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Câncer de próstata: o tempo é (e não é) o senhor da razão

Entender as mudanças na medicina ajuda médicos e pacientes a escolher o melhor caminho para o tratamento do câncer de próstata

Por Marcelo Bendhack
8 jul 2019, 14h40

Organizações, sociedades médicas e profissionais da medicina já estão acostumados com dados e estatísticas apresentadas constantemente em todo mundo no que se refere ao câncer de próstata. É ainda uma doença comum entre os homens, sendo o segundo tipo de câncer, atrás apenas do câncer de pele não-melanoma, mais prevalente no sexo masculino.  

Apesar de ser considerado como uma “doença da terceira idade”, atualmente, o câncer de próstata acomete pacientes mais jovens, melhor dizendo, que ainda não entraram na chamada melhor idade. Quando relacionados a fatores genéticos, hereditários ou de etnia, a prevenção já começa muito cedo, aos 50 anos de idade, ou até mesmo antes. Ou seja, a idade passa a ser um fator relativo, e não uma característica absoluta.

A prevenção, que inclui um novo estilo de vida, hábitos saudáveis, como a prática regular de atividade física é essencial e recomendada em primeira e última instância. Aliada a isso, há na literatura médica farta documentação sobre a relação entre exames periódicos, diagnóstico precoce e maior tempo de vida após o câncer de próstata. Como se vê, o tempo vale ouro, antes, durante e depois. 

Avanço da medicina

À relatividade do tempo, outro ponto importante é a relatividade das palavras. A medicina não comporta muito bem termos como “nunca”, “sempre”, “todos” ou “único”. O benefício da dúvida (e a própria relatividade do tempo) deve se encaixar na fala do médico e na escuta do paciente. E vice-versa, uma vez que o diálogo entre um e outro faz parte do agir no século XXI.

É claro que precisamos discutir diagnósticos, tratamentos e condutas já consolidadas, mas é imprescindível enxergar um pouco mais além, “fora do quadrado”: observar e estudar novas técnicas, medicamentos, procedimentos minimamente invasivos e outros promissores que estão por vir. 

A medicina avança de forma rápida, exponencial e digital. Não perceber a evolução da medicina (e dos médicos) pode representar retrocessos, lentidão aritmética e processos analógicos, o que tem pouco a ver com os avanços tecnológicos e inovações que estão a nosso dispor nos dias de hoje.

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Até bem pouco tempo, a urologia tinha por base fincar os pés em termos e procedimentos conhecidos, postos à mesa como verdades absolutas. Já não é mais assim. A biópsia é um caso clássico: hoje, menos frequente, a biópsia negativa não apresenta 100% de confiança no resultado. É pouco comum, mas pode existir falso negativo. Existem indícios de que a biópsia pode permitir a disseminação de células ou elementos celulares da próstata na corrente sanguínea. 

Entretanto, ainda não há evidência científica de que isso tenha importância prática, clínica. Da mesma forma, nem todo exame de toque retal alterado ou PSA (Antígeno Prostático Específico) elevado significa presença de câncer. A conduta pode ser observadora, e o urologista pode optar por formas de tratamentos individualizados, dependendo de cada caso.

Vigilância ativa

Recentemente, participei de um painel no congresso da Sociedade Americana de Urologia, realizado em Chicago, sobre vigilância ativa. A contrário do que pode pensar, a vigilância ativa não é tratamento, mas sim uma conduta observadora em face ao diagnóstico do câncer. Só o acompanhamento ativo do paciente pode ser uma opção válida em muitos casos, mas não pode ser regra porque, às vezes, estamos lidando com uma “bomba relógio”. Uma briga contra o relógio, sobretudo em casos de doenças mais agressivas. 

Sem determinismos, mas observando a evolução da ciência para a medicina, o que está por vir é muito promissor no que se refere à relatividade do tempo. A começar pelas novas tecnologias, que poderão tanto diagnosticar com mais precisão quanto aumentar a cura e, tão importante quanto, reduzir os efeitos colaterais nos pacientes submetidos aos mais diversos tratamentos para o câncer de próstata.  

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As novas ferramentas para o combate ao câncer de próstata abrangem aspectos que já conhecemos hoje, como fatores de risco mais elevados em grupos específicos, por hereditariedade ou etnia. No primeiro caso, homens cujos pais, irmãos, primos e tios já tiveram câncer de próstata, os exames devem começar mais cedo, por volta dos 40 anos, e da mesma forma, no segundo grupo, para os afrodescendentes. Embora os motivos ainda não estejam cientificamente claros, o câncer de próstata é mais frequente em homens de ascendência africana do que em homens de outras raças. 

Epigenética entra em campo

Nesses novos tempos, entra em campo a epigenética, área da biologia que estuda mudanças no funcionamento de um gene que não são causadas por alterações na sequência de DNA e que se perpetuam nas divisões celulares. Este talvez seja um dos maiores trunfos da medicina nos próximos anos. 

A epigenética pode ser a chave para a detecção precoce do câncer de próstata. Com ela, será possível avaliar a idade biológica do paciente, o que determinará a realização de exames específicos e determinar diagnósticos de forma bem mais precisa do que hoje, quando nossa atenção ainda é baseada estritamente na idade cronológica do indivíduo.

Numa época em que somos mais longevos, evitar os efeitos colaterais, físicos, mentais e psicológicos pode ter incomensuráveis ganhos em uma segunda etapa da vida, que poderá ser tão longa ou mais que a primeira. Por isso, cuidar do paciente como um todo é ainda uma parte que a medicina deve se debruçar com estudos, ampliar conhecimentos de biologia molecular, genéticos e epigenéticos. Porque o tempo poderá ser (ou não) o senhor da razão. Mas o propósito deve ser sempre o de perseguir a assertividade, como foco na essência da medicina, na prevenção, no tratamento, na cura e, principalmente, na qualidade de vida do paciente.

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Letra de Médico - Marcelo Bendhack

 

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