas comemorando a vitória da esquerda, mas agora é o teste da realidade que vai contar. As disputas entre a “gauche” francesa são históricas e não há por que imaginar que serão menores agora.