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Blog de notícias exclusivas e opinião nas áreas de política, direitos humanos e meio ambiente. Jornalista desde 2000, Matheus Leitão é vencedor de prêmios como Esso e Vladimir Herzog
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Por que é perigoso perder o presidencialismo de coalizão?

Em artigo enviado à coluna, Rodrigo Vicente Silva analisa as miudezas da relação entre o governo federal e o Congresso nos últimos anos

Por Matheus Leitão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 9 Maio 2024, 11h55 - Publicado em 29 abr 2024, 07h05

Tem sido comum a máxima de que Arthur Lira mudou o peso que cada poder tem no jogo político, tornando o Legislativo mais forte, capaz de fazer frente ao Executivo federal. Em que momento tivemos essa virada e quão prejudicial pode ser um Congresso todo poderoso? Vale passar pelo histórico da governabilidade nos últimos anos e entender em que medida esse arranjo institucional mudou de rumo.

Um tema estudado e constantemente revisto pela academia e pelos formadores de opinião da política é o presidencialismo de coalizão. O arranjo simplificadamente funciona – ou funcionava – da seguinte forma: o presidente é eleito com uma pequena minoria no Congresso, de modo que para manter a governabilidade precisa obter apoio e distribuir as recompensas aos parlamentares em busca de base.

São vários os tipos de barganhas praticadas pelo Executivo para obter apoio: emendas parlamentares, nomeação de lideranças partidárias em ministérios e demais escalões. Era preciso ir ao atacado e alguns casos no varejo para buscar apoio parlamentar em votações. Foi um arranjo necessário e fundamental nos últimos 30 anos, dando conta, entre altos e baixos, de períodos mais amenos, mas também de crises como o impeachment de Dilma Rousseff.

Importante frisar: era normal ouvir muito barulho nos meios da imprensa e de entidades da sociedade civil sobre o que se chamava de “toma lá, dá cá” da política brasileira. Simplificadamente se criticava os acordos do que se convencionou chamar de presidencialismo de coalizão. Hoje, estão todos saudosos porque sabemos que era um meio necessário e importante para a governabilidade. Para além de práticas espúrias e casos flagrantes e abomináveis de corrupção, a negociação entre representantes de poderes é necessária e saudável para o processo democrático. Deputados e senadores são eleitos para representar e resolver demandas aos que confiaram seu voto a eles. Nada mais normal, portanto, que buscar jeitos e maneiras de concretizar as demandas dos eleitores.

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Em algum momento, isso começou a mudar. Alguns dizem que o problema começou com Eduardo Cunha, quando ele montou um grupo forte, amealhando mais de meio Congresso para ele. Em 2015, liderado por Cunha, o parlamento aprovou a emenda constitucional que instituiu as emendas impositivas, dando menos poder de barganha para o Executivo. Em seguida, veio o impeachment. Para governar, Michel Temer, sábio e experiente parlamentar, três vezes presidente da Câmara, sabia que era preciso ceder. De todo jeito, o fez dentro das prerrogativas do presidencialismo de coalizão. Nomeou na medida em que necessitava a representatividade dos deputados, distribuiu cargos e liberou emendas, muitas emendas, claro. O momento era de crise. Ninguém, nem pessoas, nem instituições saem incólumes de um processo de impedimento de um presidente da República. Estava pronto o cenário para o ator menos fragilizado do processo, o Congresso, pedir ainda mais.

Nesse ínterim, chega Rodrigo Maia que soube liderar o processo e trazer ainda mais poder, mesmo que simbólico, para a casa que presidia. Não bastasse toda crise, as eleições 2018 entregaram de bandeja para esse mesmo Congresso um presidente totalmente disfuncional. Figura folclórica do baixo clero, totalmente esquecido e desprestigiado pelos meandros do presidencialismo de coalizão, o qual atacava e denunciava como troca de favores e de “toma lá, dá cá”, Bolsonaro se negou a negociar com o Parlamento. Esse processo dura pouco, porque em meio a crises institucionais, chega junto um pandemia que varre tudo e deixa o mundo de cabeça para baixo. Bolsonaro é obrigado a ceder. Em um primeiro momento, Maia traz para si a responsabilidade de dar conta do problema. O mais forte de todos estava por vir: Arthur Lira. Astuto, o deputado soube colocar na mão o presidente que, àquela altura, em 2022, já estava atolado de problemas, não sabia e não queria governar e tinha um único objetivo: sobreviver politicamente.

Os defensores de Lira dizem que o deputado transformou o Legislativo em poder de fato; outros, que o alagoano erra a mão e cria uma barganha impossível de ser solucionada. Para os críticos, a ideia é que depois da presidência de Jair Bolsonaro – que relegou a governabilidade ao parlamento, abrindo mão da formulação de políticas públicas – ficou impossível o Congresso, em especial os deputados, se contentarem com menos. Para os que elogiam, a lógica é a de que o poder Legislativo funcionava com um puxadinho do Executivo.

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O que sabemos é que mudanças em instituições não acontecem da noite para o dia e dependem de uma série de variáveis para se concretizarem. A mudança na configuração de forças entre Legislativo e Executivo é um processo que envolve não só mudanças em leis e processos internos ao Parlamento, mas dependem de figuras fortes como as que têm presidido a casa nos últimos 10 anos. Eduardo Cunha e Rodrigo Maia impuseram força, conseguiram aumento de poder, mas foram vencidos por um misto de circunstâncias e institucionalidade.

Arthur Lira tem forçado a mão e tornado o presidencialismo de coalizão difícil de ser manejado. E sabemos bem de uma coisa: Lula não é Bolsonaro e não abrirá mão de governar. Mas, não nos esqueçamos, se não era assim tão bom com o presidencialismo de coalizão, muito mais difícil tem sido sem ele. E em um país grande, complexo e multifacetado como Brasil, que elege representantes muito por seus perfis e cria um embaraço entre presidente de um partido e deputados e senadores de outro, é saudável que haja harmonia e que governos eleitos possam implementar suas políticas, sem que um poder seja refém do outro. No caso de Lira, o gênio que sai da lâmpada, dificilmente volta, ou seja, temos um grande problema pela frente.

* Rodrigo Vicente Silva é Mestre e Doutorando em Ciência Política (UFPR-PR). Graduado em História (PUC-PR) e aluno de Jornalismo (Cásper Líbero). Editor-adjunto da Revista de Sociologia e Política é vinculado ao grupo de pesquisa Representação e Legitimidade Democrática (INCT-ReDem)

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