Com a equipe que tem, Jair Bolsonaro não precisa de mais adversários. O caso dos absorventes femininos é exemplar.
Ele vetou uma despesa de R$ 50 milhões por ano aprovada pelo Congresso, em regime de urgência, para possibilitar a distribuição desses produtos de higiene a mulheres jovens e pobres no Sistema Único de Saúde.
É questão de saúde pública, lembrou ontem o presidente do Senado Rodrigo Pacheco: “Pautei no Senado e aprovamos rapidamente porque queríamos transformar essa realidade. São impressionantes as histórias de proteção com papel de jornal e miolo de pão por adolescentes e mulheres carentes.”
A ideia do veto se disseminou como um vírus político no Palácio do Planalto, onde ocorre uma hipnose coletiva diante do derretimento da candidatura de Bolsonaro à reeleição. O chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, fingiu que não era com ele. Outros ministros, também. Os assessores jurídicos se limitaram a preencher o “formulário” para emoldurar a decisão presidencial.
Bolsonaro assinou por razões inexplicáveis. Única explicação plausível, talvez, fosse uma certa ojeriza a “dar privilégio” a pobre que “acaba votando em comunista” — coisa com a qual, possivelmente, ele não concorda.
O presidente do Senado reagiu com fina ironia: “O Congresso está pronto para contribuir com o governo nas soluções de cunho fiscal, mas considero desde já que esse veto é candidatíssimo a ser derrubado”
Damares Alves, ministra da Mulher e da Família, tentou socorrer o chefe. E conseguiu aquilo que parecia impossível: piorou a situação. Deu uma dimensão tragicômica à própria atuação e à forma como Bolsonaro governa: “A gente tem que decidir, a prioridade é a vacina ou é o absorvente?”
Ela administra um ministério virtual, mas com orçamento anual de R$ 514 milhões — valor dez vezes superior ao custo estimado para distribuição de absorventes femininos no SUS.
Damares sonha com uma vaga no Senado, na eleição do ano que vem. Na biografia, além de currículo turbinado, ostenta o registro de 15 minutos de fama numa reunião ministerial.
Foi em abril do ano passado, quando a pandemia já superlotava hospitais. Ela apresentou uma ideia para agradar o chefe: mandar prender governadores e prefeitos que limitassem a circulação de pessoas nas cidades. Recuou, mais tarde, quando soube que sua ideia continha um risco potencial de queda do governo, eventualmente com prisão para os envolvidos.