O presidente Jair Bolsonaro pediu a seus aliados mais próximos para gravarem vídeos afirmando que seu recuo, na verdade, não é um recuo. Nas gravações, eles deixam clara a ideia de que Bolsonaro pretende usar as aglomerações de apoiadores do dia 7 para continuar, se preciso for, a ameaçar os demais poderes.
O senador Marcos Rogério, principal brucutu bolsonarista na CPI da Covid, que insiste em propagar teorias falsas sobre a doença que apenas ajudam a ceifar mais vidas, diz em um vídeo que os demais poderes devem aceitar ser coadjuvantes de Bolsonaro, que estaria fortalecido pelo número de pessoas que conseguiu mobilizar no 7 de Setembro.
Rogério atribuiu ao ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello a seguinte frase: “paga-se um preço por viver em uma democracia”. Em seguida, disparou: “esse preço não pode ser pago apenas por uma figura ou Poder. Todos temos que estar dispostos a pagar. Se o presidente, mesmo com o inequívoco apoio popular, teve a disposição de, novamente, se abrir ao diálogo, o mínimo que se espera é que as demais instituições tenham a humildade de fazer o mesmo. Não como vencedores ou senhoras [sic] da razão, mas como coadjuvantes nesse papel de pacificação nacional”.
O pacificador, segundo o aliado do presidente, seria o próprio Bolsonaro. “Mais do que criticá-lo, vendo um recuo, é preciso considerar sua disposição, mais uma vez, de buscar a pacificação pelo bem do povo brasileiro”, disse.
Parece ilógico afirmar que um recuo não é um recuo. Mas esse movimento é o novo ápice da confusão mental do presidente e do caos que ele trouxe à administração federal. Alguns poucos políticos sabem como tirar proveito dessa bagunça para conseguir benefícios fisiológicos, que existem desde que a política é política.
O ministro Onyx Lorenzoni (DEM-RS), outro forte disseminador de desinformação, também gravou um vídeo que seria cômico se produzido fora do contexto trágico.
Lorenzoni diz que o que Bolsonaro fez não foi recuar, mas sim contra-atacar a esquerda de forma pacífica. “O presidente Bolsonaro, com o gesto da nota à nação, derrubou a tese da esquerda brasileira e latino-americana que falava em golpe no Brasil”. Segundo Lorenzoni, “o presidente é um estadista”.
A realidade é que Bolsonaro pediu e milhares de pessoas, de todo o Brasil, aderiram às suas fantasias golpistas. Extremistas religiosos, defensores da liberação do porte de arma, da pena de morte e do fechamento do Legislativo e do Judiciário foram às ruas de diversas capitais, tornando-se uma minoria barulhenta sob manipulação do bolsonarismo.
O presidente acabou percebendo que ele estava produzindo elementos que poderiam destruir seu governo. Ou seja: o gênio cultuado por Onyx e Marcos Rogério deu um tiro no próprio pé. Os caminhoneiros estavam trancando as rodovias nacionais e, assim, haveria desabastecimento e a inflação viraria um problema ainda pior do que já é.
Bolsonaro pediu que sua claque recuasse. Incapaz de articular frases com começo, meio e fim, por falta de preparo emocional e intelectual, o presidente precisou que seu antecessor, Michel Temer – de quem não é amigo nem colega — redigisse um texto para ele divulgar dizendo que escreveu.
A repercussão do texto foi a comemoração dos mercados e a redução da tensão com o Judiciário. Mas, a essa altura, só acredita em Papai Noel quem quer. Desde muito antes de ser eleito, Bolsonaro se regozija com sonhos golpistas. Agora que ele está no Planalto, não sairá do poder sem tentar suas ideias antidemocráticas.