PRORROGAMOS! Assine a partir de 1,50/semana
Imagem Blog

Letra de Médico

Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Orientações médicas e textos de saúde assinados por profissionais de primeira linha do Brasil

A verdadeira relação dos pediatras com as crianças

Para ser pediatra é necessário evitar o envolvimento emocional, mas isso não significa necessariamente não amar o paciente

Por Mauro Fisberg
Atualizado em 25 abr 2018, 12h45 - Publicado em 25 abr 2018, 12h00

Sempre ouvi que o pediatra é o especialista que adora crianças ou que gosta de trabalhar com crianças. E sempre que recebia esta resposta de meus alunos de porque escolheriam a pediatria, eu devolvia dizendo que poderiam ser melhores professores, pedagogos, cuidadores, pais, psicólogos pediátricos, ou qualquer outra carreira relacionada ao envolvimento emocional ou desenvolvimento de crianças e não necessariamente a pediatria.

Horrorizados, eles me encaravam sem entender e eu tentava explicar que o pediatra não necessariamente ama seus pacientes, como em todas as especialidades. No entanto, adora prevenir, acompanhar, desenvolver, tratar e resolver os problemas ligados à infância. E não necessariamente ter um envolvimento emocional com UM paciente. E que quando tem de definir um determinado tratamento, uma determinada conduta, NÃO ter esta aproximação pode ser a determinante de uma resposta de vida ou morte.

Pensando friamente, isto é um absurdo. Afinal amamos nossa profissão por esta intensa proximidade com o tipo de paciente ou com o tipo de doença que queremos evitar ou tratar. E depois de 40 anos de atividade como pediatra, a minha conduta hoje é bastante diferente… Amo a CRIANÇA OU ADOLESCENTE, pelo que eles são. E nunca mais me deixei levar pelo amor ao tipo de problema, doença, condição clínica rara ou sintoma diferente que poderia levar a uma publicação ou a uma leitura mais aprofundada.

Hoje amo o ser. Amo a resposta, amo o comportamento, os fatores ambientais que geram respostas e geram movimentos e contra movimentos. Aprendi a ouvir mais do que a falar, aprendi a ver mais do que examinar. Aprendi a gostar de fatos, de historias, de relacionamentos com amigos, com escutar os pais, os avós, as babás, cuidadoras, professoras e terapeutas. Mas especialmente aprendi a olhar com o rabo do olho, cada reação da criança ao entrar no consultório… da sonolenta e irritada, ao desconfiado e intranquilo, do agitado e confiado ao alheio…

Do aperto de mão, da recusa em cumprimentar, do comportamento arredio e gritão ao que sai correndo para a caixa de brinquedos. Do adolescente desconfiado e que nada fala, ao que já avisa aos pais que eles não deverão entrar na consulta.

E como não amar cada um deles? Como não se deixar levar pela risada quando uma menina de 8 anos chamada Helena, responde para que eu não deixe de escrever que ela é Helena de Troia (a destruidora de corações de pediatras). Como não amar o adolescente que fica três dias inteiros sem dormir, comer e beber, jogando um jogo online.

Continua após a publicidade

Como não amar a Luciana que foi minha paciente desde bebê e está dando a luz. Ela também médica e queria seguir minha especialidade por que eu a havia emocionado. Como não amar um bebê que cresce dentro de uma curva de crescimento prevista, que segue canais esperados para a idade e o gênero.

Mas também como não amar o desnutrido ou obeso que clamam por atenção imediata e futura. Como não amar poder orientar pais jovens e ansiosos, ou odiar a negligência e o abuso. Como não amar cada nome diferente ou repetido de geração em geração. Como não amar cada pai que busca ter um filho tentando tratamentos milionários ou adotando. Como não amar a busca pelo normal ou pelo superlativo. E aqueles que amam os que não conseguem chegar perto disto…

Esta e a pediatria de hoje que deveria existir. A do médico que escuta, que entende, que se assenhora do ambiente, do entorno, do todo, do holístico e não percebe apenas a febre. O sintoma é parte de um todo e obriga a entender a causa.

O pediatra precisa entender que não é infalível e que nem sempre tem respostas. Não sabe a origem de todo problema que aparece e nem consegue dar nome a todos os conjuntos de sinais e sintomas. Mas ele tem o tempo ao seu lado.

Continua após a publicidade

A capacidade de acompanhar e tentar entender um ambiente muito maior, que envolve pais, escola e sociedade. A criança e o adolescente não estão sozinhos no meio em que vivem, e devemos lutar para que não sigam sozinhos, estendendo a rede de apoio em que irão viver, seja na pseudo-normalidade ou na dificuldade de uma doença crônica, física ou mental.

Ser pediatra é amar o grito, o choro, a risada, a resposta irônica ou mal educada, o medo ou a tristeza. É amar a cada dia quando ao final da consulta acontece o beijo rápido, o cruzar de tapas de palmas num high-five, ou o soluço alegre de que tudo tenha acabado desta vez…

Por isto, ser pediatra é sofrer. Sofrer a cada vez que algo não evolui bem, uma nota escolar, um relacionamento com um amigo, uma doença, uma escala evolutiva que não foi seguida. Quando um sintoma não cede, quando temos de internar ou operar, ou quando simplesmente não conseguimos entender algo…

Mas resta a esperança de que o nosso próximo paciente (nem tão paciente), transforme outra vez o sofrimento em amor….

Continua após a publicidade

 Aos nossos filhos, aos pais e a todas as crianças que já atendemos!

Letra de Médico - Mauro Fisberg

 

Quem faz Letra de Médico

Adilson Costa, dermatologista
Adriana Vilarinho, dermatologista
Ana Claudia Arantes, geriatra
Antonio Carlos do Nascimento, endocrinologista
Antônio Frasson, mastologista
Artur Timerman, infectologista
Arthur Cukiert, neurologista
Ben-Hur Ferraz Neto, cirurgião
Bernardo Garicochea, oncologista
Claudia Cozer Kalil, endocrinologista
Claudio Lottenberg, oftalmologista
Daniel Magnoni, nutrólogo
David Uip, infectologista
Edson Borges, especialista em reprodução assistida
Fernando Maluf, oncologista
Freddy Eliaschewitz, endocrinologista
Jardis Volpi, dermatologista
José Alexandre Crippa, psiquiatra
Ludhmila Hajjar, intensivista
Luiz Rohde, psiquiatra
Luiz Kowalski, oncologista
Marcus Vinicius Bolivar Malachias, cardiologista
Marianne Pinotti, ginecologista
Mauro Fisberg, pediatra
Miguel Srougi, urologista
Paulo Hoff, oncologista
Paulo Zogaib, medico do esporte
Raul Cutait, cirurgião
Roberto Kalil, cardiologista
Ronaldo Laranjeira, psiquiatra
Salmo Raskin, geneticista
Sergio Podgaec, ginecologista
Sergio Simon, oncologista

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

Apenas 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (a partir de R$ 8,90 por revista)

a partir de 35,60/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.