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Alto risco

Na política externa, falta definir o papel do Brasil no jogo dos EUA, China, Europa e Rússia

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 11h12 - Publicado em 6 jan 2023, 06h00
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  • Lula definiu a refundação da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) como prioridade na política externa, anunciou o chanceler Mauro Vieira.

    Há três décadas, o Itamaraty tenta liderar a criação de uma comunidade da América do Sul. As negociações começaram no governo Itamar Franco, nos anos 90 do século passado. No período Lula-I, em 2003, virou o principal projeto da diplomacia brasileira.

    A Unasul foi imaginada como bloco político de oposição aos Estados Unidos, em contraponto permanente à influência de Washington em organismos como a Organização dos Estados Americanos (OEA).

    Projetaram-se sede, burocracia e um Parlamento regional em torno de um objetivo comunitário de longo prazo, a unificação das políticas comerciais dos países que integram o Mercosul e a Comunidade Andina.

    O viés antiamericano embalou ambições de Lula, Hugo Chávez (Venezuela) e Néstor Kirchner (Argentina). A partir daí, Chávez e Kirch­ner enlevaram-se no vislumbre de uma chance histórica de mitigar o poder regional do Brasil — dono de metade do território, da população e do produto interno bruto (PIB) da América do Sul.

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    Quando um dos arquitetos, o então chanceler Celso Amorim, apresentou o projeto da Unasul, o coronel venezuelano retrucou com a sutileza da lâmina de um machado: “O que vocês estão propondo é uma ‘Alquita’ ” — referência à versão menor, e regionalizada, da proposta dos Estados Unidos para criação de uma Área de Livre-Comércio das Américas (Alca). Chávez, Lula e Kirchner haviam combinado sepultar a Alca como símbolo do imperialismo ianque.

    A Unasul sobreviveu à Alca, mas como capítulo de um dos maiores fiascos diplomáticos das últimas duas décadas. Nunca chegou a funcionar, embora tenha construído duas sedes: uma no Equador, destinada à burocracia central, e a outra na Bolívia, para o Parlamento Sul-Ame­ricano. Elas custaram 200 milhões de dólares, o equivalente a 1 bilhão de reais, com parte dos gastos (38%) debitados na conta do Brasil.

    “Falta definir o papel do Brasil no jogo dos EUA, China, Europa e Rússia”

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    No espólio da Unasul consta um prédio na Metade do Mundo, vilarejo na periferia de Quito, Equador. Parece pairar no ar, com vidros refletindo montanhas ao fundo e cercado por espelhos-d’água. Tem cinco andares e dois subsolos em 19 500 metros quadrados de área construída. Inaugurado em 2014, teve ocupação máxima de três dezenas de diplomatas, um para cada 650 metros quadrados. A ociosidade equatorial perdurou até 2018, diante de uma estátua de Néstor Kirchner no jardim, quando o governo local decidiu despejar a burocracia e converter a sede da Unasul em escola pública.

    Outra parte dos despojos está a 3 600 quilômetros ao sul da Metade do Mundo, na vila de San Benito, em Cochabamba, região central da Bolívia. São três edifícios espelhados e sobre pilotis, com escritórios e auditórios em 12 000 metros quadrados, ao lado de um plenário de 18 000 metros. Integram-se a um heliponto com seis hangares, distante 8 quilômetros. Plantado numa área rural, cercada por montanhas e mato, que avança em silêncio, o conjunto foi inaugurado cinco anos atrás por Evo Morales, ex-pre­sidente boliviano, mas as instalações nunca foram usadas.

    A ressurreição da Unasul acontecerá “em novas bases”, disse no discurso de posse o chanceler, Mauro Vieira, diplomata que completa meio século de carreira no bicentenário Itamaraty. “Nossa ideologia na região será a ideologia da integração”, argumentou, acrescentando: “De todas as ausências do Brasil, o abandono da América Latina e do Caribe talvez seja a que nos ocasionou maiores prejuízos.”

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    É legítima a vontade de Lula-III de semear na paisagem desértica herdada de Jair Bolsonaro. A insistência no conceito de integração regional é, também, coerente com a história exemplar de um país que incorporou 900 000 quilômetros de território, no último século, sem conflitos com a França na fronteira norte, com a Bolívia a oeste, e com a Argentina ao sul.

    Notável, no entanto, é a omissão do novo governo sobre a mais relevante mudança política global — o jogo de poder entre os Estados Unidos, a Europa e a China, a partir das consequências da guerra de Vladimir Putin na Ucrânia.

    Os principais riscos para o Brasil, sob Lula-III, estão concentrados nesse cenário, porque é crítica a dependência brasileira do comércio com a China e dos investimentos americanos e europeus. Sem estratégia definida, e com apoio doméstico, arrisca-­se um futuro patinando no passado, com glórias individuais efêmeras e perdas coletivas históricas.

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    Os textos dos colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de VEJA

    Publicado em VEJA de 11 de janeiro de 2023, edição nº 2823

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