Atacado, autor de ‘PEC das Praias’ diz que debate ‘perdeu a racionalidade’
Ex-deputado Arnaldo Jordy, que apresentou projeto em 2011, diz que ele não privatiza nada e que discussão foi capturada por 'bolhas' da polarização política
As redes sociais foram tomadas, nos últimos dias, pela discussão da possibilidade de privatização das praias brasileiras. A raiz do debate — que envolveu, na internet, o jogador de futebol Neymar e a atriz Luana Piovani — é a tramitação da PEC nº 03/2022, que foi proposta em 2011 pelo ex-deputado federal Arnaldo Jordy, hoje presidente do Cidadania do Pará.
Em entrevista a VEJA, o ex-deputado diz que a sua proposta “não tem nada a ver” com a ideia de privatização de praias no litoral brasileiro e afirma que, depois que a relatoria do projeto foi distribuída para o senador Flavio Bolsonaro (PL-RJ) na CCJ da Casa, “o debate foi capturado por duas bolhas e perdeu-se a racionalidade”. O filho do ex-presidente admitiu, nesta terça, 4, em entrevista a VEJA que a proposta pode ser alterada.
Mesmo fora do circuito da Câmara, Jordy disse que sofreu ataques nas redes por causa da proposta. “Fui acusado de querer destruir as Forças Armadas”, diz o ex-parlamentar. O motivo disso seria, segundo ele, a interpretação equivocada do trecho da Constituição que a PEC busca alterar. O inciso VII do artigo 20 fala em “terrenos de marinha” — que não são, como os haters do ex-deputado acreditam, a mesma coisa que terrenos de propriedade da Marinha.
Leia a entrevista a seguir:
Por que o senhor propôs a PEC? Essa legislação de terrenos de marinha – que não tem nada a ver com a Marinha– é uma denominação dada em 1831, há 193 anos. Essa lei dizia que todas as águas marítimas ou fluviais e seus acrescidos (termo que abrange qualquer rio, córrego, derivado de um canal) seriam de domínio da União. Isso passou a ser gerido pela Secretaria do Patrimônio da União (SPU), que administra todo o território brasileiro. É uma patologia jurídica que provocou uma especulação desenfreada em todas as orlas. Em 2004, dois terços da população de Belém (onde Jordy foi vereador e exerceu o mandato de deputado estadual) estava pagando ou laudêmio ou a taxa de marinha, o que é bitributação, porque já pagam o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano). O que o contribuinte recebe por pagar a taxa de marinha? Qual é a contraprestação? Nada.
O texto da proposta permite ou não privatizar praias? A PEC não tem esse desiderato. A proposta foi apresentada em 2011 e aprovada na Câmara em 2022, 11 anos depois, com uma certa folga. No Senado, caiu na relatoria de Flávio Bolsonaro. Aí o debate foi capturado por duas bolhas, e perdeu-se a racionalidade. Não há nada, rigorosamente nada, com relação a praias ou privatização de praias. Isso é uma distorção brutal, já entrou uma polêmica com Neymar e Luana Piovani, virou uma discussão generalizada. Vamos ao debate.
O que o senhor acha da discussão que tem se desenrolado sobre a sua PEC? A expressão “praia” não existe no projeto. O debate de mérito foi capturado por essa irracionalidade do “Fla x Flu”. Teve uma audiência pública semana passada e os senadores, praticamente na sua unanimidade, disseram que isso não tem nada a ver com privatização de praias.
O senhor tem recebido ataques nas redes por causa da PEC? Um sujeito me mandou uma mensagem falando “vocês são de esquerda, vocês são políticos de esquerda e vocês estão contra a Marinha e as Forças Armadas, que estão protegendo nossas praias e o senhor está acabando com tudo”. Para você ver o nível do debate como está. É um absurdo privatizar praias. Sou um ambientalista a vida inteira, fui presidente da Comissão de Meio Ambiente. O grande desafio é esclarecer e sair para o debate de mérito. Não tenho dúvidas de que o projeto vai ser aprovado. Ainda bem.