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Maquiavel

Por José Benedito da Silva Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
A política e seus bastidores. Com Laísa Dall'Agnol, Victoria Bechara, Bruno Caniato, Valmar Hupsel Filho, Isabella Alonso Panho e Ramiro Brites. Este conteúdo é exclusivo para assinantes.
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Gustavo Guedes: o advogado de Temer, que atuou para Dilma e salvou Moro

Defensor que livrou senador da cassação no TSE diz que sempre sonhou em fazer uma campanha ao Planalto: 'Presidente da República é destino'

Por Laísa Dall'Agnol Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 15h40 - Publicado em 4 jun 2024, 09h08
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  • “Muito adjetivo e pouca matemática”, sintetizou o advogado Gustavo Bonini Guedes ao iniciar a breve defesa no julgamento que viria a absolver o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no final de maio. Em seguida, discorreu de forma sistemática sobre a discrepância de valores financeiros citados nas acusações que pairavam sobre o seu cliente, a principal linha de estratégia escolhida para afastá-lo da perda do assento no Senado, que muitos chegaram a dar como quase inevitável. Deu certo: por unanimidade, os ministros reforçaram a decisão anterior, da Corte Eleitoral do Paraná, e rejeitaram os recursos do PT e do PL que pediam a cassação de Moro por abuso de poder econômico na campanha eleitoral de 2022.

    Conhecido por ter atuado junto aos ex-presidentes Dilma Rousseff e Michel Temer, Guedes conheceu Sergio Moro no início de 2022, quando o ex-juiz da Lava-Jato se preparava para uma campanha presidencial ainda pelo Podemos. O contato foi intermediado por nomes dos círculos da advocacia de Curitiba — de onde Guedes também é. Em um evento no qual estava o advogado Luiz Felipe Cunha, aliado de Moro que viria a tornar-se seu suplente, um amigo de Guedes perguntou se o ex-juiz já tinha um advogado eleitoral. Cunha respondeu que estavam à procura e foi apresentado a Guedes. Deu match jurídico.

    Trajetória com o PT

    A trajetória do advogado na defesa de políticos começou em 2004, quando atuou na campanha de Rubens Bueno (então PPS) à Prefeitura de Curitiba. De lá para cá, já são praticamente “duas décadas e dez eleições”, orgulha-se em dizer. Em 2014, defendeu a então candidata ao governo do Paraná, Gleisi Hoffmann, e, no segundo turno, foi convidado a compor a equipe jurídica da campanha presidencial de Dilma. Depois da reeleição da petista, Guedes seguiu na mesma trilha, passando a integrar a força-tarefa do PT que destrinchou as contas de Aécio Neves (PSDB) quando o ex-tucano questionava a derrota na disputa presidencial.

    No segundo semestre de 2015, quando o processo de abertura de impeachment de Dilma andava a passos largos, Guedes vislumbrou outra brecha de oportunidade para colocar sua atuação sob a luz dos holofotes. Acompanhando as sessões da Justiça Eleitoral, deu-se conta de que Michel Temer, companheiro de chapa da petista, não tinha um advogado próprio. Quem havia feito a defesa do então vice-presidente era o advogado Hércules Fajoses, que saíra naquele mesmo ano para tomar posse como desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1).

    Sabatinas com Temer

    O jovem advogado não perdeu tempo. Segundo ele, foram entre quatro e cinco semanas seguidas de viagens para Brasília para conversas com Temer que eram verdadeiras sabatinas. “Nisso, já era o caos, porque todo mundo queria pegar o caso, advogados conhecidos. E eu ali, coitadinho, sem nada”, brinca. O momento da verdade veio com uma pergunta. “Por que tenho que contratar você?”, indagou o então vice-presidente. Até então crente de que não seria o principal advogado da equipe –que, acreditava, seria comandada por um ex-ministro do TSE ou afim –, Guedes foi categórico. “Essa é a causa da minha vida, a minha dedicação será única. Vou botar a barriga no balcão”, relembra o advogado.

    Na semana seguinte, Temer pediu uma proposta. “Não podia ser nem muito baixa e nem muito alta, então mandei uma proposta média. E ele pediu desconto. Obviamente, dei o desconto”, diverte-se Guedes, acrescentando que, pela dimensão do caso, à época poderia até pagar para trabalhar.

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    Com o contrato fechado e sem nenhum figurão na equipe, “apenas ele”, os meses seguintes foram dedicados ao preparo da defesa de Temer junto ao TSE. A empreitada deu certo. Guedes ganhou espaço e, quando Temer já era presidente, chegou a defendê-lo em uma das frentes do escândalo deflagrado com as gravações de conversa com o emedebista feitas pelo empresário e delator da Lava-Jato, Joesley Batista, em 2017.

    A atuação junto a Temer foi um divisor de águas. “Até então, eu já tinha toda a condição jurídica, mas não necessariamente política nessa questão de bastidor, de entrada”, diz. “Hoje é claro para mim que, se você não tiver o trinômio: capacidade jurídica, relacionamento e imprensa, você não consegue”, afirma, lembrando que uma das primeiras medidas que tomou após o início da “ascensão” na carreira, aconselhada pelo amigo Murilo Hidalgo, diretor do instituto Paraná Pesquisas, foi a de contratar uma equipe de assessoria de imprensa.

    Sonho presidencial

    Com o networking apurado, o advogado trabalhou próximo ao marqueteiro Daniel Braga quando ele cuidava das redes sociais de Temer durante a gestão de crise do caso JBS. Braga deixou o Planalto em 2017, mas ambos continuaram amigos. Voltaram a trabalhar juntos na campanha da ex-deputada federal Joice Hasselmann (então PSL) à Prefeitura de São Paulo, em 2020: o publicitário coordenava o marketing da campanha enquanto Guedes ficou a cargo dos processos eleitorais da corrida ao Edifício Matarazzo. Com Hasselmann fustigada por até então aliados e sem um eleitorado para chamar de seu — ela rompera pouco tempo antes com o bolsonarismo –, trabalho não faltou. “A gente fez um super trabalho e ganhamos tudo da Joice aqui, seguramos tudo no Tribunal. Foi uma interação entre jurídico e comunicação muito grande. O Dani ficou em êxtase”, lembra Guedes.

    Com o resultado, o marqueteiro, passado um tempo, teve a ideia de apresentar o colega ao então governador paulista João Doria — de quem já era consultor pessoal –, e que em fins de 2021 e início de 2022 ensaiava uma candidatura à Presidência. O convite brilhou aos olhos do advogado que sonhava em fazer uma campanha ao Planalto. Pouco tempo depois, no entanto, a pré-campanha de Doria afundou após desentendimentos dentro e fora do PSDB.

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    A exemplo do ex-governador paulista, as pretensões presidenciais de Moro não sobreviveram por muito tempo. A eleição para o Senado pelo Paraná não afastou o ex-juiz da mira dos inimigos. Depois de mais de dois anos trabalhando na defesa do ex-juiz, Guedes avalia que a “construção de pontes”, como gosta de classificar, foi crucial para o resultado positivo. Até as vésperas do julgamento no TRE-PR, vale lembrar, era quase unanimidade nos bastidores da política paranaense que a Corte iria “entregar a cabeça” de Moro.

    “A maior dificuldade desse tipo de causa é ter sangue frio, tranquilidade para aguentar o que se fala, a tentativa de prejulgar esses casos. Você não ganha nem perde o processo antes da hora”, pondera. “Como tenho muito contato na imprensa, eu também media essa febre, tentava saber o que de fato estava sendo falado. E, obviamente, com a relação grande que hoje tenho no meio político, de clientes, amigos, advogados”, diz.

    Moro maduro

    Com um relação mútua de “amizade”, Guedes diz ver hoje um Moro “muito mais maduro” do que aquele que assumiu o mandato de senador no início de 2023. O defensor evita fazer comparações com o ex-deputado e ex-procurador da Lava-Jato, Deltan Dallagnol, o qual, afirma, passou por um processo diferente, mas cujo resultado foi o da cassação. “Não vou dizer se é bom ou ruim, não cabe a mim julgar. O Deltan foi cassado por unanimidade, em um minuto. E eu disse para o Sergio: ‘Nós temos que fazer diferente. Já vimos aqui o que aconteceu”, diz Guedes, que classificou o comportamento de Moro como “muito correto e inteligente”. A conduta incluiu a construção de uma boa relação com os pares senadores, a manutenção de pontes com colegas do Judiciário do Paraná, a postura “serena” com a imprensa, e até o aceno a figuras que até então pareceria impossível.

    Em abril, Moro teve um encontro com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, numa tentativa de armistício por parte do senador. Ambos estiveram às turras desde a época da Lava-Jato: o magistrado foi um dos responsáveis por declarar Moro como parcial nos casos da operação. Recentemente, Moro foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República por suposta prática de calúnia contra Mendes. O caso deve ser julgado pela 1ª Turma do STF nesta semana.

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    “A ida ao ministro Gilmar, eu fiquei sabendo pela imprensa. Eu não soube antes, ele não me consultou dessa ida antes. Mas quando eu soube, eu dei parabéns para ele. Eu falei: ‘Sergio, quando eu te pedia para construir pontes, era isso. E mostra uma maturidade muito grande sua de procurar alguém que é um desafeto público teu'”, avalia Guedes.

    Quase que imediatamente, o nome de Moro voltou a ser lembrado em alguns círculos como um possível presidenciável para 2026. O senador nega a pretensão e seus planos estão voltados para a disputa do governo do Paraná, algo que ele ainda não admite publicamente. “Para mim, presidente da República é destino. Falei isso para o Sergio: ‘Crie condições para que isso aconteça. Você não vai conseguir ser candidato a presidente de si mesmo'”, afirma Guedes, que sempre sonhou em advogar para um presidente.  “Se vai ser o destino ou não do Moro, a gente tem que esperar para acontecer. Tem que deixar o Sergio entender agora os próximos passos dele.”

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