O governo americano anunciou que gastará 250 milhões de dólares numa campanha nacional de informação sobre a importância da vacinação contra a Covid-19, cujas doses começaram a ser distribuídas por todos os estados no domingo, 13, numa das maiores operações logísticas da história.
Depois de meses de negação e displicência diante dos danos causados pela maior tragédia de saúde pública da história contemporânea, Donald Trump se deu conta, com a derrota na campanha à reeleição, que precisa auferir os créditos por qualquer eventual sucesso no combate à pandemia.
Numa inversão total de rumo, chegou a reivindicar que a equipe mais próxima de servidores na Casa Branca tivesse prioridade na imunização, até mesmo sobre profissionais de saúde, com a provável ideia de ter seu batalhão de assessores viajando pelos postos de vacinação de todo o país.
O presidente tenta realizar uma campanha antecipadíssima para as eleições de 2024, atribuindo a seu staff a missão de deixar bem claro que o governo do agente laranja é que finalmente estaria dando um jeito para acabar com a transmissão do Sars-CoV-2, depois de 300 000 mortes e 16 milhões de diagnósticos nos Estados Unidos.
Trata-se de uma tarefa ingrata, diante de pesquisas que demonstram que apenas seis em cada dez cidadãos americanos aceitam espontaneamente a imunização – uma atitude que já teve, noutras circunstâncias, a adesão de 90% dos entrevistados, em levantamentos realizados no começo do ano.
Especialistas em saúde pública atribuem ao próprio governo Trump a responsabilidade pelo aumento da desconfiança diante das vacinas, em razão das declarações do presidente desprezando a letalidade do vírus, de sua presença sem máscara em comícios e de sugestões de tratamentos preventivos considerados absolutamente ineficazes pelos cientistas.
Mas Trump, cujo quadro clínico ao contrair a doença, no início de outubro, foi considerado de média para alta complexidade – e ainda assim continuou menosprezando a crise –, imagina agora a possibilidade de deixar a Casa Branca com uma medalha de herói sanitário no peito, a ser exibida ao longo do governo Biden, e chegou a afirmar que forças ocultas boicotaram o processo de certificação das vacinas.
Enquanto o ídolo político do presidente Jair Bolsonaro vive esse ocaso disfuncional nos EUA, seu governo, em luta pela ordem do mérito da indiferença e agarrado a predições cada vez menos confiáveis de Paulo Guedes sobre retomada econômica, ameaça confiscar vacinas importadas diretamente pelos estados e chancela um plano de imunização que, literalmente, não tem começo, meio nem fim, além de fazer contas de padeiro sobre a quantidade de gente a vacinar.
O capitão provisoriamente instalado no Planalto, por meio de seu general de divisão e anspeçada de saúde, garantiu a disponibilidade de 300 milhões de doses, suficientes para imunizar menos de três quartos da população – indicando imaginar que os outros estarão mortos de Covid antes do fim da campanha, recusarão as injeções ou viajarão para tomar o imunizante em outros países.
No fim de semana em que comemorou a conclusão da incompleta missão de entregar seu plano de imunização ao STF e alcançou as 180 000 mortes previstas no “pior cenário” desenhado pelo antecessor Luiz Mandetta, o general Eduardo Pazuello, curado da Covid há um mês, foi festejar na casa do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, cantando música sertaneja ao lado de Zezé di Camargo. Sem máscara.
Pazuello foi condecorado por serviços prestados ao Amazonas em outubro, pouco antes de Manaus voltar à lista que reúne as capitais mais severamente atingidas pelo coronavírus. O Distrito Federal, de Ibaneis, tem regiões com a mais alta taxa de mortalidade por Covid-19 em todo o país, quase recordistas planetárias da pandemia, entre elas, Ceilândia e Taquatinga, visitadas por Bolsonaro em março. Sem máscara.
Para comentar este texto, utilize por favor este link.