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Atentados históricos deixam dúvida eterna sobre os culpados

De Bob Kennedy, morto por defensor de causa palestina,  a Luis Galan, vítima de Escobar, paira legado de conspirações sobre verdadeiros assassinos

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 7 set 2018, 18h05 - Publicado em 7 set 2018, 08h27
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  • Pouco antes do último Natal, o filho de Robert Kennedy foi visitar o assassino de seu pai na cadeia da Califórnia. A mulher dele, a atriz Cheryl Hines, do cínico seriado de Larry David, ficou esperando três horas no carro.

    Bobby Jr. tem certeza que o autor do assassinato, Sirhan Sirhan, preso na própria cozinha do hotel californiano onde o senador foi baleado em 5 de julho de 1968, apenas cinco anos depois da monumentalmente trágica morte de seu irmão presidente, não foi o verdadeiro matador.

    Sirhan tinha a arma ( um mero revólver calibre .22 ), o motivo (a promessa de Bobby de enviar 50 aviões de guerra a Israel se fosse presidente), dezenas de testemunhas e uma explicação quase orgulhosa.

    Ao longo dos anos, repetiu-a a vários entrevistadores: queria “salvar” a Palestina, de onde tinha saído com a família, cristã ortodoxa, aos 12 anos.

    Mesmo assim, o filho mais velho do herdeiro político do mais famoso clã americano acha que foi outra pessoa que disparou o tiro fatal, na parte de trás da cabeça de Bobby Kennedy.

    Não está sozinho: Paul Shrade, assessor de Bobby que sobreviveu a ferimentos na cabeça, acha que o número de tiros disparados, treze, comprova a participação de um segundo assassino. O revólver de Sirhan tinha apenas oito balas. E ele estava na frente do candidato quando começou a disparar

    Como todos os magnicídios, os atentados contra candidatos a altos cargos, que interrompem uma narrativa antes mesmo que ela comece a ser contada para valer, despertam desconfianças eternas.

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    Bogotazo

    Em países avançados como os Estados Unidos ou em buracos atrasados como o Paquistão, é difícil engolir a ideia de um um sujeitinho armado com uma .22 tenha atingido Bobby no meio do mar de garçons que o cumprimentavam na cozinha do Ambassador ou um suicida com arma e bomba tenha avançado sozinho sobre a comitiva de Benazir Bhutto, a ex-primeira-ministra em campanha pela reeleição.

    Na Colômbia, com seu cruento prontuário de candidatos assassinados, até hoje se discute o mais consequente dos casos: a morte de Jorge Eliécer Gaitán, uma espécie de dissidente radical do Partido Liberal.

    O assassinato desencadeou as atrocidades revanchistas que ficaram conhecidas como La Violencia, um fase que durou dez anos, e deixou raízes malignas que se reproduziram ao longo de décadas, gerando movimentos armados de esquerda de uma brutalidade inominável cujos remanescentes persistem mesmo depois do último acordo de paz.

    Só na noite em que Gaitán foi baleado na frente de seu escritório de advocacia, em 4 de abril de 1948, houve mais de três mil mortes no Bogotazo. Prédios públicos, igrejas, escolas e o Palácio São Carlos foram incendiados.

    A multidão enfurecida arrastou pelas ruas o corpo linchado do assassino, um pedreiro chamado Juan Roa Sierra, aparentemente um desequilibrado perturbado por sessões “espíritas” e um pedido de ajuda rejeitado por Gaitán.

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    Mesmo tendo ocorrido na presença de funcionários e amigos com quem Gaitán havia saído para almoçar, o assassinato gerou as mais extremas teorias conspiratórias.

    O presidente Mariano Ospina, do Partido Conservador, que fechou o Congresso quando a coisa ficou feia para seu lado, achava que tudo tinha sido uma conspiração tramada pela inteligência soviética para desestabilizar o país e avançar sobre a parte continental do Caribe.

    Manifestações de esquerda já haviam tumultuado a Conferência Interamericana realizada naqueles dias trágicos em Bogotá.Um jovem cubano eloquente chamado Fidel Castro estava na cidade. Ospina achava que ele era um agente soviético. O embaixador americano também levantou sérias dúvidas sobre o papel de Roa.

    Outro atentado infame na Colômbia, em 1989, continua repercutindo até hoje. O general Miguel Maza foi condenado a 30 anos de cadeia em novembro de 2016, acusado de “homicídio com fins terroristas” ao mudar deliberadamente a equipe encarregada da segurança de Luis Carlos Galán, cuja morte a tiros de metralhadora num palanque na cidade de Soacha foi transmitida ao vivo.

    O general Maza era o chefe do DAS, o serviço secreto depois dissolvido e substituído por outro.

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    A série Narcos reproduz o assassinato de Galán, atingido por tiros de metralhadora que entram sob o colete a prova de balas que usava. John Jairo Velásquez, o chefe dos sicários do traficante, conhecido como Popeye, foi preso em 1992 e, com progressão da pena de trinta anos, solto em 2014.

    Galán tinha bloqueado uma lei que impediria a extradição de Escobar para os Estados Unidos e baseava sua campanha no combate ao flagelo da droga e ao poder sem paralelos alcançado  pelos grandes traficantes.

    Bizarramente, apesar dos olhos claros do candidato assassinado, Galán e Escobar tinham uma semelhança física, acentuada pelos cabelos encaracolados e o bigodão.

    As teorias conspiratórias sobre a associação do monstruoso e brilhante gênio do mal para matar o candidato popular, que tinha 60% das preferências, sobem mais altos escalões políticos.

    Bala mágica

    O mesmo acontece no caso do mexicano Luiz Donald Colossio, morto num comício em Tijuana em 23 de março de 1994. Um mecânico solitário confessou o crime logo depois dos tiros, mas o México não seria o México se acreditasse na extensa investigação.

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    Colossio era uma espécie de dissidente do PRI, o partido oficial. As suspeitas, obviamente, foram parar no colo de Carlos Salinas, o presidente à época.

    Sete meses depois do assassinato, a jovem, linda e elegante viúva de Colossio, Diana, que havia feito um comovente necrológio do marido e tentava investigar o crime por conta própria, morreu de câncer no pâncreas.

    Um assassinato político quase esquecido no Estados Unidos, o do populista Huey Long, um direitista que pregava o redistributivismo fiscal como forma de enfrentar a Grande Depressão, deixou suspeitas mais bizarras ainda.

    Huey, que tinha sido senador estadual e governador da Luisiana, sonhava enfrentar ninguém menos que Franklin Roosevelt, via um terceiro partido. Foi morto pelo genro de um juiz com quem tinha uma séria disputa política.

    O crime foi em plena Assembleia Estadual, o que não impediu os conspiracionismos habituais. Uma das versões: o genro médico, apesar do motivo, foi usado para encobrir um tiro fatal disparado por acaso por um dos guarda-costas de Huey Long.

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    De qualquer modo, o assassino não sobrou para dar sua versão. Morreu com 61 balas disparadas pelos guarda-costas.

    Desconfiar das versões oficiais pode ser uma reação saudável. Acreditar em qualquer versão, contanto que seja bem alucinada, é perda de tempo. Esperar respostas definitivas é inútil: os magnicídios, principalmente quando têm aspectos aleatórios e até inverossímeis como na “bala mágica” que fez uma trajetória espantosa até entrar na nunca de John Kennedy, sempre vão gerar dúvidas.

    Se até em países onde existe confiança nas autoridades, como nos Estados Unidos, predomina a confiança nas autoridades, o que pode acontecer num país como o Brasil?

     

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