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Crônicas do corona: o que é perto demais? E a bandidagem?

Saber se um corredor resfolegante pode contaminar gente em volta pode até ser explicado, também a “cooperação” de criminosos, mas enigmas persistem

Por Vilma Gryzinski 28 abr 2020, 07h38

Nunca tantos se informaram sobre um assunto tão rapidamente. E nunca um assunto mostrou tão na lata como pode ser escorregadio.

A resposta a algumas dúvidas pode trazer até alívio – sentimento tão raro na pandemia. Outras continuam misteriosas.

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Algumas delas:

1- Qual é o risco de ser contaminado por um outro humano que, sem consideração pelo próximo, passa correndo e resfolegando? E os ciclistas que pedalam e falam ao celular, numa suspeita nuvem de perdigotos?

A ideia de que o vírus maldito está no ar, esperando para emboscar vítimas incautas, infunde um pavor maior ainda do que os estragos reais que ele causa. 

Um gráfico muito divulgado, feito por dois engenheiros, um belga e um holandês, aumentou ainda mais o temor, “replicando”  a nuvem contaminada do espirro de um corredor num parque, como um jato maligno que exigiria uma distância de até 16 metros para proteger o passante incauto.

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“O risco de transmissão de um vírus pelo ar em ambientes abertos é provavelmente muito baixo, embora não tenha sido definitivamente mensurado”, disse ao site Vox uma virologista de Columbia, Angela Rassmussen.

O gráfico da “nuvem” não leva em conta como as gotículas se locomovem em ambiente ao ar livre e qual a carga viral que precisariam “transportar” para contaminar um passante.

Também é preciso distinguir entre as gotículas contaminadas e a forma aerossolizada, está um dos maiores riscos em procedimentos como entubar e desentubar pacientes com Covid-19.

A sequência de acontecimentos infelizes descrita por Angela Rassmussen e outra pesquisadora, Lydia Bourouiba, do MIT, para a contaminação ao ar livre exigiria o seguinte:

“As partículas – em quantidade suficiente para desencadear uma infecção – têm que ser expelidas com força suficiente para chegar até você. O vírus dentro dessas partículas tem que sobreviver enquanto luz do sol, umidade, vento e outras forças trabalham para fazê-las decair e se dispersar.”

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“As partículas também precisam aterrissar direto na sua garganta ou trato respiratório – ou nas suas mãos, que daí você usaria para tocar seus olhos, nariz ou boca – e elas precisam também ultrapassar todas as barreiras do sistema respiratório, como os pelos dentro do nariz e a mucosidade.”

E ainda precisam se acoplar aos receptores celulares que usam para invadir as células e se replicar.

Ar livre, distância de dois metros e, preferencialmente, máscara dos dois lados tornam isso muito, muito mais difícil.

2- Por que em alguns países, como o Equador (576 mortes, mas ninguém acredita nos números, nem mesmo o governo), a Covid-19 faz estragos tão grandes, e é tão brando em outros, similares, como o Paraguai (nove mortes).

Ninguém pode cravar. A pandemia ainda está em pleno desenvolvimento, especialmente nos lugares onde chegou por último, como a América do Sul.

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A explosão no Equador, especialmente em Guayaquil, onde os corpos putrefatos em casas e ruas  se tornaram a imagem da falência do sistema de saúde que a epidemia pode provocar em cidades despreparadas, “é mais assustadora ainda por ser impossível de explicar”, anotou uma ótima reportagem do New York Times.

“Alguns lugares simplesmente têm mais sorte? Ou fatores locais desconhecidos causam as dramáticas disparidades”.

Em Guayaquil, onde a epidemia começou com o retorno de pessoas que haviam visitado a Espanha, e na região das Guyas, a população é bem mais jovem do que na Europa e a densidade populacional é muito menor.

A mortalidade no Equador foi calculada em 15 vezes mais do que os números oficiais. O pico de casos, na primeira quinzena do mês, foi maior do que na Espanha e na Grã-Bretanha.

3- Comparativamente, o Equador, onde muitos americanos aposentados foram morar por causa do ambiente ameno e do custo de vida mais baixo, tem uma situação econômica melhor do que El Salvador, o explosivo país centro-americano campeão de criminalidade e de onde veio a impressionante foto acima.

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Mas os casos de Covid-19 dão menos de 350 infectados e oito mortes.

Os presos colocados em isolamento ou solitária por ordem do presidente Nayeb Bukele, em condições que nem precisam ser descritas, estavam sendo punidos pelo aumento de homicídios – 59 no fim de semana que antecedeu a punição.

As tatuagens dos presos mostram o poder das “maras”, as gangues que dominam o país e se espalham pelos Estados Unidos. Mas os índices de homicídio vinham caindo e o governo de Bukele, uma figura de ficção latino-americana que expulsou todos os representantes do governo venezuelano no país assim que tomou posse, conseguiu uma redução mais acentuada.

Por que o aumento que desencadeou a punição coletiva?

Possivelmente porque a pandemia está atrapalhando os negócios do crime e, assim, provocando disputas mais violentas entre bandos.

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O fenômeno atinge todo o crime organizado da América Latina.

O jornalista Héctor de Mauleon explicou assim a situação específica do México, que pode ser extrapolada:

“A venda de drogas nos Estados Unidos caiu. Os precursores químicos procedentes da China deixaram de chegar nos portos mexicanos. Ao mesmo tempo, aumentaram as complicações para o tráfico de drogas ao longo das fronteiras”.

“Este coquetel anunciar um salto nos índices de violência entre grupos rivais”.

No caso de El Salvador, o lucrativo negócio da extorsão foi mais afetado ainda.

E por que, em tantos países, o crime organizado estava cooperando com a quarentena decretada por diferentes governos, pelo menos no começo?

Primeiro, para ter menos polícia vigiando o isolamento. Segundo, como disseram membros de gangue entrevistados por um site salvadorenho, por medo.

“Estavam convencidos de que se a epidemia explodisse em El Salvador, nenhum hospital destinará respiradores para bandidos. Temem não conseguir cuidados médicos”.

E quem não tem o mesmo medo?

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