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Matheus Leitão

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Blog de notícias exclusivas e opinião nas áreas de política, direitos humanos e meio ambiente. Jornalista desde 2000, Matheus Leitão é vencedor de prêmios como Esso e Vladimir Herzog
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A Lava Jato e a tentativa de ‘evitar o TCU’

Dinheiro destinado a projetos sociais e ações contra a corrupção seriam submetidos à fiscalização da Corte de contas. A ideia não agradou...

Por Matheus Leitão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 9 Maio 2024, 10h30 - Publicado em 9 fev 2024, 13h33

Com o levantamento de sigilo dos autos da investigação contra Transparência Internacional, revelou-se uma tentativa da Lava Jato de escapar do TCU. Chamou a atenção do ministro do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, e isso está claro nos autos, o relato de uma reunião que envolveu procuradores, representantes da TI e da Fundação Getúlio Vargas, em 2018, para definir como os recursos provenientes do acordo de leniência da J&F deveriam ser administrados.

O resumo da reunião, cujos prints estão nos autos, foi encaminhado no grupo do Telegram por um procurador identificado como Paulo. Nela, a observação de que a ONG havia cometido um “erro”. Na pressa de apresentar aos procuradores os estudos sobre a experiência internacional, a organização acabou não detalhando sobre como gerir os recursos – quase R$ 2,3 bilhões. A proposta do grupo, segundo o procurador, era evitar que os valores fossem direcionados ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (FDD), administrado por um conselho com representantes da União e da sociedade civil, com decisões submetidas ao TCU. 

“Haveria a discussão se não deveria ir ao FDD assumir, não a obrigação de pagar, mas a obrigação de fazer evitar passar pelo TCU, mas há o risco de virar um orçamento de investimento social”, pondera ele no relato. O FDD citado é o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, que é público e com gestão de vários órgãos públicos, incluindo CADE, e a fiscalização do TCU. 

A ideia defendida era montar um “sistema de governança” para “gestão dos recursos” por meio da controversa fundação, que não prestaria conta a ninguém. O projeto foi vetado pela própria PGR. O conteúdo da mensagem é uma das peças que será investigada por determinação do ministro.

Questionada pela coluna, a Transparência Brasil afirma que “a TI jamais propôs qualquer modelo para evitar controles do TCU ou qualquer outra forma de controle. O objetivo de todo o trabalho da TI, foi exatamente para estabelecer máximo controle e transparência na gestão e destinação destes controles. O relatório publicado pela TI ‘Governança de recursos compensatórios em casos de corrupção: guia de boas práticas para promover a reparação de danos à sociedade’ propõe um amplo aparato de controles exatamente para blindar o acesso indevido ou privilegiado de qualquer ente público ou privado a tais fundos, inclusive a própria Transparência Internacional.” (Leia abaixo a íntegra da nota da Transparência Internacional)

Depois de 5 anos de discussão, o TCU decidiu, em setembro do ano passado, que o Ministério Público deve destinar ao FDD todos os valores recebidos por meio de acordos de leniência, Termos de Ajustamento de Conduta, multas e indenizações, concluindo que a administração desses recursos pelo MP é irregular.

O QUE DIZ A TRANSPARÊNCIA INTERNACIONAL

O processo cujo sigilo foi derrubado ontem inclui, apenas, o conteúdo de quem acusa a Transparência Internacional (TI). Não há qualquer peça de defesa ou manifestação da TI nos autos, pois a organização nunca foi ouvida antes de ser feita essa divulgação. Além disso, há omissões graves, como o relatório final do trabalho realizado pela Transparência Internacional com recomendações de transparência, boas práticas de governança e rigorosos controles à destinação dos chamados “recursos compensatórios” em casos de corrupção. Mais importante, a decisão do ministro Toffoli faz referência a um ofício do ex-PGR Augusto Aras, com graves ilações e informações inverídicas sobre destinação de recursos à TI, mas omite a resposta ao ofício, com detalhado parecer da subprocuradora-geral Samantha Dobrowolski, então coordenadora da Comissão Permanente de Assessoramento para Acordos de Leniência e Colaboração Premiada, desmentindo as informações do ex-PGR e atestando que a TI jamais recebeu ou receberia qualquer recurso ou teria qualquer papel gestor ou decisório sobre a aplicação de tais fundos.

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Sobre quem seria o procurador que relatou, no grupo de Telegram, o resumo da reunião do dia 29 de novembro de 2018:

Esta é uma pergunta que deve ser feita aos procuradores, já que não havia membros da TI Brasil neste grupo.

Sobre por que consideraram na época que não seria conveniente encaminhar os recursos dos acordos para gestão do FDD:

A Transparência Internacional estuda e promove discussões sobre formas de destinação de “recursos compensatórios” em casos de corrupção em diversas partes do mundo e há mais de uma década. O conceito de “recursos compensatórios” vem da compreensão fundamental de que a corrupção não é um crime sem vítimas. A partir dessa noção, deve-se garantir que os fundos recuperados de esquemas de corrupção (multas, compromissos de investimento social, repatriação de ativos, entre outros) possam restituir direitos violados, buscando alcançar grupos diretamente afetados, além de compensar prejuízos aos entes públicos lesados. Mas, principalmente, a TI trabalha para que a destinação destes recursos ocorra com altos padrões de transparência, governança e integridade, para que não caia novamente nos ralos da corrupção e resultem em um processo de revitimização.

Esta é uma discussão há muitos anos presente em foros internacionais e hoje consta de recomendações de diversos organismos multilaterais dedicados ao enfrentamento da corrupção e proteção dos direitos humanos.

No Brasil, a TI estudou as formas mais comumente utilizadas e constatou que havia a necessidade de importantes aprimoramentos em todas elas, sejam os TACs, os Fundos de Direitos Difusos (da União e dos Estados) ou o investimento social realizado diretamente pelas empresas.

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No caso dos FDDs, a TI jamais afirmou que seriam um mal modelo. O Brasil tem marcos legais sofisticados sobre “direitos difusos”, nas áreas do meio ambiente, patrimônio histórico, direito do consumidor, ordem econômica, entre outros. E um modelo de Fundo que se direcione recursos diretamente a projeto de entes estatais e da sociedade civil, como faz o FDD, é um modelo alinhado com boas práticas internacionais. O que a TI apontou, em discussões com o Ministério da Justiça, com o CADE, com a PGR, com parlamentares e com outros especialistas, foram as graves falhas de transparência e governança atuais de um fundo que, em poucos anos, saltou de um orçamento de algumas dezenas de milhões para um bilhão de reais, sem que estas falhas tenham sido sanadas. O trabalho da TI, portanto, não foi apenas para recomendar boas práticas de transparência e governança para recursos de acordos de leniência, mas para o aprimoramento geral da destinação de “recursos compensatórios” através dos diferentes mecanismos possíveis, inclusive o FDD.

Sobre por que consideraram um modelo de gestão que evitasse passar pelo TCU, como descrito na mensagem:

A TI jamais propôs qualquer modelo para evitar controles do TCU ou qualquer outra forma de controle. O objetivo de todo o trabalho da TI, foi exatamente para estabelecer máximo controle e transparência na gestão e destinação destes controles. O relatório publicado pela TI “Governança de recursos compensatórios em casos de corrupção: guia de boas práticas para promover a reparação de danos à sociedade” propõe um amplo aparato de controles exatamente para blindar o acesso indevido ou privilegiado de qualquer ente público ou privado a tais fundos, inclusive a própria Transparência Internacional.

Sobre como a TI pretende manter o acompanhamento do tema, agora que o TCU decidiu que a gestão dos recursos provenientes de acordos, multas, indenizações e TACs cabe ao FDD:

A TI Brasil continuará promovendo o debate sobre a compensação de direitos violados pela corrupção e defendendo que haja marcos legais, institucionais e melhores práticas para que estes fundos possam efetivamente chegar às vítimas, além de ressarcir prejuízos dos entes públicos. Como dito acima FDD não é um modelo ruim, desde que seus padrões de transparência e governança sejam significativamente aprimorados. Mas não se deve considerar um modelo apenas, o investimento social diretamente realizado por empresas – voluntário ou imposto por acordos com autoridades – também é um bom modelo, porque contribui na mudança de cultura da empresa, solidificando a noção dos impactos reais da corrupção. Lamentamos que um debate tão fundamental ao país tenha sido obstruído e solapado por desinformação.

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