Sob risco de prisão, bolsonarista conta o que buscou na Argentina de Milei
Symon Albino deixou a família no interior de São Paulo para tentar asilo político no país vizinho
Denunciado por dezesseis crimes decorrentes de sua participação nos distúrbios do 8 de Janeiro, Symon Albino fugiu para a Argentina antes de ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ele vive no país vizinho há cerca de seis meses com um certificado de moradia temporária, que deve ser revisto a cada 90 dias. Daqui para a frente, a regularização do documento é incerta, já que três foragidos bolsonaristas, todos condenados, foram detidos na semana passada — um deles, Joelton Gusmão de Oliveira, sentenciado a dezessete anos de prisão, foi detido exatamente ao ir tentar fazer a renovação do visto.
A ideia de Symon e de cerca de duzentos brasileiros que entraram com processos na Comisión Nacional para los Refugiados (Conare) era manter os documentos provisórios até que sua situação fosse julgada — o que tem demorado anos, tanto no Brasil quanto na Argentina. Os casos são julgados individualmente em reuniões colegiadas da comissão. No dia 22 de outubro, o governo de Javier Milei assinou um decreto que endureceu as regras de imigração, e o país não reconhece mais como refugiado quem cometeu crimes graves. “Ficamos um tanto quanto preocupados aqui na Argentina. Nesse momento, nós não temos um pensamento de futuro”, diz Albino a VEJA. “A gente se apega ao bordão do Milei. Que ‘viva la libertad’ é essa se ficarmos presos?”, questiona.
No Brasil, Symon tem quatro filhos, com idades entre 4 e 12 anos, que moram com a mãe em Campinas. Na cidade do interior de São Paulo, ele acampou por 65 dias com manifestantes que não acreditavam no resultado das urnas que deram a vitória de Lula contra Jair Bolsonaro em 2022. Ele ficou mais cinco dias em frente ao Quartel-General do Exército em Brasília, epicentro da concentração de caráter golpista que desembocou no 8 de Janeiro.
Denunciado como incitador dos atos, uma das grandes provas contra Symon são vídeos que ele publicou em suas redes sociais — um de seus perfis tinha 600.000 seguidores e foi derrubado no Brasil por decisão judicial. “Para mim, nós fomos usados como uma massa de manobra porque eu nunca me envolvi em política, sempre fui trabalhador para sustentar meus filhos. Infelizmente, caí naquela euforia daquele momento”, conta Symon, que diz que mantém suas posições, mas se arrepende do que fez em Brasília.
Depois do 8 de Janeiro, ele ficou por um ano e cinco meses escondido no Brasil, mas ainda conseguia trabalhar em restaurantes na informalidade. No entanto, terminou o casamento de 13 anos. Primeiro, oficialmente, para desvincular a ex-mulher das contas bloqueadas e permiti-la pagar as despesas do lar. Depois, percebeu que não iria conseguir viver com a sua família.
Enquanto estava foragido no Brasil, contava com a vitória de Milei, um político de direita como Bolsonaro, para sair da clandestinidade. O empurrão que faltava para mudar de país chegou no celular, em um vídeo de Patricia Bullrich, que concorreu às eleições presidenciais argentinas, ficou em terceiro lugar e foi nomeada ministra da Segurança de Milei. “Ela fala que nós seríamos bem-vindos, e isso nos moveu a vir para a Argentina.”
Ele foi de carro pela cidade de Barracão, no Paraná, fronteira com Bernardo Irigoyen, na Argentina. Os primeiros dias passou em La Plata, onde vive boa parte dos foragidos do 8 de Janeiro, e depois foi para a província de Misiones, onde trabalha como cozinheiro.
Symon promoveu pequenos atos no país vizinho, como uma manifestação de 7 de Setembro, em frente ao Obelisco, monumento no cruzamento das avenidas Corrientes e 9 de Julio, em Buenos Aires. Dois dias antes, ele havia participado do Fórum de Madri, na capital argentina, onde viu Milei de perto pela primeira vez e pôde conversar com apoiadores da causa dos autodenominados exilados, como o ex-chanceler de Bolsonaro, Ernesto Araújo.
Mesmo que ainda não tenha sido julgado, o governo brasileiro sinalizou, em nota a VEJA, que a situação de Symon não é muito diferente daqueles que já foram condenados e tiveram os pedidos de prisão emitidos pelo juiz federal argentino Daniel Rafecas. Eles ressaltam que a extradição é um ato de cooperação internacional com “o país onde essa pessoa procurada esteja naquele momento”.
“O procedimento para pedidos de extradição feitos pelo Brasil é bastante semelhante no que respeita a brasileiros, condenados ou não, que estejam em outro país, como a Argentina. Isso inclui pessoas que estejam sendo investigadas por quaisquer crimes, inclusive com relação aos fatos ocorridos em 8 de janeiro de 2023”, diz o Ministério da Justiça e da Segurança Pública.