Faltou liderança para dizer ‘não’ a novos privilégios fiscais
Ninguém sabe quanto as pessoas e as empresas vão pagar de imposto, mas já tem isenção fiscal garantida até para importação de óleo combustível na Amazônia
Quase quarenta anos depois de iniciada a discussão, a reforma tributária avançou no Congresso. Aprovada no Senado, vai à Câmara sob uma torrente de dúvidas dos parlamentares.
A principal é: quanto exatamente as pessoas e as empresas vão pagar de imposto?
A falta de resposta objetiva ficou evidente durante as duas rodadas de votação no Senado, nesta quarta-feira (8/11).
Alguns confessaram ignorância. “Se eu chegar em Curitiba, que é a cidade onde eu moro, e o padeiro, o barbeiro, o pessoal que vende pão perguntar ‘quanto eu vou pagar de imposto?’, eu não tenho resposta para dar”, exemplificou no plenário o senador Flavio Arns, do PSB do Paraná.
Uma das poucas certezas é a da melhoria do sistema, pela redução do número de impostos, criando a chance de se acabar com o chamado manicômio tributário.
Mas, por enquanto, ninguém tem resposta clara sobre quanto será o imposto para contribuintes e consumidores — ou seja, para todos.
O governo estima em 27,5%, na média, e torce para que a conta final não se aproxime de 30%.
A confusão é grande por causa das concessões de privilégios fiscais. Foram 800 emendas no Senado, cerca de três dezenas na véspera da votação.
No texto final, aprovado pelos senadores, embutiu-se um pouco de tudo. Entre outras coisas, há um aumento salarial dissimulado para auditores fiscais de estados e municípios — eles passam a ter remuneração máxima de 41,6 mil reais, compatível com o limite federal e acima do permitido na legislação de pessoal dos estados e municípios.
Criou-se um novo fundo regional, de 700 bilhões de reais nos próximos 18 anos, para Amazonas, Acre, Rondônia, Roraima e Amapá, mas sem indicação da origem desse dinheiro.
São inúmeras as novas isenções, totais ou parciais: instituições financeiras, agricultura, planos de saúde, empresas imobiliárias, lotéricas, clubes esportivos, hotelaria, transportes, comunicação, eventos… Tem isenção fiscal até para importação de óleo combustível na Amazônia.
A lista é extensa e poderá ser ampliada na Câmara. Ela reflete debilidade política na defesa do interesse coletivo. Isenção concedida a uns significa, na prática, aumento de imposto a ser pago por outros.
Faltou alguém no governo e no Congresso com força política para dizer “não” aos grupos de pressão. Faltou liderança.