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França clama por maioridade penal aos 16 e responsabilização dos pais

Entre outras medidas propostas por partidos de centro e direita que contam com apoio maciço da opinião pública para punir a violência

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 14 Maio 2024, 00h21 - Publicado em 12 jul 2023, 07h36
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  • Não acreditem no que tantos órgãos de imprensa dizem sobre a explosão de violência na França, acusando a polícia de ser racista e os jovens que devastaram inúmeras cidades de serem pobres vítimas de uma sociedade que os discrimina.

    Os franceses, pelo menos, não acreditam, mesmo que sejam os campeões mundiais de professores universitários e outros iluminados da casta acadêmica que põem a culpa na população. Várias pesquisas feitas depois da onda de destruição que se seguiu à morte de Nahel Merzouk, de 17 anos, por arrancar com um carro irregular diante de dois policiais de moto que o perseguiam por direção perigosa na faixa de ônibus, mostram resultados impressionantes.

    Por exemplo, 77% confiam na polícia — 18% não confiam, segundo uma pesquisa BVA. Também 77% acham que a polícia age, de forma geral, dentro dos princípios de obediência aos regulamentos necessários para a instituição à qual a sociedade concede o uso da força.

    Outros resultados majoritários: pena de prisão fechada para os destruidores do patrimônio público e diminuição da maioridade penal para 16 anos — que enquadraria a grande maioria dos responsáveis pelas depredações, saques e incêndios, na faixa dos 17 aos 18 anos — e até reinstauração do serviço militar obrigatório, abolido em 1995, como forma de propagar ensinamentos básicos sobre disciplina para jovens.

    O tradicional partido de centro-direita, Republicanos, autor de várias dessas propostas, também quer que os diversos auxílios sociais recebidos por mães e pais de jovens detidos sejam cortados. E que os pais sejam responsabilizados, com multas, por permitirem que seus filhos saiam as ruas e ponham fogo nas cidades.

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    As “sanções financeiras” aos pais são apoiadas por nada menos que 77% da opinião pública. E 75% apoiam a cassação da cidadania dos responsáveis pela baderna que tenham dupla nacionalidade, em geral de países como Argélia e Tunísia, origem da maioria da população com ascendência estrangeira.

    Na hora do balanço da terrível destruição, que alcançou mais de 5 500 veículos, inclusive de transporte público, e 1 100 edificações, o desespero se manifesta em propostas como a do prefeito se Saint-Gratien, Julian Bachard, exasperado com a violência insana que levou ao incêndio do centro cultural Camille Claudel e da área pública de esportes de sua cidade, instituições mantidas, como diz o nome, em favor do público.

    Bachard anunciou para a população que não ia reconstruir nada enquanto “nós não tivermos os nomes dos autores dos fatos”. É injusto que moradores paguem pela destruição “causada por bandos de jovens menores cujos pais não os vigiam”.

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    É claro que ele não pode fazer isso, mas o simples fato de que proponha uma espécie de delação obrigatória mostra o estado de quase desespero de grande parte da população. Uma pesquisa feita pelo jornal Le Figaro mostrou que 84% dos franceses sentiram raiva diante das cenas violentas que se espalharam durante quase uma semana e 66% ficaram com medo. Pior: nada menos que 89% ficaram preocupados com o futuro do país. E 71% querem diminuir os fluxos migratórios.

    O policial que matou Merzouk, Florian Menesplier, continua preso e o endereço de sua casa foi divulgado em blogs de extrema esquerda. A Justiça diz que ele deve continuar na temporária para não combinar versões com o outro policial envolvido e também porque haveria o risco de um recomeço da violência se ele fosse solto. Ou seja, tem medo da reação a uma iniciativa que “poderia reativar as perturbações excepcionais da ordem social”.

    Mas os franceses não culpam a si mesmos pela violência e sim “a falência de nossa política migratória” por possibilitar a entrada no país de uma grande quantidade de estrangeiros sem condições de assimilação. Outros fatores que apontam: aumento da criminalidade e do tráfico de drogas (62%) e desaparecimento da autoridade parental e das escolas (47%). Só 25% culpam as dificuldades econômicas e sociais da população de origem árabe e africana. Apenas simpatizantes do partido de extrema esquerda, França Insubmissa, têm uma maioria —  60% — que “compreende” a razão da violência. Nos números gerais, essa proporção cai para 18%.

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    A representatividade dos políticos eleitos também está ruim. Marine Le Pen, da direita dura, que teria mais a lucrar com o derretimento da ordem e a violência entre a população de origem migrante, sua grande bandeira, foi escolhida por 35% da opinião pública como quem mais representou os sentimentos dos franceses durante a crise. Quando a baderna estava no auge, com risco de afundamento total da ordem, ela foi cautelosa e disse que não era o momento de criticar o governo. Em seguida, passou a fazer exatamente isso.

    Emmanuel Macron recebeu apenas 20% de apoio nessa pesquisa, onde a opção mais “votada”, com 37%, foi “Nenhum deles”.

    A crise de representatividade é apenas um dos problemas graves do país. Vários intelectuais de direita — existe isso na França — têm dito nos últimos anos que o país corre o risco de uma guerra civil, um racha da população de origem migratória e, na maioria, religião muçulmana, muitas vezes usada para criar uma identidade separada e oposta à francesa. “Os acontecimentos mostraram que a desintegração ameaçou nosso país e que, sem a diminuição dos fluxos migratórios, ela se tornará inevitável”, disse, de modo bem direto, um dos intelectuais mais ouvidos da França, Alain Finkielkraut.

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    Um exemplo, por enquanto muito limitado, de que esse terrível caminho não é tão hipotético assim: homens jovens, fortes, de rosto coberto e com treinamento militar interferiram no quebra-quebra na cidade de Lorient, imobilizando pessoas que participavam da violência e as entregando, com algemas de plástico, à polícia. Numa entrevista anônima a um jornal local, um fuzileiro naval de 25 anos disse que um grupo de trinta colegas, de uma base da Marinha na cidade, entrou em ação “para não deixar o país pegar fogo”. A Marinha está investigando.

    Alguma dúvida de que isso pode acontecer, e em escala maior, quando, inevitavelmente, uma nova onda de violência engolfar a França?

    Um dos sinais de que a normalização pode derrapar a qualquer momento é a grande mobilização de segurança que cerca a comemoração da data nacional, o 14 de julho, o revolucionário dia da tomada da Bastilha. A proibição de fogos de artifício, abundantemente usados para atacar policiais e incendiar prédios, mostra a instabilidade.

    A França teme que a parcela de seus habitantes que não se consideram franceses arme novo quebra-quebra nessa sexta-feira, um dia que deveria ser de festa nacional. Não é, definitivamente, uma situação saudável e nem há nenhuma solução viável à vista.

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