Durou seis anos o pacto de maioria parlamentar que viabilizou um longo período de governo das esquerdas em Portugal.
A dissolução da Assembleia da República deve ser formalizada hoje, em decreto do presidente Marcelo Rebelo de Souza, prévia às eleições legislativas antecipadas — entre janeiro e fevereiro.
Será o epitáfio da geringonça, apelido dado pelos portugueses à mais improvável coalizão de sete partidos: Popular, Social Democrata, Socialista, Comunista, Partido Popular, Bloco de Esquerda, Verdes e o PAN, sigla para “Pessoas–Animais–Natureza”.
Geringonça, nos dicionários, é obra extravagante e mal armada que ameaça desconjuntar-se. A portuguesa sustentava-se na engrenagem parlamentar da maioria simples que partilhava orçamentos de 17 ministérios e de quatro dezenas de secretarias de Estado.
Arruinou-se na obsessão pela hegemonia: “A ‘geringonça’ foi morta pela obsessão pela maioria absoluta do Partido Socialista”, traduziu Catarina Martins, 48 anos, deputada de meio milhão de votos (10,9%) pelo Bloco de Esquerda e uma das mulheres mais influentes na política europeia.
A compulsão pela maioria absoluta tem abatido diferentes coalizões governamentais na outra margem do Atlântico. O Mensalão no governo Lula é caso exemplar. O acordo Bolsonaro-Centrão no orçamento paralelo segue na mesma trilha.
As eleições de 2022 têm excitado especulações desconexas e imaginativas sobre uma geringonça à brasileira. Um desses projetos para a construção de maioria absoluta no Congresso, a partir de 2023, tem sido debatido em frações da esquerda sob o rótulo de “governo colegiado”.