O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta terça-feira, 31, o cancelamento do depoimento do ministro da Economia, Paulo Guedes, à Polícia Federal no âmbito de um inquérito que investiga o senador Renan Calheiros (MDB-AL), em tramitação na Corte. A oitiva estava marcada para esta quarta-feira, 1º de junho. A decisão de Barroso foi tomada em consonância com a posição da Procuradoria-Geral da República (PGR), pelo cancelamento do depoimento à PF.
Em seu despacho, Barroso afirma que “não está excluída a possibilidade de oitiva de Guedes”. “Devem ser observadas, contudo, as cautelas necessárias à preservação da condição funcional do depoente”, afirma o ministro do STF. Ele lembra que o Código de Processo Penal prevê, em casos de ministros de Estado, que local, dia e horário para o depoimento devem ser ajustados previamente, além da possibilidade de oitiva por videoconferência.
“Em conclusão, defiro o pedido do requerente e determino o cancelamento do depoimento agendado para o dia 01.06.2022, sem prejuízo de que, havendo justo motivo e observadas as regras do artigo 221 do Código de Processo Penal, seja renovado o convite”, decidiu Barroso.
Como mostrou VEJA há duas semanas, Paulo Guedes ficou surpreso quando recebeu um ofício da PF em meados de abril pedindo que ele prestasse depoimento no âmbito de um inquérito que investiga o emedebista. A apuração mira supostas fraudes no fundo de pensão dos Correios, o Postalis, entre 2010 e 2016. Sem informações da PF sobre o motivo de ouvi-lo, Guedes pediu a Barroso que fosse dispensado de falar aos investigadores na data combinada, 1º de junho. O depoimento do ministro seria colhido estando ele na condição de “declarante”, e não de investigado.
O ofício da PF a Guedes foi recebido pelo ministro em 19 de abril e o depoimento, marcado inicialmente para o dia 5 de maio. A oitiva acabou sendo adiada para 1º de junho diante de um diagnóstico de Covid-19 do ministro. Guedes chegou a ser investigado na Operação Greenfield por suspeitas de fraudes em aportes de fundos de pensão estatais em fundos de investimento criados por uma empresa ligada a ele, mas as apurações foram encerradas em 2020 por ordem do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1).
Diante da intimação, os defensores de Paulo Guedes analisaram o inquérito contra Renan. A conclusão dos advogados Ticiano Figueiredo, Pedro Ivo Velloso, Francisco Agosti e Marcelo Neves, apresentada a Barroso, é a de que Guedes “não tem qualquer relação com o objeto da investigação”. Evidência disso, sustentam os advogados, seria o fato de que Guedes não é citado em “nenhuma página dos autos”. Os defensores ainda foram à sede da PF em busca de informações sobre os motivos do depoimento, sem sucesso.
Em nova petição apresentada nesta segunda-feira, 30, os advogados voltaram a dizer que o ministro não tem relação com os fatos investigados e afirmam que sua intimação foi uma “ação excessiva” da PF.
“Trata-se, portanto, ao que tudo indica, de uma ação excessiva da autoridade policial, que convoca – sem qualquer motivação – para prestar depoimento o ministro da Economia, extrapolando o rol de oitivas requerido pelo MPF e à revelia de qualquer supervisão jurisdicional”, dizem os defensores. A petição reforça ainda que, para ser marcado o depoimento de um ministro de Estado, deve haver ajuste de data, hora e local com o juiz da ação, no caso, o STF.
No documento, a defesa afirma que também buscou informações junto à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre apurações em seu âmbito que pudessem estar relacionadas ao inquérito e que eventualmente pudessem motivar a convocação de Paulo Guedes. Segundo os advogados, a CVM localizou uma investigação relacionada ao inquérito do STF, mas sem relação com o ministro da Economia.
“Em suma, analisando-se os autos públicos do INQ 4492, nada justifica sua intimação para prestar depoimento. Na CVM, no procedimento enviado pela autarquia, também nada que justifique essa iniciativa da autoridade policial”, diz a petição.
Na decisão desta terça-feira, Luís Roberto Barroso diz que, embora o princípio de não produzir provas contra si não se aplique a testemunhas, mas só a investigados, a defesa de Guedes “deve ter acesso prévio aos elementos já documentados na investigação que justificam a realização do ato”. Documentos sigilosos, consignou o ministro, podem ser mantidos em segredo pela PF.