Um em cada 200 casos de poliomielite pode levar à paralisia irreversível dos braços e pernas, em crianças e adultos. Entre esses, 5% das vítimas morrem, porque os músculos respiratórios são afetados. Conhecida também como pólio, e antigamente chamada de “paralisia infantil”, essa doença é causada por um vírus e é altamente contagiosa.
Em 1988, num cenário com 350 mil casos anuais de pólio em 125 países, a Assembleia Mundial de Saúde aprovou uma resolução, lançando a Iniciativa Global de Erradicação da Pólio (GPEI, na sigla em inglês), liderada por governos nacionais, com seis importantes parceiros: a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Rotary International, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), a Fundação Bill & Melinda Gates e a Aliança Mundial para Vacinas e Imunização (GAVI).
A partir daí, a incidência global da doença diminuiu mais de 99,9%. Ainda assim, há dois países endêmicos para o vírus selvagem: Afeganistão e Paquistão.
Atualmente, dois tipos de imunizantes são usados contra a pólio: a vacina injetável (VIP), criada por Jonas Salk, e a vacina oral (VOP), desenvolvida por Albert Sabin e que inspirou a criação do nosso símbolo, o “Zé Gotinha”.
O Brasil está livre da doença desde 1989. Porém, enquanto houver uma pessoa infectada no mundo, a vacinação não pode parar. Não podemos deixar a doença reemergir.
Hoje, o Ministério da Saúde recomenda três doses da VIP, aos 2, 4 e 6 meses, e dois reforços com a VOP, aos 15 meses e 4 anos de idade.
Porém, a partir do próximo ano, os dois reforços com a vacina oral serão substituídos por um reforço aos 15 meses com a vacina injetável, conferindo proteção semelhante, em decisão referendada pela Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização (CTAI). Essa é uma recomendação da OMS a países sem o vírus selvagem e já implantada em vários locais, com base em evidências científicas.
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As famosas gotinhas sempre foram uma poderosa ferramenta para o controle dos surtos de pólio em todo o mundo, interrompendo a cadeia de transmissão. Elas têm fácil administração (pela boca), alta efetividade e custo baixo.
Mas são feitas com vírus vivos enfraquecidos e que podem sofrer mutações, depois de eliminados pelas fezes, com chance rara de paralisia naqueles não protegidos, que se infectam com água e alimentos contaminados. Isso acontece especialmente em áreas com baixa cobertura vacinal, falta de saneamento básico e elevada concentração populacional.
Já a VIP, com proteção acima de 90%, contém vírus inativados, que são incapazes de causar a doença depois.
Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), o risco de volta da pólio ao Brasil é muito alto, em decorrência da baixa cobertura vacinal e vigilância insuficiente. Reforçar a vacinação de rotina com a versão injetável é uma estratégia para eliminar de vez qualquer risco de paralisia pela circulação da forma modificada do vírus preexistente na vacina oral.
Falta muito pouco para que tenhamos um mundo livre da poliomielite. Enquanto isso, o país precisa fazer a sua lição de casa.
* Leonardo Weissmann é infectologista do Instituto Emílio Ribas, consultor técnico da Comissão Nacional pela Erradicação da Pólio do Rotary International, diretor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e professor da Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP) – Campus Guarujá