Assine VEJA por R$2,00/semana
Letra de Médico Orientações médicas e textos de saúde assinados por profissionais de primeira linha do Brasil
Continua após publicidade

Medos, fobias e… Jorge Amado

Em uma carta escrita do exílio para sua esposa Zélia Gattai, em março de 1949, Jorge Amado descreve uma turbulenta viagem de avião entre Paris e Praga. A narrativa é assustadora. “Estamos vivos por milagre”, dizia já no primeiro parágrafo. O voo saiu da capital francesa e três horas depois teve de descer em Frankfurt, […]

Por José Alexandre Crippa
Atualizado em 30 jul 2020, 21h37 - Publicado em 9 out 2016, 13h00
  • Seguir materia Seguindo materia
  • Publicidade

    Em uma carta escrita do exílio para sua esposa Zélia Gattai, em março de 1949, Jorge Amado descreve uma turbulenta viagem de avião entre Paris e Praga. A narrativa é assustadora. “Estamos vivos por milagre”, dizia já no primeiro parágrafo. O voo saiu da capital francesa e três horas depois teve de descer em Frankfurt, pois um dos quatro motores estava falhando e o rádio não funcionava. Na descida, o avião por pouco não se chocou com outro que decolava, “por milagre”, repetiu. Sugerir novamente a violação das leis naturais já dava a ideia do tamanho do medo para um materialista convicto. Após três horas de espera e com o avião consertado, decolaram novamente. Mas não parou por aí.

    Publicidade

    Meia hora de voo, um grito anuncia fogo no outro motor do mesmo lado do que fora consertado. O piloto parou este motor, mas logo depois o motor que parara antes pifou de vez. Tiveram de voltar com apenas dois motores, voando baixo e de lado, sobre as montanhas entre a Checoslováquia e a Alemanha. “Foi uma meia hora dura, mas conseguimos aterrissar em Frankfurt outra vez”, escreveu, aliviado. No dia seguinte, Jorge Amado pegou outro avião  que o deixou em Praga de onde pôde escrever aliviado e seguro da escrivaninha do Hotel Flora, há poucos anos livre da ocupação nazista.

    Quarenta e um anos depois, outro escritor, Gabriel García Márquez, também discorreu sobre o assunto, mas não de modo privado. Em um artigo confessional “Seamos machos: hablemos del miedo al avión”, de  1980, o escritor colombiano não só revela todo  temor em voar de avião (“o único medo que nós, latinos, confessamos sem vergonha e até com um certo orgulho machista…”) como também entrega todos os seus amigos temerosos. Estão lá, Picasso, Miguel Otero Silva, Carlos Fuentes, Ruy Guerra, Luis Buñuel, Oscar Niemeyer e, claro, Jorge Amado. García Márquez chamava o escritor baiano de “um timorato aéreo” dos grandes, por ter tido a “audácia poética” de voar em um Concorde de Paris até Nova York, para ali pegar um navio até o Rio de Janeiro.

    Publicidade
    Continua após a publicidade

    As fobias

    Com o desenvolvimento da terapia comportamental foi possível distinguir a fobia social (medo de situações sociais quando observada por outros, como comer, beber ou falar em público), da agorafobia (medo de lugares abertos) e das fobias específicas (como o medo de altura, animais ou sangue). Costuma-se classificar cada fobia adicionando o sufixo fobia a sua palavra em latim ou grego. Assim, o medo de viagens aéreas é chamado de aerodromofobia ou aviatofobia, dentro de um diagnóstico de fobia específica.

    Publicidade

    O medo, muito mais do que a ansiedade, está associado a uma situação ou objeto com perigo real ou imaginário que nos leva a evitá-lo. A fobia, porém, difere do medo por alguns aspectos: temor excessivo e imensurável; esquiva do objeto ou situação temida; grande ansiedade antecipatória quando próximo da situação/objeto temido; ausência de ansiedade quando longe do objeto ou da situação temida.

    Continua após a publicidade

    A carta de Jorge Amado para Zélia encontra-se exposta no belíssimo memorial onde o casal de escritores morou, a Casa do Rio Vermelho, em Salvador, na Bahia. Assim, em busca da cópia da carta e da informação se o romancista tinha medo ou fobia de avião, liguei para a Sra. Maria João Amado, neta do escritor. Não tive mais dúvidas quando ela me disse: “Meu avô preferiria ir de navio, mas conheceu 98 países e quase todos de avião…”. “O verdadeiro medroso de avião não é o que se nega a voar, mas o que aprende a voar com medo”.

    Publicidade

    Nota: agradeço à Sra. Maria João Amado pelo envio da carta exposta na Casa do Rio Vermelho bem como por importante informação contida neste texto.

    FIM

    Publicidade

    jose-alexandre-crippa

    Publicidade
    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Domine o fato. Confie na fonte.

    10 grandes marcas em uma única assinatura digital

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo
    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de R$ 2,00/semana*

    ou
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de R$ 39,90/mês

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.