A Câmara prepara medidas para obrigar a Petrobras a expor em detalhes a sua política de preços para gasolina, diesel e gás, que é vinculada aos valores do barril de petróleo e do dólar.
A empresa é peça-chave na crise de custo de energia, que deve se agravar, acham deputados governistas e da oposição.
Nos últimos oito meses, a gasolina subiu 31%, o diesel 28% e o gás de cozinha (GLP) 24%. No entanto, a inflação nesse período foi de 5,7%.
O choque de preços está visível para consumidores nos postos de combustíveis e nos pontos de revenda de botijões de gás. Mas vai além, e se dissemina por toda a economia.
Tem sido decisivo, por exemplo, nos sucessivos aumentos na conta de luz. Com a seca prolongada, as usinas termelétricas movidas a gás e óleo diesel passaram a produzir cerca de 20% da energia elétrica hoje disponível.
Parlamentares aliados do governo e da oposição submeteram o presidente da Petrobras, Joaquim Luna e Silva, a uma sessão de perguntas que durou cinco horas na terça-feira passada. O que seria uma audiência rotineira na Comissão de Minas e Energia, acabou transformada em Comissão Geral no plenário da Câmara.
Luna fracassou em convencer os deputados sobre a transparência da empresa na composição dos seus preços para os derivados de petróleo.
Foi cobrado porque lançou uma campanha de “esclarecimento” na qual se diz que “tudo que excede R$ 2 no preço da gasolina [R$ 6, na média nacional] não é de responsabilidade da Petrobras”.
Foi uma tentativa de demonstrar sintonia da sua administração com a retórica de Jair Bolsonaro, que passou a culpar governadores pela alta dos combustíveis por causa da tributação estadual (ICMS).
Na prática, Luna levou a Petrobras a um confronto com os Estados. Na véspera do seu depoimento, 13 Estados recorreram à Justiça para proibir a campanha, sob alegação de “propaganda enganosa” — o imposto estadual corresponde a 46% do preço da gasolina.
Edio Lopes (PL-RR), integrante do Centrão, lembrou que há meses a Câmara cobra explicações da Petrobras, e criticou: “Seria por demais simplista nós querermos atribuir o elevado preço de combustíveis no Brasil apenas ao ICMS. Em 2011 a gasolina custava R$ 2,90 e a carga tributária era a mesma dos dias atuais.”
Bohn Gass (PT-RS) completou: “Estamos exportando diesel, combustível bruto, e importando-o refinado, pagando caríssimo.”
Luna, também, não conseguiu persuadir os deputados sobre a coerência do planejamento da empresa na distribuição de gás para usinas térmicas. Em plena crise energética, seis estão paradas por falta de gás, deixando de produzir o equivalente a 3 mil megawatts, volume corresponde a um terço do consumo da Grande São Paulo.
“A prioridade na entrega de gás é para térmicas com produção de energia mais cara, em detrimento de algumas térmicas com produção de energia mais barata?” — quis saber o deputado Danilo Forte (PSDB-CE). Ficou sem resposta. Insistiu: “Há uma lógica que eu ainda não consegui entender. Como as térmicas que estão na ‘boca’ do pré-sal, no Espírito Santo e no Rio de Janeiro, podem estar paradas por falta de fornecimento de gás?” Continuou insatisfeito.
Elmar Nascimento (DEM-BA) ironizou: “Parece que nós brasileiros não entendemos nada de gás. O gás natural liquefeito importado do Catar, que fica a 3.500 quilômetros de distância, é vendido no Brasil ao preço médio de 3,6 dólares. Como se pode explicar, então, que o consumidor brasileiro tenha que pagar de 8 a 10 dólares pelo gás do pré-sal?”
Luna retrucou. Disse que o preço do gás natural liquefeito (GNL) está no patamar de 20 dólares e a Petrobras “vende pela metade desse preço”.
Nascimento manteve a crítica, e disse que a empresa fez uma “apropriação indébita” de bens (gasodutos) da União, que detém o monopólio do gás. Em 2009, o Congresso favoreceu a Petrobras com a prorrogação das concessões de gasodutos por 30 anos e sem custo adicional. “Ela se aproveitou disso”, acusou. “Vendeu o que não era dela! Vendeu gasodutos antigos e pagos para empresas privadas, a NTS e a TAG, por cerca de R$ 90 bilhões.” E propôs que o Legislativo determine o uso desse dinheiro para financiar “uma política de redução do preço dos combustíveis e do preço do gás.”
Além da crise hídrica, tem-se agora uma crise de custo de energia. A conta continua subindo para os consumidores. Em julho, o governo previa gastar R$ 9 bilhões com usinas térmicas. Em agosto, refez o cálculo. A fatura aumentou nada menos que 45% no espaço de quatro semanas. Agora prevê um gasto de R$ 13,1 bilhões com as térmicas, a ser pago na conta de luz.
A Petrobras passou ao alvo dos parlamentares, que não conseguem explicar aos eleitores porque um litro de gasolina custa mais de R$ 8 em áreas como Marechal Thaumartugo, cidade do Acre na fronteira com o Peru. Ou ainda, a razão de um botijão de gás de cozinha (13 kg) ser vendido a R$ 130,00 em cidades do seminário do Ceará.
Em contraste, a empresa multiplica lucros — R$ 43 bilhões no segundo trimestre — e se alinha a Bolsonaro num embate político-eleitoral com governadores estaduais, alguns deles candidatos a uma vaga no Senado em 2022.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), acha que há um “estado de letargia e inércia [no governo] em relação ao que está acontecendo”. Manobra para tentar resolver tudo “sem tumulto”, ou seja, nos bastidores, sem o barulho de uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Se vai conseguir, nem ele sabe. A Petrobras se candidatou a alvo político em plena crise energética. Conseguiu.