Bolsonaro e Valdemar fogem um do outro para evitar risco de prisão
Para se manter "nas quatro linhas" da lei, adotaram uma ordem quase militar de separação de corpos, ao menos em público
Jair Bolsonaro e Valdemar Costa Neto encontraram a fórmula da perfeita cumplicidade: não se veem, não se falam, não andam no mesmo carro ou no mesmo avião, não se hospedam no mesmo hotel nem ficam juntos no mesmo palanque. Um passa o tempo fugindo do outro, mas continuam sócios na política, enlaçados no bilionário caixa do Partido Liberal — presidido por Costa Neto e abriga o ex-presidente junto com parte do seu clã.
Estão assim há nove semanas e meia. Seguem instruções de seus advogados, preocupados com a proibição judicial de contato entre investigados na conspiração e tentativa (frustrada) de golpe de estado para manter Bolsonaro no poder. Em tese, há risco de prisão.
Para se manter “nas quatro linhas” da lei, adotaram uma ordem quase militar de separação de corpos, ao menos em público. Implica na mobilização de assessores para organizar previamente a localização, o transporte e a disposição de cada um nos mesmos ambientes.
Alguns detalhes foram relatados por Damares Alves, senadora pelo PL do Distrito Federal, na sessão do Senado desta segunda-feira (22/4):
— Eu vou contar dois episódios. No dia (27/3) da filiação ao PL do nosso colega Izalci [Lucas, que saiu do PSDB], houve uma festa lindíssima aqui em Brasília, uma festa belíssima. Tanto o Valdemar como o Bolsonaro queriam ir ao evento. Sabe como é a logística?
Fez uma breve pausa, e prosseguiu: — Valdemar entra e sobe [ao auditório do hotel]; o Bolsonaro fica lá longe na esquina [da Asa Sul], e tem que se medir quantos metros estão distantes um do outro.
Alguns ficaram mais atentos. Ela continuou: — Aí, o Valdemar fala, num evento belíssimo… É uma alegria para o PL estar levando um senador [do PSDB]… Aí, o Valdemar tem que sair correndo como um bandido. Aí, o segurança de Bolsonaro recebe a ligação [avisando] que Valdemar já está a cem metros de distância. É para Bolsonaro se aproximar.
Outra pausa, e acrescentou enfática: — Espere aí, tem mais! Tem mais. O casal Michelle e Bolsonaro trabalha na sede do PL, e, às vezes, o casal sai junto de casa, no mesmo carro. Quando Bolsonaro quer deixar a esposa na porta do PL, como Valdemar está lá em cima, tem que se medir a distância [a partir] de onde Bolsonaro vai parar. [Se] é para a Michelle descer na esquina, porque Bolsonaro não pode se aproximar de Valdemar.
Risos apressaram o fim do discurso. Minutos depois, ela voltou ao microfone:
— Vou começar falando que, por algum tempo, eu tinha medo de vestir verde. No dia da minha posse aqui no Senado Federal, eu ganhei uma roupa linda para a minha posse A roupa era verde, e me disseram o seguinte: “Não vá de verde, porque o ministro do STF vai achar que você o está provocando”… Guardei a minha roupa verde por muito tempo. Já vesti uma vez, estou vestindo hoje, dizendo que eu não tenho medo de vestir verde, não tenho medo de vestir amarelo, e nós não devemos temer um ministro da Suprema Corte a esse ponto…
Olhava para as câmeras dos assessores, a voz ecoava no plenário esvaziado.