Ela já era figurinha fácil no pedaço muito antes de São Paulo virar a cidade daqueles atributos que todo mundo está cansado de saber – carros, concreto, a Pauliceia Desvairada dos modernistas. A quaresmeira não deve ser vista meramente como uma árvore simpática: ela é um testemunho botânico vivo sobre a verdadeira natureza paulistana. Quando os jesuítas chegaram por aqui, lá no século XVI, encontraram campinas, rios, manchas de cerrado. Mas o que dava tom à paisagem, não há dúvida, era a vegetação típica da Mata Atlântica do alto da serra – São Paulo, afinal, está geograficamente encravada na borda da Serra do Mar. O que explica, aliás, outro atributo óbvio que tem tudo a ver com as quaresmeiras: a garoa. Por vir da mata úmida de altitude, essa árvore de pequeno porte – bem como seu parente próximo, o manacá-da-serra – adora uma garoazinha bem paulistana.
Mas deixemos de história para ir ao que interessa: as quaresmeiras de São Paulo estão bombando. Pelas ruas da cidade, é impossível não notar a explosão de tons de roxo e rosa proporcionada pela espécie. Quaresmeira é muito carne-de-vaca? Bem, e daí? Elas são daqui e nunca, jamais serão demais na nossa paisagem: recomendo vivamente que a quaresmeira seja levada em consideração se você tiver de plantar uma árvore na frente de sua casa ou em seu jardim.
Além de ser uma planta nativa, a Tibouchina granulosa – nome científico tanto da variedade roxa quanto da rosa – exibe a vantagem de ser extremamente rústica. Tudo o que ela precisa é de boa insolação, regas regulares no início do cultivo e alguma atenção em relação a pragas como os cupins. Se você quer turbinar sua quaresmeira, tente adubá-la de vez em quando com NPK 10-10-10 (a combinação básica de nitrogênio, fósforo e potássio). No mais, como sabe qualquer pessoa que já desceu de carro para o litoral, vale também investir no manacá-da-serra – cujas flores mesclam tons de lilás e branco. O manacá, ou Tibouchina mutabilis, é opção mais adequada para varandas de apartamento, pois sua variedade anã se adapta muito bem a vasos. Mas atenção: um tanto de luz solar direta será sempre obrigatório.
E de onde vem esse nome meio solene e religioso, quaresmeira? Basta atentar para o calendário e você vai entender sua lógica: a árvore costuma iniciar seu principal período de floração às vésperas do Carnaval – ou seja: ela anuncia a chegada da quaresma. Normalmente, continua coberta de flores até a Páscoa. Há quem suspeite que as quaresmeiras estejam meio enlouquecidas, e florescendo, a cada ano, com mais antecedência. Desconheço, entretanto, qualquer estudo sério que confirme ou estabeleça uma causa para isso. Na dúvida, fico com a explicação biológica mais plausível para essas variações: em anos com chuva mais uniforme, como tem sido o caso deste verão, as quaresmeiras tendem a florescer mais cedo e com vigor notável. Que a cidade permaneça roxa e rosa até a Páscoa, amém.