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O epílogo do ditador que deu lucro de US$ 1 bilhão à Odebrecht

Ele governou Angola por 38 anos, passava férias na Bahia e privilegiava o amigo Emilio Odebrecht com grandes negócios

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 5 jul 2022, 10h00
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  • O patriarca está morrendo. São praticamente nulas as chances de reversão numa condição clínica interpretada por médicos como “pré-morte encefálica”.

    Os dez filhos, de mães  diferentes, dividiram-se na decisão trágica. A maior resistência, aparentemente, é da deputada Tchizé, nascida Welwitschea no segundo casamento. Para ela, seu pai é vítima de uma dupla conspiração: um complô familiar e, simultaneamente, um plano para matá-lo arquitetado pelo governo de Angola.

    Certo mesmo é que o ex-ditador angolano José Eduardo dos Santos não deverá assistir às próximas eleições no seu país, na quarta-feira 24 de agosto.

    É considerado gravíssimo e irreversível o estado clínico do homem que por 38 anos governou Angola, passava férias numa ilha privada na Bahia e fez grandes negócios no Brasil, principalmente com o empreiteiro Emilio Odebrecht.

    Formado na extinta união Soviética em engenharia de petróleo e comunicações militares, ele era o chanceler na independência angolana de Portugal, em 1975. Obteve do Brasil, no governo Ernesto Geisel,  o primeiro reconhecimento. Assumiu o poder quatro anos depois, com a morte do então presidente Agostinho Neto.

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    Nas décadas seguintes, neutralizou o adversário externo, a África do Sul, liquidou o inimigo interno, Jonas Savimbi, e abriu o país ao capital estrangeiro em parcerias na exploração de petróleo e diamantes.

    Comandou uma cleptocracia assentada na miséria doméstica — sete de cada dez angolanos, com menos de 35 anos de idade, sobrevivem com menos de R$ 10 por dia.

    Empresas estrangeiras lucraram. O empreiteiro Emilio Odebrecht, por exemplo, chegou a ganhar cerca de US$ 1 bilhão por ano. Também ascenderam oligarcas locais, associados ao clã Dos Santos. Não se conhece o patrimônio pessoal e familiar, mas uma de suas filha, Isabel, consolidou uma das maiores fortunas conhecidas no continente africano.

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    Outra filha, Tchizé é deputada e dona de empresas de comunicação. É dela a versão sobre a  dupla conspiração para a morte do ditador, às vésperas de completar 80 anos.

    Na trama desenvolvida na própria família — ela argumenta —, o patriarca, um homem de 1m80, pesando menos de 50 quilos e imobilizado em cadeira de rodas, misteriosamente rolou pela escada interna da residência no charmoso bairro de Pedralbes, em Barcelona, Espanha.

    Aconteceu há onze dias, na quinta-feira 23 de junho. Levou tempo para alguém da casa notar e chamar paramédicos. Já chegou ao hospital com parada cardiorrespiratória, em coma.

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    Em paralelo, havia outro complô em andamento — ela acha. Era um plano para matar seu pai, supostamente arquitetado pelo governo de João Lourenço, presidente angolano, um ex-aliado no comitê central do Movimento Popular pela Libertação de Angola (MPLA).

    Lourenço transformou José Eduardo dos Santos em símbolo doméstico de uma “herança maldita”. Desde 2017 o mantém sob vigilância permanente (com guarda-costas) e paga praticamente todas as suas despesas — entre elas, a clínica em Barcelona onde a diária na UTI custa o equivalente a R$ 45 mil. A versão sobre o suposto plano de Lourenço, Tchizé deu ao repórter Xavier Aldekoa, do jornal catalão La Vanguardia. O governo angolano preferiu não comentar.

    O velho ditador está próximo do fim. Por mais dividida que esteja sobre prolongar ou não, por meios mecânicos, o sofrimento na cama de um hospital, ou na partilha de culpas, no epilogo dessa tragédia a família Dos Santos terá um corpo para rituais íntimos de despedida. Não deixa de ser um privilégio. É algo que a ditadura Dos Santos negou às famílias de muitos adversários aniquilados, cujos corpos continuam “desaparecidos”.

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