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Informação e análise
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Trapalhada eleitoral: Bolsonaro e Lira querem CPI contra o próprio governo

Acionista reclamar do alto lucro da empresa é incomum. Mais raro é presidente, candidato à reeleição, combinar com aliados uma CPI contra o próprio governo

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 20 jun 2022, 12h33 - Publicado em 18 jun 2022, 09h30

No governo Jair Bolsonaro, até o impossível acontece. Ontem, por exemplo, ele anunciou ter combinado com o deputado Arthur Lira, presidente da Câmara, a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito contra… o próprio governo.

Disse à rádio 96 FM, da Paraíba: “Eu conversei com Arthur Lira. Ele está nesse momento se reunindo com líderes partidários, e a ideia nossa é propor uma CPI para investigarmos o presidente da Petrobras, os seus diretores e também o conselho administrativo e fiscal.”

Acionista majoritário, o governo é o responsável único, de direito e de fato, pela indicação da ampla maioria dos diretores e conselheiros da empresa.

“Nós queremos saber se tem algo errado nessa conduta deles”, argumentou, referindo-se à administração da companhia que, depois de anos de prejuízos, começou a distribuir lucros aos acionistas, principalmente ao governo, que é o controlador.

Ou seja, Bolsonaro e Lira querem saber o que há de “errado” no fato de a Petrobras ter aumentado em quase 1.000% o repasse de lucros governo.

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Em 2020, ela mandou R$ 2,5 bilhões em dividendos para os cofres federais. Ano passado entregou R$ 27,1 bilhões. E, neste primeiro semestre, prevê mais R$ 31 bilhões.

Bolsonaro acha “absurdo”, “inconcebível”, “coisa que ninguém consegue entender, estúpido”, uma empresa petrolífera lucrar com o aumento recorde dos preços do petróleo e dos combustíveis no mercado mundial.

Acionista reclamando do excesso de lucratividade de sua empresa é algo absolutamente incomum.

Mais raro, talvez, seja um presidente da República, em campanha pela reeleição, combinar com os seus aliados na Câmara uma CPI contra o próprio governo.

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Tudo isso a uma centena de dias da eleição, e com o candidato Bolsonaro aflito com o segundo lugar e à grande distância (média de 20 pontos percentuais) do líder nas pesquisas, o adversário Lula. Uma grande ideia, sem dúvida.

Entusiasmada com a trapalhada governamental, a oposição até se esqueceu de agradecer e foi direto à celebração. “De CPI eu entendo”, festejou o líder oposicionista no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que integra a equipe de campanha de Lula. E já esboçou um roteiro: “Investigar a Petrobras, que integra o governo; depois, investigar os presidentes da Petrobras, que Bolsonaro mesmo nomeou. E vamos chegar à resposta: a responsabilidade é do próprio Bolsonaro!”

Em casa, no feriado religioso, o deputado Lira deu à Globonews detalhes das providências que já havia tomado.

“Eu liguei para Zé Mauro [Coelho, presidente da Petrobras] ontem [quinta, 16]” — contou. “Pedi para ele não dar aumento, [e disse]: ‘Você está trabalhando contra, o que se espera da Petrobras é outra coisa’.”

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Prosseguiu: “Falei que ia fazer um trabalho para demitir ele [que já havia sido demitido no dia 24 de maio por Bolsonaro]. E que vou propor com o governo para taxar o lucro da Petrobras’. Ele [respondeu]: ‘Não é bem assim, é o conselho [de administração], não estou postergando a minha saída.'”

É outra raridade política. Na prática, o presidente da Câmara confessou ter atravessado a linha que demarca a separação e a autonomia dos Poderes, prevista na Constituição.

Lira fez uma interferência direta — pela Lei das Estatais, indevida —, atropelando garantias de independência administrativa da empresa de capital misto, a maior do país, que tem mais 700 mil acionista privados e mantém ações nos pregões das bolsas de valores de São Paulo e de Nova York.

Ele ecoou a estridência de Bolsonaro, confirmando a agonia eleitoral decorrente do descontrole da inflação. O presidente-candidato classificou de “traição” o anúncio da Petrobras de novo reajuste dos combustíveis, o quarto deste ano, depois de 99 dias de congelamento de preços.

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Já presidente da Câmara rotulou de “atos de má fé”, “absurdos”, segundo ele cometidos por gente indicada pelo governo que estaria “sacaneando” o governo. Acrescentou: “[O aumento de preços] é um ato de terrorismo corporativo.”

Em rede social escreveu dirigindo-se ao presidente da empresa, demitido 40 dias depois de escolhido com o aval de Bolsonaro: “Saia daí, saia já! Esse lugar não é seu.”

Lira e Bolsonaro não mencionaram o destino dos R$ 60,6 bilhões de lucros repassados pela Petrobras à União nos últimos 30 meses.

Nada disseram, também, sobre o que foi feito com os tributos que ela pagou no ano passado — no total, mais de R$ 200 bilhões aos governos federal, estaduais e municipais.

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Abstraíram o fato de que rejeitaram criar um fundo de subsídios para reduzir preços dos combustíveis dentro do orçamento público. Entre abril de 2021 e fevereiro passado, recusaram apoio a essa  iniciativa do Senado para atenuar o impacto do aumento dos preços do petróleo no bolso dos consumidores.

Quando os senadores decidiram votar, depois de dez meses de espera, o governo pediu para adiar a decisão sobre o fundo de estabilização de preços para baratear combustíveis.

Foi na noite de quarta-feira, 23 de fevereiro. Os senadores atenderam ao pedido do Palácio do Planalto. Encerraram a sessão e, duas horas depois, a Rússia invadiu a Ucrânia. O preço do petróleo disparou.

Lira e Bolsonaro querem ganhar a eleição de outubro. É legítimo. No entanto, iniciaram uma guerra contra a Petrobras, patrimônio da União, por interesse privado, eleitoral.

Se isso resultar em perdas para a empresa e para a sociedade, como já se evidencia, correm o risco de vir a ser responsabilizados — política e patrimonialmente.

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