Mais do que dancinhas: por que TikTok pode ser um risco à democracia
Potencial de viralização dos conteúdos da rede social abre margem para massificação de fake news e ataques ao sistema eleitoral
Quarta rede social mais utilizada no Brasil (terceira em número de horas consumidas), o TikTok é a grande novidade em termos de plataformas digitais nas eleições de 2022. Não à toa, presidenciáveis como Jair Bolsonaro (PL), Ciro Gomes (PDT) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vêm intensificando seu marketing político por lá — o último abriu sua conta oficial em 20 de junho último, e já acumula quase 120 mil seguidores.
Mas, em tempos de disseminação de fake news e ordens de bloqueio de aplicativos vindas do Supremo Tribunal Federal (STF), a viralização de conteúdos postados na plataforma chamama atenção pelo risco que ela oferece ao impulsionar ataques à democracia e ao sistema eleitoral. Ao menos é o que dizem a especialista em comunicação e marketing da Universidade Federal Fluminense Luiza Mello e o cientista político da Universidade Federal do Paraná Djiovanni Marioto, coordenadores de uma pesquisa sobre a rede social.
“O TikTok se tornou mais um meio de divulgação política. Começamos a detectar esse movimento em 2020, ainda em fase experimental, mas agora vemos uma profissionalização com o intuito de conquistar um público significativo nessa rede social”, afirma Mello.
O crescimento do seu uso eleitoral, aliado ao aumento de popularidade e a característica de plataforma viral que o TikTok tem, é o que preocupa os especialistas. “Diferente das outras redes sociais, que focam nas relações pessoais, o TikTok é focado em consumir e produzir conteúdo. Isso pode potencializar o cenário de desinformação”, afirma a comunicadora. “A falta de controle da plataforma sobre determinados pontos ajuda a massificar as fake news”, acrescenta Marioto.
No levantamento produzido pelos pesquisadores entre os dias 20 e 26 de junho, as hashtags fomentadas por apoiadores bolsonaristas que explicitam risco à integridade democrática, como #votoimpressojá e #tsevergonhanacional, tiveram 147,2 mil visualizações e 12 mil curtidas, um aumento de 80% e 136%, respectivamente, em relação à semana anterior.
Outros termos que ameaçam o STF, como #forastf e #stfvergonhanacional, tiveram mais de 23 mil curtidas nesta semana, num total de 39 posts vindos de contas de extrema-direita. A tag #barrosomentiroso, que ataca diretamente o ministro do STF Luís Roberto Barroso recebeu mais de 41,2 mil curtidas e 619 mil plays.
Isso num período de dias em que, pela primeira vez desde o início do monitoramento dos pesquisadores, posts ligados a Lula tiveram mais engajamento que os ligados a Bolsonaro. “Apesar do crescimento recente da esquerda, a extrema direita conserva uma ampla relevância na plataforma ao impulsionar termos que atacam a democracia e o sistema eleitoral. A diferença desse alcance para conteúdos que defendem o estado democrático é na casa dos milhões de views”, explica Marioto.
Recentemente, o TikTok acatou a decisão do ministro do STF Alexandre de Moraes ao bloquear a conta do PCO dentro do inquérito das fake news, depois que o partido defendeu a dissolução do Supremo e chamou Moraes de “skinhead de toga”. No entanto, a rede social contestou o pedido de Moraes.
“A determinação de bloqueio integral da conta com todo o conteúdo produzido por partido político regularmente constituído, fere gravemente as garantias constitucionais de liberdade de expressão e de acesso à informação, da vedação à censura prévia (arts. 5º, IV, IX, XIV e ainda 220, caput e § 2º da CF) e de interferência mínima no debate democrático (art. 38 da Res. 23.610/2019, do C. TSE)”, disse a petição assinada por advogados da empresa chinesa.
De acordo com os pesquisadores, a atitude do TikTok mostra uma pré-indisposição para remover conteúdos, mesmo que comprovadamente falsos, e uma predileção pela viralização do vídeo fraudulento a ser tachada de redutora da liberdade de expressão, ainda que criminosa — algo que, como eles ressaltam, é comum a várias redes sociais. A possível defesa é que, como uma plataforma recente e ainda em crescimento, é esperado que não tenha desenvolvido uma forma de regular seus conteúdos. “Se existe alguma movimentação [contra informações falsas] por parte do TikTok, ela ainda é muito precária. É pouco perante o volume e importância que temos identificado”, finaliza Mello.