Marcado para ser retomado no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) na próxima quarta-feira, 24, após oito anos, o julgamento da descriminalização do porte de drogas para uso pessoal pode acabar tendo como obstáculos os dois ministros indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro à Corte: André Mendonça e Nunes Marques.
Conhecidos pela atuação alinhada ao bolsonarismo, onde qualquer flexibilização quanto à política de drogas é prontamente repelida, os dois ministros serão os próximos a votar no julgamento, depois do ministro Alexandre de Moraes. A sequência de votação prevista no regimento do Supremo determina que primeiro votam os ministros mais novos na Corte, até o mais antigo, e, por fim, o presidente do STF. Mendonça foi indicado em 2021 e Marques, em 2020.
Diante dessa sequência, não se despreza a possibilidade de Mendonça ou Marques pedirem nova vista. Neste caso, os demais ministros poderiam antecipar seus votos, mas o julgamento não seria concluído naquele momento.
Moraes será o primeiro a votar porque foi ele quem “liberou” a análise do caso após um pedido de vista, ou seja, mais tempo para analisar o assunto, feito pelo ex-ministro Teori Zavascki, seu antecessor no STF, em 2015. Teori morreu em um acidente aéreo em Paraty (RJ) em 2017 e foi substituído na cadeira por Moraes, que liberou o tema para o plenário em novembro de 2018.
Votaram até agora os ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso, todos no sentido de descriminalizar o porte de drogas para consumo próprio. Gilmar, relator da ação, acredita que o entendimento deve valer para todas as drogas. Fachin e Barroso votaram no sentido de que a descriminalização valha apenas para a maconha.
O caso concreto
Quase cinco anos depois da liberação do caso para julgamento no STF, a ministra Rosa Weber, presidente da Corte, marcou a análise do Recurso Extraordinário 635.659, que tramita na Corte desde 2011, apresentado pela Defensoria-Geral do Estado de São Paulo, que contesta o artigo 28 da Lei Antidrogas (lei nº 11.343/2006),
O artigo em questão proíbe a compra, armazenamento e transporte de qualquer droga para consumo pessoal. A lei hoje pune essas situações com prestação de serviços à comunidade, comparecimento a cursos educativos e advertências sobre os efeitos do uso de drogas. Segundo a Defensoria, esse dispositivo é inconstitucional, pois fere a privacidade do cidadão, inclusive o direito de pôr em risco a própria saúde de forma consciente.
O processo envolve a condenação em 2009 do mecânico Francisco Benedito de Souza, que foi flagrado com 3 gramas de maconha durante uma inspeção de rotina no Centro de Detenção Provisória de Diadema (SP), onde cumpria pena por porte ilegal de armas. Ele foi condenado a mais dois meses de prestação de serviços comunitários.
A partir daí, a Defensoria Pública de São Paulo iniciou o questionamento da condenação e do artigo da Lei Antidrogas. O caso foi escalando, passou pela segunda instância, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e chegou ao STF em fevereiro de 2011. Em dezembro daquele mesmo ano, ele ganhou o caráter de Repercussão Geral – ou seja, o que for decidido vai criar um balizamento legal para situações semelhantes.