“Operação Fronteira”: acima da média, abaixo da expectativa
J.C. Chandor, o talentosíssimo diretor de “Margin Call”, é capaz de mais do que esta aventura com Ben Affleck e Oscar Isaac, que estreou na Netflix

Nunca perco a oportunidade de recomendar ao pessoal que gosta de filmes mais “cabeça”, digamos assim, os três excelentes primeiros trabalhos do nova-iorquino J.C. Chandor – O Ano Mais Violento (com Oscar Isaac e Jessica Chastain), Até o Fim (com Robert Redford e só ele) e principalmente a estreia de Chandor, o espetacular Margin Call (com Paul Bettany, Kevin Spacey, Jeremy Irons e mais uma penca de grandes atores). De forma que minhas expectativas andavam altíssimas para Operação Fronteira, que Chandor fez para a Netflix e que se passa em parte no Brasil – mais especificamente, na região conhecida como “Tres Fronteras”, na divisa brasileira com o Peru e a Colômbia. A boa notícia: o filme fica acima da média geral das produções originais para streaming (descontadas exceções honrosas como Roma e A Balada de Buster Scruggs). A notícia menos boa: apesar da produção de qualidade, da direção de Chandor e do roteiro de Marc Boal (oscarizado por Guerra ao Terror, e indicado por A Hora Mais Escura), falta alguma carne no osso desta aventura com Ben Affleck, Oscar Isaac, Pedro Pascal, Charlie Hunnam e Garrett Hedlund, que estreou nesta quarta-feira 13 de março na Netflix.

Os cinco rapazes acima são ex-soldados das Forças Especiais, agora aposentados e em geral não muito satisfeitos com a vida civil, os empregos ruins, os salários decepcionantes, a falta de adrenalina. Oscar Isaac é o único que continuou na ativa, executando operações que as Forças Armadas americanas organizam mas não podem assumir (leia-se, clandestinas). Como, por exemplo, “quebrar” o esconderijo na selva de um megatraficante que gosta de ter todo seu dinheiro – rios dele – em espécie, enfiado em algum lugar da sua propriedade fortemente protegida. Isaac ganha uma comissão por essas operações – uma porcentagem do que apreender. Mas anda achando que poderia fazer melhor negócio: dar um perdido na sua unidade e ficar com tudo. Ou pelo menos com um quinto de tudo, se os velhos amigos toparem um pouco de ação para animar a aposentadoria. Sem apoio militar, as coisas ficam bem mais difíceis, é claro, e a certa altura até o que vinha dando certo começa a dar tremendamente errado.

Entrevistei Chandor por telefone alguns dias atrás,e foi um prazer: ele é um grande cineasta, é muito inteligente e articulado, é simpático e tem muito o que dizer. Durante a conversa, ele comparou Operação Fronteira com Margin Call, no sentido de que ambos se passam em meios marcadamente masculinos (o mercado financeiro e o exército), que prezam e premiam demonstrações de audácia e força e nos quais um profissional perde a forma e o corte muito rápido – é sair cinco minutos da roda-viva e já se ficou para trás. Chandor falou também sobre o tema maior desses dois filmes – a ganância, que habitualmente se descreve como uma motivação simples mas que ele argumenta ser (e eu concordo) uma das emoções humanas mais complicadas, em que, muito mais do que cobiça, entram o desejo de relevância e influência, as frustrações sublimadas, a distância entre o que se é e o que se desejaria ser. Chandor disse ainda que reparou que os brasileiros imediatamente pensam em outra região muito conturbada do país quando se fala em Tríplice Fronteira (esse é o título original do filme, Triple Frontier): a divisa com o Paraguai e a Argentina, onde tem gente da Al Qaeda vivendo no maior sossego e fazendo sabe-se lá o quê. Mas explicou que a intenção do título original é ser em parte uma metáfora das linhas que se cruzam e da desonra que surpreende os cinco amigos – a de usar a força sem o respaldo de uma bandeira. O único senão? A conversa acabou ficando mais interessante que o filme, onde essas ideias apenas são esboçadas, e que logo vira uma aventura e só – competente, mas com um quê de Rambo de luxo.
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