Assassino de delegado foi à prisão domiciliar por ‘boa conduta carcerária’
Decisão que deu progressão de pena ao autor do latrocínio contra o policial Mauro Guimarães Soares tem crítica a ‘falhas estruturais’ do sistema prisional
Assassino do delegado Mauro Guimarães Soares, do Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC) de São Paulo, Enzo Wagner Lima Campos, de 24 anos, foi preso por organização criminosa e cumpria prisão albergue domiciliar. O regime estabelece que o preso durma todos os dias em casa, onde deve chegar até as 22h. O apenado, no entanto, pode sair para trabalhar às 6h e não pode deixar a cidade sem comunicar à Justiça. O criminoso já havia sido preso ao menos quatro vezes e tem acusações de roubo a mão armada, receptação e violência doméstica.
A decisão que permitiu a saída do regime fechado foi expedida em 20 de maio e efetivada alguns dias depois. O juiz Josias Martins de Almeida Junior, da comarca de Bauru, entendeu que o preso apresentou “mérito suficiente para a progressão de regime, que lhe dará estímulo para a sua recuperação social”. O jovem havia cumprido o período mínimo de regime fechado – um sexto do tempo da pena – e apresentado “boa conduta carcerária atual” e “inexistência de falta disciplinar”. O Ministério Público também havia dado parecer favorável ao relaxamento da pena de Enzo.
Na manhã de sábado, 21, o presidiário assaltou o delegado de 59 anos, que caminhava com sua esposa pela Rua Caio Graco, no bairro da Lapa, Zona Oeste de São Paulo. O roubo, que em princípio visava uma corrente de ouro de Soares, acabou em troca de tiros. Ambos saíram feridos do confronto e foram encaminhados ao Hospital das Clínicas. De acordo com informações publicadas na imprensa, o assaltante teria sido baleado sete vezes e está internado, mas o policial, que foi alvo de dois disparos, não resistiu ao ferimento.
Críticas a lei da saidinha
Na decisão que concedeu regime prisão albergue domiciliar, o juiz faz críticas a um ponto específico da lei que proíbe a saída temporária. O magistrado diz que a nova legislação determina que a progressão de pena só pode ocorrer mediante exame criminológico, no entanto, não há estrutura no sistema carcerário capaz de fazer os exames em todos os apenados com requisitos para o abrandamento da pena.
“Há evidente retrocesso no sistema de execução de penas, impondo aos apenados situação ainda mais grave de que a de outrora, seja porque a população prisional aumentou significativamente, seja porque as unidades prisionais apresentam evidente insuficiência de técnicos para conduzir os atendimentos em tempo razoável”, escreveu Josias Martins de Almeida Junior na decisão.
Ele afirma ainda que a experiência demonstra lentidão na realização dos laudos, que são emitidos com ausência de pareceres psiquiátricos pela falta de profissionais capacitados. “Os exames criminológicos determinados em caráter excepcional para determinadas hipóteses de progressão de pena demoram mais de meses para aportar nos autos e, em sua maioria, não contam com parecer de médico psiquiatra, por inexistência de tal profissional”.
A medida, portanto, não seria exequível e, na visão do magistrado, expõe um problema estrutural. “A ausência de coordenação entre medidas legislativas, administrativas e orçamentárias que venham a representar uma ‘falha estrutural’ com potencial de agravamento da situação massiva de violação de direitos, como se dá no caso”.