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Câmara quer criar uma “nova classe” com imunidade nas redes sociais

Projeto acaba com o único lugar onde brasileiros com e sem mandato ainda podem ser considerados iguais. A  "nova classe" teria camarote VIP no mundo virtual

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 12 dez 2021, 13h34 - Publicado em 12 dez 2021, 08h00

A Câmara avança na criação uma “nova classe” no mundo virtual, estendendo à internet privilégios que os parlamentares já possuem em relação aos cidadãos na vida real.

Centrão e partidos de oposição uniram forças para levar adiante um projeto de lei (nº 3227/21) que amplia a imunidade parlamentar à internet já na temporada eleitoral do ano que vem.

Pela Constituição (Artigo 53), deputados e senadores na função são “invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”.

Foi uma espécie de seguro adotado pelos constituintes para impedir a repetição de casos como os dos deputados Marcio Moreira Alves e Francisco Pinto, cassados pela ditadura a pretexto de crítica a regimes ditatoriais.

Em 1968, Alves propôs um boicote às celebrações do Dia da Independência, com adesão das “moças e namoradas” dos militares. Em 1974, Pinto protestou contra uma visita ao país do ditador chileno Augusto Pinochet, “por muitos que gostariam de reclamar e gritar nas ruas contra a sua presença”.

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Agora, a iniciativa na Câmara tem outros objetivos. É resultado de manobra legislativa idealizada pelo governo como reação à política adotada por empresas privadas, como Google, Facebook e Twitter, de vetar mensagens de conteúdo falso e considerado perigoso ao público.

Bolsonaro tem sido punido, de forma recorrente, por divulgar falsidades — por exemplo, a de que vacinas antiCovid-19 provocam ou estimulam doenças como Aids.

Insatisfeito, autorizou a preparação de um decreto para mudar a legislação sobre a internet, conhecida como Marco Civil, e levar o governo a assumir o controle das plataformas de redes sociais. Sempre, claro, em “defesa dos direitos e garantias dos usuários”.

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O texto ficou pronto em maio no Ministério do Turismo, conforme correspondência do ministro Gilson Machado Neto (Ofício Circular nº 88/2021/GM) postada no sistema de documentos internos do governo.

A “Exposição de Motivos” (EMI nº 00030/2021) que acompanhava a minuta de decreto presidencial deixava claro que uma seção do ministério comandado por Machado Neto — a Secretaria da Cultura — passaria a ter funções equivalentes às de um tribunal das redes sociais.

Bolsonaro assinou Medida Provisória (nº 1068/21) na linha sugerida pelo Turismo na véspera do Dia da Independência, quando promoveu comícios em Brasília e em São Paulo, insinuando golpe de Estado e insultando juízes do STF e do TSE.

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A MP foi devolvida à Presidência da República pelo presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), por inconstitucionalidade. Bolsonaro não desistiu. Reempacotou o  texto no formato de projeto de lei (nº3227/21) e enviou à Câmara.

Às vésperas da temporada eleitoral, a ideia ganhou força em um grupo de deputados criado para produzir uma lei de “combate” às notícias falsas. Uniu a bancada governista e parte da oposição, que assumiu a relatoria com o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP).

O comunista Silva encontrou um ponto de convergência com bolsonaristas para atrair apoio legislativo ao projeto: a extensão da imunidade parlamentar do mundo real ao virtual.

Se aprovado, o projeto acabaria com o único reduto onde brasileiros com e sem mandato ainda podem ser considerados iguais. A  “nova classe” teria um camarote VIP, também, no mundo virtual.

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