Os atentados de 11 de setembro de 2001 no World Trade Center marcaram a história da civilização como símbolos da destruição. Tony Judt considerou o 11/9 uma espécie de final tardio do século 20, um fecho extra, um “sangrento post scriptum endereçado aos que possam ter esquecido as lições do século ou que não conseguiram aprendê-las”, encerrando uma cadeia de horrores evocadas por termos como “Auschwitz”, “Pearl Harbor”, “Hiroshima”, “Gulag”, “Bósnia” e “Ruanda”. Já Tzvetan Todorov considerou o 11/9 o verdadeiro início do século 21, ao reordenar o mundo em torno de um novo messianismo político, aquele que visa “impor o regime democrático e os direitos humanos pelas bombas”. Na verdade, se deixarmos de lado a discussão boba sobre finais e inícios de séculos, perceberemos que as visões de Judt e Todorov não são excludentes, mas complementares. George W. Bush disse: “esse conflito começou numa época e nas condições impostas por outros. Terminará da maneira e na hora de nossa escolha”. A confusa saída estadunidense do Afeganistão em 2021 provou justamente o contrário. Vinte anos depois, o Onze de Setembro atesta tanto a capacidade humana em violentar seu próximo como a incapacidade de formatar mentes e comportamentos à base da força.
A promoção da educação e o esforço dialogal permanecem como as ferramentas mais poderosas que os seres humanos dispõem para a cooperação civilizacional. A paranoia em exterminar ou isolar inimigos gera um ambiente enervante e extenuante. Quem é obcecado em construir muros não percebe que alguém pode cavar um túnel. Neste ponto, encontramos uma ponte entre o Onze de Setembro estadunidense e o Sete de Setembro brasileiro passado. O medo é motor da paranoia. É simplesmente constrangedor ver o chefe do Executivo, em pleno exercício do cargo, discursar, em clara campanha eleitoral, contra o Poder Judiciário, dizendo que não vai “obedecer” ao que for determinado por um Ministro do Supremo Tribunal Federal. O que se espera de líderes qualificados é capacidade de propor saídas concretas aos desafios sociais, não reclamações pueris. No Estado democrático de Direito o poder fiscaliza o poder. Para quem tem compromisso democrático, afirmar a descentralização, harmonia e o equilíbrio entre os poderes é sempre preferível às arbitrariedades das ditaduras. Na democracia, governar é dialogar.
O Onze de Setembro e seus congêneres revelam que a ambição fanática de instaurar uma ordem pela violência é mera manobra retórica, sem qualquer efeito prático para a construção de uma sociedade próspera. Como disse Billy Graham na Catedral Nacional em 14 de setembro de 2001, o mundo só se constrói se entendermos que precisamos uns dos outros. A despeito do ataque terrorista, a imagem do equilibrista Philippe Petit atravessando oito vezes as Torres Gêmeas em 6 de agosto de 1974 tornou-se um símbolo atemporal do inusitado. A reação à sua performance foi tão pitoresca que a justiça estadunidense o “sentenciou” a realizar uma nova performance para crianças no Central Park. Petit chegou a receber um “visto permanente” de acesso ao topo das torres pelas autoridades portuárias de New York. O próprio Petit afirmou que deu ao mundo uma “imagem de vida”. É sempre melhor gerar vida. Assim como os bombeiros de New York se tornaram símbolos de heroísmo: arriscando a vida para salvar outras.
* Davi Lago é pesquisador do Laboratório de Política, Comportamento e Mídia da Fundação São Paulo