Entre os objetivos da visita do presidente Lula a Buenos Aires estaria a ideia de discutir a criação de uma moeda única na América do Sul, a ser utilizada em transações financeiras e comerciais. O projeto começaria com o Brasil e a Argentina.
Ao longo da história, houve iniciativas de criação de moedas únicas. O Império Romano tentou e abandonou o projeto. O mesmo ocorreu na China, nas dinastias Quin e Han. Em 1865, França, Bélgica, Suíça e Itália e Grécia criaram a União Monetária Latina, que foi extinta em 1914, no início da I Guerra.
O euro é o único caso de sucesso até aqui. A proposta foi influenciada pelos horrores da II Guerra. Os líderes europeus imaginaram que conflitos bélicos ao longo de séculos poderiam ser evitados se todas as nações europeias tivessem o objetivo comum da integração econômica, que contribuiria para a prosperidade. Estavam certos.
O passo inicial foi a criação da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (1951), composta por Alemanha Ocidental, França, Itália, Holanda, Bélgica e Luxemburgo. Mais tarde, esses mesmos países assinaram o Tratado de Roma (1957), que estabeleceu a Comunidade Econômica Europeia (CEE), a qual foi substituída pela Europeia (1993).
A integração econômica europeia envolveu muitos avanços e regras comuns, incluindo a adoção obrigatória do imposto sobre o valor agregado (IVA). O Tratado de Maastricht (1992) estabeleceu as regras fiscais para adoção do euro, prevendo metas para o déficit e para dívida públicos. O Banco Central Europeu foi fundado em junho de 1998. Antes, em 1979, havia sido criada a Unidade de Conta Europeia (ECU, na sigla em inglês), que em 1º janeiro de 1999 daria origem ao euro. Uma pré-condição para aderir ao euro foi a estabilidade macroeconômica.
Notas e moedas foram introduzidas em 2002, 51 anos após o início do processo. O euro surgiu, assim, de um longo trabalho de integração econômica, movido por uma ideia-força, qual seja a de evitar a repetição das guerras na Europa. Nenhuma dessas características está presente na América do Sul.
A ideia de criação da moeda única sul-americana, o sur, parece basear-se na percepção de que basta vontade política. Parte-se também do pressuposto equivocado de que o sur aceleraria a integração sul-americana. A experiência do euro provou que é o contrário, isto é, primeiro vem a integração, depois a moeda única.
Não existe aqui uma ideia-força como a que influenciou os líderes europeus em 1946. A integração latino-americana vem sendo tentada há cerca de 70 anos. Uma das razões do fracasso é a cultura da substituição de importações e do intervencionismo estatal na economia, que continua mais viva do que nunca.
A moeda única sul-americana não passa, pois, de um sonho, que talvez jamais se realize.